Motta Coqueiro ou a Pena de Morte - Unama
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www.nead.unama.br<br />
— E é capaz <strong>de</strong> fazer tudo quanto eu lhe peça.<br />
— Sim, respon<strong>de</strong>u alegremente Antonica.<br />
— É o maior sacrifício da tua vida, mas será tua tranqüilida<strong>de</strong> mais tar<strong>de</strong>, e o<br />
sossego dos meus. Promete fazer-me?<br />
— Diga, diga já.<br />
— Eu juro que hei <strong>de</strong> velar por si, como se fosse seu pai, mas você há <strong>de</strong><br />
fazer a vonta<strong>de</strong> à sua família, aceitando o casamento com o Viana.<br />
— Ah! Meu Deus; isto é <strong>de</strong>mais.<br />
Enquanto <strong>Motta</strong> <strong>Coqueiro</strong> assim <strong>de</strong>dicava-se ao zelo pela reputação <strong>de</strong><br />
Antonica e pela tranqüilida<strong>de</strong> do lar, três homens tratavam <strong>de</strong> minar sem ruído o<br />
edifício <strong>de</strong> paz que ele tentava construir em roda <strong>de</strong> si.<br />
Um juramento <strong>de</strong> mútua <strong>de</strong>fesa vinculava a recíproca <strong>de</strong>dicação coligandolhes<br />
os esforços. Esses homens eram Manuel João, Sebastião Batista <strong>ou</strong> melhor<br />
Sebastião Pereira — apelido que o violeiro herd<strong>ou</strong> a um seu antigo amo; e o Viana,<br />
o mais conhecido dos ven<strong>de</strong>iros da vizinhança.<br />
O ex-feitor do sítio <strong>de</strong> Macabu, o covar<strong>de</strong> Manuel João, e o violeiro<br />
conspiravam por uma causa razoável; tinham levado a infâmia à casa do agregado e<br />
temiam a punição <strong>de</strong>sse ato, punição que eles imaginavam tremenda, porque<br />
esperavam-na fulminada por <strong>Motta</strong> <strong>Coqueiro</strong>.<br />
A situação do violeiro agravara-se <strong>de</strong> forma que para qualquer parte que ele<br />
olhasse não <strong>de</strong>scortinava senão trevas e perigos.<br />
Em uma das entrevistas com Chiquinha o ânimo <strong>de</strong>stemido do violeiro havia<br />
enfraquecido e baqueado mesmo.<br />
Sustando-lhe intempestivamente as expansões, cortando-lhe <strong>de</strong> um golpe o<br />
fio dos galanteios sedutores, a moça pergunt<strong>ou</strong>-lhe um dia:<br />
— Você pensa que é muito feliz?<br />
Sebastião riu-se com a boa vonta<strong>de</strong> <strong>de</strong> quem tem por horizonte o gozo<br />
<strong>de</strong>sassombrado <strong>de</strong> uma afeição que se dá, sem pedir, como retribuição mais do que<br />
uma hora <strong>de</strong> bom humor, e algumas con<strong>de</strong>scendências amigas.<br />
— Boa pergunta esta, Chiquinha, respon<strong>de</strong>u Sebastião; nem eu tenho razão<br />
para pensar <strong>de</strong> <strong>ou</strong>tra maneira.<br />
O semblante tristonho <strong>de</strong> Chiquinha inund<strong>ou</strong>-se da tristeza comovente da<br />
<strong>de</strong>sesperação represa. Era mister entrar em uma revelação dolorosa que perturbaria<br />
necessariamente a felicida<strong>de</strong> alar<strong>de</strong>ada alacremente pelo seu amante.<br />
A <strong>de</strong>lica<strong>de</strong>za do amor pedia-lhe que se calasse, o melindre do pudor<br />
acovardava-a, mas o perigo da sua posição <strong>de</strong> filha-família exigia que ela fizesse o<br />
sacrifício e <strong>de</strong>svendasse aos olhos <strong>de</strong> Sebastião o futuro que a esperava.<br />
triste.<br />
— Você vive feliz, não é verda<strong>de</strong>? Gemeu a voz da moça; pois eu vivo bem<br />
— Ora essa agora, sá Chiquinha; e quem foi que mat<strong>ou</strong> as suas pucas?<br />
Esta nova resposta <strong>de</strong> Sebastião convencia pungentemente à moça <strong>de</strong> que<br />
bem longe estava do pensamento do seu amante aquilatar a extensão da <strong>de</strong>sgraça<br />
que exauria-lhe a p<strong>ou</strong>co e p<strong>ou</strong>co a existência.<br />
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