Motta Coqueiro ou a Pena de Morte - Unama
Motta Coqueiro ou a Pena de Morte - Unama
Motta Coqueiro ou a Pena de Morte - Unama
Create successful ePaper yourself
Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.
www.nead.unama.br<br />
— Quero que você diga que também paga-me essa amiza<strong>de</strong> com a mesma<br />
força; que é capaz <strong>de</strong> fazer tudo por ela, sem medo, nem <strong>de</strong> Deus, nem do mundo.<br />
— Ai! Ai! Você está a dizer pecados, vá fazer o quarto e <strong>de</strong>ixe-se <strong>de</strong> partes.<br />
— Não brinque, sá Mariquinhas; eu não saio hoje daqui sem saber se <strong>de</strong>vo<br />
viver <strong>ou</strong> morrer. Eu não vim cá por sá Antonica; eu vim para certificar-me <strong>de</strong> que<br />
você me estima. Quero que jure-me, que repita uma, cem vezes: eu só serei tua, só<br />
tua...<br />
Estas palavras seguiu-as o feitor com os movimentos precipitados da paixão,<br />
e quando pedia à moça que jurasse já a tinha cingido e beijava-a apesar do esforço<br />
que ela fazia para libertar-se do assalto.<br />
— Deixe-me, <strong>de</strong>ixe-me, exclam<strong>ou</strong> Mariquinhas, você está abusando, eu<br />
chamo a rapariga.<br />
Dita a meia voz, mas com o acento imponente do pudor e da dignida<strong>de</strong>, a<br />
frase <strong>de</strong> Mariquinhas repeliu para longe o feitor, não amedrontado, mas alucinado.<br />
O seu plano <strong>de</strong> sedução malogr<strong>ou</strong>-se, era mister levar a cabo o segundo: o<br />
da violência.<br />
Lev<strong>ou</strong> a mão a cinta; estava <strong>de</strong>sarmado; volt<strong>ou</strong> então para junto <strong>de</strong><br />
Mariquinhas e, travando-lhe do punho, disse-lhe com um acento que a fez tremer:<br />
— Uma palavra mais, e eu que te estimo como um doido, arranco-te a língua<br />
como um malvado. Olha que já há noites que eu penso nisto; enforquem-me <strong>de</strong>pois,<br />
mas eu hei <strong>de</strong> chamar-te minha hoje, já... Uma palavra mais e... esta casa tem<br />
armas e no meu pulso há força.<br />
— Para que há <strong>de</strong> ser mau pra mim; murmur<strong>ou</strong> Mariquinhas, que esperava<br />
abrandá-lo pela humilda<strong>de</strong>.<br />
Foi porém um novo incitamento. De chofre Manuel João apert<strong>ou</strong> sobre os<br />
lábios <strong>de</strong> Mariquinhas a sua mão vigorosa, enquanto com o braço, que lhe passara à<br />
cinta e um esforço brutal, fazia vergar-lhe o corpo <strong>de</strong>licado.<br />
O can<strong>de</strong>eiro, talvez pela agitação do ar durante a luta, <strong>de</strong>ix<strong>ou</strong> <strong>de</strong> iluminar a<br />
sala.<br />
CAPÍTULO V<br />
UM CUMPRIMENTO DE PALAVRA<br />
A moléstia <strong>de</strong> Antonica <strong>de</strong>u lugar a mais uma intimida<strong>de</strong> perigosa na sua<br />
família.<br />
Na qualida<strong>de</strong> <strong>de</strong> mezinheira foi chamada a tia Balbina para <strong>de</strong>belar o mal<br />
que assombrosamente <strong>de</strong>vastava o organismo da moça.<br />
A feiticeira tinha para insinuar-se a maciez da dissimulação e, apesar das<br />
asperezas do seu exterior, o trato, refalsadamente humil<strong>de</strong>, era agradável como o<br />
contato do pêlo da lontra.<br />
Esperando pacientemente a oportunida<strong>de</strong> para arriscar uma palavra,<br />
penetrando até o fundo das consciências com o seu olhar que possuía a calma<br />
72