12.04.2013 Views

Motta Coqueiro ou a Pena de Morte - Unama

Motta Coqueiro ou a Pena de Morte - Unama

Motta Coqueiro ou a Pena de Morte - Unama

SHOW MORE
SHOW LESS

Create successful ePaper yourself

Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.

www.nead.unama.br<br />

Entretanto uma <strong>de</strong>silusão amarga, fria e acerbamente repreensiva vinha<br />

malograr todo o trabalho <strong>de</strong> longo tempo, e esvaecer a esperança que morosamente<br />

fecundara-se, e, crescendo dia a dia, olhava como certa a realida<strong>de</strong>.<br />

Durante todo esse pa<strong>de</strong>cer o coração <strong>de</strong> Antonica, fugindo <strong>de</strong> exibir-se à luz,<br />

só uma vez não pô<strong>de</strong> conter-se e <strong>de</strong>u forma aos seus sentimentos.<br />

Foi na noite festiva <strong>de</strong> Santo Antônio quando o violeiro pronunci<strong>ou</strong><br />

<strong>de</strong>satenciosamente o nome <strong>de</strong> <strong>Motta</strong> <strong>Coqueiro</strong>.<br />

Nesta mesma ocasião, porém, mascar<strong>ou</strong> com a gratidão o seu amor, e teve<br />

daí em diante força para não permitir nunca a mais leve franqueza a sua paixão, que<br />

para satisfazer-se não mediria conseqüência, não obstante procurar esmagar-se <strong>de</strong><br />

encontro a um casamento <strong>de</strong> conveniência.<br />

Para dissuadir-se e esquecer-se, aproveitava a ausência <strong>de</strong> <strong>Motta</strong> <strong>Coqueiro</strong>,<br />

as quebras temporárias do magnetismo do seu olhar, para dar <strong>ou</strong>vidos e provocar os<br />

galanteios <strong>de</strong> <strong>ou</strong>trem.<br />

Assim era que tinha animado os <strong>de</strong>sejos <strong>de</strong> Viana, saindo-lhe ao encontro<br />

com uma lisonja, e favoniando-lhe a esperança com um medido abandono.<br />

Mas esta resolução inconsistente e aérea <strong>de</strong>saparecia logo, e a moça recaía<br />

no tédio e na abstração.<br />

Era tão zelosa do seu i<strong>de</strong>al, que percebia ao longe a mais imperceptível<br />

sombra que se dirigisse para ele; e só ela interpret<strong>ou</strong> quanto havia <strong>de</strong> travoroso na<br />

ironia do violeiro, apreciando a <strong>de</strong>mora <strong>de</strong> Chiquinha e do capitão.<br />

Naquela alma tão trabalhada, e que <strong>de</strong> repente viu-se forçada a quebrar o<br />

sigilo que se impusera, o <strong>de</strong>speito cheg<strong>ou</strong> até a alucinação.<br />

A princípio qued<strong>ou</strong> imóvel com a cabeça encostada à ombreira da porta,<br />

mas em seguida caminh<strong>ou</strong> para <strong>Motta</strong> <strong>Coqueiro</strong>.<br />

Santificava-lhe o <strong>de</strong>salinho das feições a solenida<strong>de</strong> da tristeza e recatavalhe<br />

a <strong>de</strong>senvoltura da frase a eloqüência da dor.<br />

— Então, disse ela, não se importa que eu me case com <strong>ou</strong>tro; não vê que<br />

eu não quero, que eu não serei feliz? Não tem nada para me dizer; nada? Nada?<br />

<strong>Motta</strong> <strong>Coqueiro</strong> levant<strong>ou</strong>-se estupefato; esta cena era tão inesperada que<br />

ele temeu que estivesse diante <strong>de</strong> uma l<strong>ou</strong>ca, e só pô<strong>de</strong> dizer a Antonica:<br />

— Pois se você tem tanta aversão a este casamento não ceda, minha filha;<br />

<strong>de</strong>ixe estar que eu falarei com seu pai e hei <strong>de</strong> protegê-la.<br />

Ao dizer as últimas palavras um dos braços do fazen<strong>de</strong>iro tinha cingido a<br />

moça que soluçava.<br />

Antonica <strong>de</strong>ix<strong>ou</strong> pen<strong>de</strong>r a cabeça sobre o peito <strong>de</strong> <strong>Motta</strong> <strong>Coqueiro</strong>, e<br />

levantando para ele os gran<strong>de</strong>s olhos negros, murmur<strong>ou</strong>:<br />

— Sim, sim, não <strong>de</strong>ixe; eu lhe juro, não gosto <strong>de</strong>le.<br />

— Descanse, filha, <strong>de</strong>scanse, seu pai não há <strong>de</strong> obrigá-la; você há <strong>de</strong> casar<br />

com quem quiser.<br />

— Se seu capitão s<strong>ou</strong>besse, continu<strong>ou</strong> Antonica, as dores que eu tenho<br />

passado, como tenho escondido <strong>de</strong> todos o que eu sofro! Ninguém po<strong>de</strong> <strong>de</strong>sconfiar<br />

apenas. Eu tinha medo <strong>de</strong> lhe dizer; vosmecê me estima só como a uma criança, e<br />

não vê...<br />

— O que é que eu não vejo, Antonica...<br />

61

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!