12.04.2013 Views

Motta Coqueiro ou a Pena de Morte - Unama

Motta Coqueiro ou a Pena de Morte - Unama

Motta Coqueiro ou a Pena de Morte - Unama

SHOW MORE
SHOW LESS

Create successful ePaper yourself

Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.

www.nead.unama.br<br />

— O diabo, um inferno, mil raios me partam; maldita a hora em que eu entrei<br />

para semelhante casa!<br />

— Mas o que foi, homem, <strong>de</strong>sembuche!<br />

— Quer saber, seu Viana, eu est<strong>ou</strong> aqui e est<strong>ou</strong> na ca<strong>de</strong>ia; não aturo<br />

<strong>de</strong>saforos; por on<strong>de</strong> anda o diabo do Sebastião?<br />

— Espera um p<strong>ou</strong>co; oh! Com os diabos, você parece maluco; o Sebastião<br />

não há <strong>de</strong> tardar por aí; acomo<strong>de</strong>-se<br />

O ven<strong>de</strong>iro, hipócrita como todo um mosteiro e astuto como cinqüenta<br />

raposas; percebeu logo que a situação do triunvirato era perigosa.<br />

Des<strong>de</strong> o domingo em que pela última vez esteve na casa <strong>de</strong> Francisco<br />

Benedito, refletindo com madureza, resolveu impedir com todas as forças o violeiro e<br />

o feitor e conservar-se em uma distância, que o preservasse <strong>de</strong> ser tido como<br />

cúmplice em algum ato reprovado dos dois.<br />

Sabia ele já a que fora o violeiro quando os <strong>de</strong>ix<strong>ou</strong> no casarão; sabia mais<br />

que Sebastião ia todos os dias ao sítio e aí encontrava-se com Chiquinha, ora no<br />

porto, ora na baixada.<br />

Conhecendo <strong>de</strong> perto o caráter <strong>de</strong> <strong>Motta</strong> <strong>Coqueiro</strong> nas suas asperezas e nas<br />

suas <strong>de</strong>lica<strong>de</strong>zas, evitava o seu <strong>de</strong>sagrado; era a isto levado por uma questão moral<br />

mas principalmente por uma questão econômica.<br />

Supina imprudência seria irritá-lo e indispô-lo contra si, quando por <strong>ou</strong>tro<br />

lado o Chico Benedito nada valia, nem apresentava dificulda<strong>de</strong>s sérias.<br />

O ven<strong>de</strong>iro pensando em Antonica via simplesmente um breve afastamento;<br />

as circunstâncias aplainariam as dificulda<strong>de</strong>s, e o borrador e as prateleiras da<br />

vendola dariam a última <strong>de</strong>mão ao problema.<br />

As palavras <strong>de</strong> Manuel João impressionaram entretanto a alma do calculista,<br />

fria como o chumbo oxidado dos pesos da sua balança enferrujada.<br />

Tomando um copo e enchendo-o <strong>de</strong> vinho, Viana caminh<strong>ou</strong> para Manuel<br />

João, e pondo-lhe um braço sobre o ombro, enquanto com o <strong>ou</strong>tro apresentava-lhe o<br />

copo, resmung<strong>ou</strong>:<br />

— Então com que você quer nos <strong>de</strong>itar a per<strong>de</strong>r, seu homem; isto não é por<br />

força que vai, é preciso jeito. Vá lá o codório e <strong>de</strong>pois vamos à fala.<br />

— Beba você primeiro, seu Viana.<br />

— Não senhor; venha <strong>de</strong> lá.<br />

Manuel João bebeu, e a convite do ven<strong>de</strong>iro sent<strong>ou</strong>-se com ele no balcão.<br />

— Então com que o cabrinha está com o diabo na pele? Quer pôr o mundo<br />

abaixo? Interrog<strong>ou</strong> Viana, que tirava <strong>de</strong> sobre o pavilhão da orelha um cigarro e<br />

levava a ele o isqueiro.<br />

— Você está com caçoada, seu Viana, e eu hoje não est<strong>ou</strong> para graça.<br />

Falemos sério, o Sebastião vem aqui, <strong>ou</strong> não vem? Se ele não vem, eu v<strong>ou</strong> à casa<br />

<strong>de</strong>le.<br />

— É verda<strong>de</strong> que o <strong>de</strong>mo está tardando, respon<strong>de</strong>u Viana já impressionado;<br />

o melhor é irmos à casa do bicho. Espera, eu v<strong>ou</strong> buscar os remos.<br />

— Vamos mesmo, porque eu s<strong>ou</strong> capaz <strong>de</strong> fazer uma asneira.<br />

Passados alguns minutos, Viana fechava a porta da vendola e os dois com<br />

os remos ao ombro caminhavam em direção ao porto.<br />

51

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!