12.04.2013 Views

Motta Coqueiro ou a Pena de Morte - Unama

Motta Coqueiro ou a Pena de Morte - Unama

Motta Coqueiro ou a Pena de Morte - Unama

SHOW MORE
SHOW LESS

Create successful ePaper yourself

Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.

www.nead.unama.br<br />

<strong>Motta</strong> <strong>Coqueiro</strong>, como se tivesse arrependido, mostrava-se contrariado, e<br />

mais ainda do que ele a sua esposa, que aproveit<strong>ou</strong>, para retirar-se, o ensejo que<br />

<strong>de</strong>u-lhe a longa pausa sucedida às últimas palavras <strong>de</strong> Francisco Benedito.<br />

Logo que a senhora retir<strong>ou</strong>-se, <strong>Motta</strong> <strong>Coqueiro</strong> reat<strong>ou</strong> a conversa a respeito<br />

dos esponsais das filhas do seu compadre, porém, procurando <strong>de</strong>sviá-la e fixá-la em<br />

<strong>ou</strong>tro ponto, e tanto mais <strong>de</strong>cididamente quanto mais o velho mostrava-se propenso<br />

a não aten<strong>de</strong>r o seu conselho.<br />

— E sem que se dê por isso, compadre, vai quase para dois anos que você<br />

está aqui conosco.<br />

— É verda<strong>de</strong>, meu compadre, e em tão boa hora o diga, ainda não tenho<br />

uma queixa <strong>de</strong> nenhum dos donos da casa.<br />

— Muito obrigado. O que você <strong>de</strong>via, compadre, era cuidar <strong>de</strong> fazer a sua<br />

casa. A em que você mora, está velha, e muito longe do seu trabalho.<br />

— É verda<strong>de</strong>, meu compadre, mas as plantações têm-me atrapalhado.<br />

Agora se esses dois rapazes quiserem ajudar-me, eu, o Juca e eles sempre somos<br />

quatro e a c<strong>ou</strong>sa vai <strong>de</strong>pressa.<br />

Não havia dúvida; Francisco Benedito já falava dos seus genros, os dois<br />

rapazes, e contava com eles.<br />

— Pois faz muito bem: aproveite-os para alguma coisa, disse <strong>Motta</strong><br />

<strong>Coqueiro</strong>, levantando-se.<br />

O velho compreen<strong>de</strong>u que eram horas <strong>de</strong> retirar-se.<br />

Enquanto esta cena se passava na sala da casa gran<strong>de</strong>, tendo por únicas<br />

testemunhas algumas ca<strong>de</strong>iras vazias, e uns aparadores <strong>de</strong> jacarandá, lá fora, no<br />

campo do sítio <strong>ou</strong>tra se <strong>de</strong>sdobrava ao luar, no silêncio e no ermo.<br />

O triunvirato <strong>de</strong> amantes dissolvera-se por aquela noite, mas um <strong>de</strong>les<br />

apenas, o Viana, retirara-se imediatamente para a sua morada.<br />

Os <strong>ou</strong>tros podiam ser encontrados nas circunvizinhanças da casa do velho<br />

agregado.<br />

Sebastião Pereira, conforme tratara com Chiquinha, foi esperá-la na<br />

baixada. Era um lugar apropriado para uma entrevista; os amantes ali ficavam pela<br />

própria natureza recatados aos olhares curiosos.<br />

Uma gran<strong>de</strong> entrada quase circular, coberta <strong>de</strong> grama, levantava-se do sopé<br />

ao cimo da colina. Dai um enorme cajueiro vergava todos os seus galhos sobre a<br />

entrada, cobrindo-a com uma espécie <strong>de</strong> cúpula. Um banco <strong>de</strong> pau ornava o<br />

silencioso e p<strong>ou</strong>co freqüentado recinto.<br />

Deixando a casa do velho, Sebastião Pereira tom<strong>ou</strong> cautelosamente o<br />

caminho que conduzia à baixada e <strong>de</strong>it<strong>ou</strong>-se no banco, cobrindo o rosto com o<br />

chapéu. A sua imobilida<strong>de</strong>, o nenhum ruído da sua respiração represa faria crer a<br />

qualquer sertanejo, que ali entrasse, não serem mentirosos os contos <strong>de</strong> almas<br />

penadas e fantasmas <strong>de</strong> que lhe falavam <strong>de</strong>s<strong>de</strong> a infância.<br />

Aos segundos suce<strong>de</strong>ram os minutos, e a estes os quartos <strong>de</strong> hora, tardos<br />

como afiguram-se a quem espera. Nenhum gesto <strong>de</strong> sofreguidão foi, entretanto, feito<br />

pelo violeiro; nem ao menos pux<strong>ou</strong> pelo isqueiro e o cigarro, inseparáveis<br />

companheiros dos homens do sertão. Continha-o a paciência do mal, inalterável nos<br />

seus planos.<br />

33

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!