Motta Coqueiro ou a Pena de Morte - Unama
Motta Coqueiro ou a Pena de Morte - Unama
Motta Coqueiro ou a Pena de Morte - Unama
You also want an ePaper? Increase the reach of your titles
YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.
www.nead.unama.br<br />
Cantada a ladainha, começ<strong>ou</strong> calorosamente o fado. A viola retinia<br />
febrilmente ferida pelos <strong>de</strong>dos apaixonados <strong>de</strong> Sebastião Pereira; rufavam<br />
entusiasticamente os adufes, e os pares rodavam, sapateavam, peneiravam,<br />
enchendo a sala <strong>de</strong> palmas e castanholas.<br />
Uma das rodas era formada pelo Viana e Antonica, Manuel João e<br />
Mariquinhas, a mais nova das três filhas moças <strong>de</strong> Francisco Benedito.<br />
Era a roda em que se dançava melhor.<br />
Maravilhava pela certeza dos meneios, pela precisa cadência dos<br />
sapateados e pela assonância das palmas, às vezes batidas junto da boca aberta,<br />
para repercutirem um som cavo, <strong>de</strong>lícia dos dançarinos.<br />
— Excitava-a o entusiasmo do amor.<br />
Invejosos da maestria das damas, os cavalheiros <strong>de</strong> <strong>ou</strong>tros grupos, pela<br />
maior parte em mangas <strong>de</strong> camisa, tentavam freqüentes furtos, que eram<br />
habilmente repelidos pelos cautelosos pares.<br />
Em vão, <strong>de</strong> um pulo, os invejosos realizavam os bem planejados assaltos;<br />
era-lhes frustrado o intento, porque encontravam a dama cobiçada bem amparada<br />
pela perna do par, inteiriçada e meio sumida entre as saias murmurosas da risonha<br />
<strong>de</strong>fendida.<br />
Os assaltos malogrados eram novo incentivo à fertilida<strong>de</strong> poética dos<br />
cantores. Manuel João vitorioso prendia a corrente do <strong>de</strong>safio, estrofes alusivas e<br />
dizia no seu ameno tenor:<br />
— É capricho; hei <strong>de</strong> guardá-la<br />
Qual na moita o passarinho,<br />
Co'as lindas asas abertas,<br />
Guarda os filhos no seu ninho.<br />
Respon<strong>de</strong>ndo rapidamente à volta, o violeiro apaixonado tornava no seu<br />
barítono selvagem:<br />
— Eu também morro <strong>de</strong> zelos<br />
Por uma jóia querida;<br />
— Os sorrisos <strong>de</strong> Chiquinha,<br />
Ca<strong>de</strong>ias da minha vida.<br />
Continuavam a trocar os prontos improvisos, aludindo cada um à dama que<br />
o cativava.<br />
— Quem tem jóias preciosas<br />
Não as <strong>de</strong>ixa assim r<strong>ou</strong>bar;<br />
Meu tes<strong>ou</strong>ro é Mariquinhas,<br />
Minha jóia é seu olhar.<br />
Mas eu conheço <strong>ou</strong>tros olhos<br />
Que têm um brilho melhor;<br />
São negros, a gente os vendo<br />
Fica perdido <strong>de</strong> amor.<br />
22