Motta Coqueiro ou a Pena de Morte - Unama
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— Não; não é um segredo que eu quero confiar; é ao contrário um segredo<br />
da minha vida que <strong>de</strong>sejo que tu espalhes por toda a parte apenas eu morra. Jurasme<br />
que farás esta vonta<strong>de</strong> a teu pai?<br />
— Bem sabe que não sei <strong>de</strong>sobe<strong>de</strong>cer-lhe.<br />
— Deixa-me um instante ligar as minhas lembranças!<br />
Estas palavras já foram pronunciadas com acento que traía a perturbação<br />
mental do moribundo. Só <strong>de</strong>pois <strong>de</strong> meia hora <strong>de</strong> espera foi proferida a primeira<br />
palavra do tremendo segredo:<br />
— Meu filho, há vinte e quatro anos apareceram cortadas a foice,<br />
esfaqueadas e estranguladas todas as pessoas <strong>de</strong> uma família. O assassino <strong>de</strong> toda<br />
essa gente fui eu!...<br />
— Meu pai, meu pai; isto é pesa<strong>de</strong>lo seu, não diga tal, interrompeu-lhe o<br />
filho perturbado.<br />
— Pesa<strong>de</strong>lo julgaram talvez os que eu matei ser a noite tremenda da minha<br />
vingança. Não p<strong>ou</strong>pei nem os velhos nem as crianças; <strong>de</strong>pois lancei fogo a casa,<br />
mas a chuva do céu não quis que a labareda, que é pura, se manchasse no sangue<br />
daquela raça.<br />
— Meu pai, tenha pieda<strong>de</strong> dos que morreram.<br />
— Morreram pela mão <strong>de</strong> um homem, e mataram pela mão <strong>de</strong> um <strong>ou</strong>tro. Foi<br />
simplesmente uma paga. Ouve!<br />
A fraca e sussurrante voz do moribundo começ<strong>ou</strong> então a narrar a maneira<br />
por que tinha assaltado a casa das pessoas da quais se confessava assassino e a<br />
maneira pela qual efetuara a carnificina.<br />
Marcolino, perturbado e ao mesmo tempo relutando dar crédito ao que<br />
<strong>ou</strong>via, pergunt<strong>ou</strong> ao narrador:<br />
— E on<strong>de</strong> fez meu pai estas mortes?<br />
— Em Macabu, respon<strong>de</strong>u o moribundo.<br />
— E qual era o nome do chefe da família que meu pai mat<strong>ou</strong>?<br />
— Francisco Benedito, sorriu o moribundo.<br />
— Mas então meu pai foi também do número dos que foram pagos pelo<br />
<strong>Motta</strong> <strong>Coqueiro</strong>?!<br />
Sentando-se violentamente no leito, o moribundo, como se quisesse fulminar<br />
com o olhar ao aflito Marcolino, tent<strong>ou</strong> bradar, e apenas disse baixinho:<br />
— Teu pai nunca mat<strong>ou</strong> por ofício, mat<strong>ou</strong> a raça do seu inimigo por<br />
vingança.<br />
— Mas isto não po<strong>de</strong> ser verda<strong>de</strong>.<br />
— É; juro na hora em que v<strong>ou</strong> morrer; hora em que não se mente; <strong>Motta</strong><br />
<strong>Coqueiro</strong> nem me conhecia, nem suspeitava que naquela noite <strong>de</strong>via sumir-se da<br />
terra a malvada raça <strong>de</strong> Francisco Benedito.<br />
— E vosmecê consentiu que ele morresse; porque não confess<strong>ou</strong>, e não<br />
<strong>de</strong>fen<strong>de</strong>u o inocente?<br />
— Ninguém viria em mim senão um instrumento <strong>de</strong> <strong>Coqueiro</strong>, e morreríamos<br />
os dois, e a verda<strong>de</strong> não seria sabida.<br />
— Oh! Deus <strong>de</strong> Misericórdia!<br />
— Escuta, escuta; já te disse, fui eu quem mat<strong>ou</strong> o miserável. Devia-lhe...<br />
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