Motta Coqueiro ou a Pena de Morte - Unama
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www.nead.unama.br<br />
— Mas então havia a esperança <strong>de</strong> fazer reconhecer a inocência <strong>de</strong> seu<br />
marido; hoje não, hoje é mister que evite a sua injusta execução.<br />
— Devo, pois, entregar a minha cabeça ao braço do carrasco...<br />
Um ai repassado <strong>de</strong> aflição embarg<strong>ou</strong> a voz â pobre senhora, que, levando<br />
as mãos à fronte, baque<strong>ou</strong> sem sentidos.<br />
— Covar<strong>de</strong>, covar<strong>de</strong> mulher! Grit<strong>ou</strong> o filho alucinado; tenho vergonha <strong>de</strong> ser<br />
teu filho. Queres evitar a morte à custa da morte <strong>de</strong> um inocente; não, não, eu não o<br />
consentirei!<br />
E o homem, que levava a honra<strong>de</strong>z até a sufocação dos mais santos afetos,<br />
saiu correndo, como se temesse que a sua permanência junto <strong>de</strong> sua mãe inibisse-o<br />
<strong>de</strong> proce<strong>de</strong>r conforme lho aconselhava o seu caráter.<br />
A família sobressaltada pelo baque e ainda mais pela carreira inesperada,<br />
afluiu toda para o gabinete em que o coletor conversara com sua mãe, e encontr<strong>ou</strong><br />
aí a Sra. D. Maria estendida no assoalho.<br />
Vendo que apesar dos seus esforços a senhora conservava-se lívida e<br />
<strong>de</strong>sacordada, os <strong>de</strong>samparados filhos apressaram-se em mandar comunicar o<br />
acontecimento ao Dr... um dos amigos <strong>de</strong> seu pai que lhe tinha guardado mais<br />
lealda<strong>de</strong>.<br />
Acordando-se porém, <strong>de</strong> chofre, a doente encheu <strong>de</strong> espanto a quantos a<br />
cercavam.<br />
— Meus filhos, soluç<strong>ou</strong> ela, fiquem aqui bem perto <strong>de</strong> sua mãe; não<br />
consintam que me levem daqui, eu não quero morrer; s<strong>ou</strong> mãe, não quero morrer!<br />
Mal proferira estas palavras <strong>de</strong>sgrenhando violentamente os cabelos<br />
embranquecidos pelo sofrimento, a <strong>de</strong>svairada senhora levant<strong>ou</strong>-se <strong>de</strong> um pulo,<br />
rindo prolongadamente uma gargalhada insana.<br />
Acerc<strong>ou</strong>-se então da maior das suas filhas e disse no meio da gargalhada<br />
contristadora.<br />
— Vamos, vamos todos; é preciso que vamos todos.<br />
O pranto filial recebeu esse convite do <strong>de</strong>svario com a profunda tristeza <strong>de</strong><br />
corações, que se julgavam já órfãos <strong>de</strong> todo.<br />
A mãe alucinada peg<strong>ou</strong> então dos braços das duas filhas e caminh<strong>ou</strong> para a<br />
porta principal da casa, repetindo o convite medonho:<br />
— Vamos, vamos <strong>de</strong>pressa!<br />
Ao transpor o limiar a Sra. D. Maria foi embargada pelo Dr. que entrava.<br />
Vendo a transfiguração do semblante da esposa do seu amigo, pergunt<strong>ou</strong>-lhe<br />
sobressaltado:<br />
— Qual é a nova <strong>de</strong>sgraça, minha senhora? — tenha confiança em Deus.<br />
— Vamos, vamos <strong>de</strong>pressa, repetiu automaticamente a <strong>de</strong>svairada.<br />
— Para on<strong>de</strong> quer ir, minha senhora!<br />
— Para on<strong>de</strong>? Gargalh<strong>ou</strong> a infeliz, para on<strong>de</strong>? Não sabe então que eu <strong>de</strong>vo<br />
ir para a forca, não sabe que eu s<strong>ou</strong> a assassina; não <strong>ou</strong>viu meu filho dizer?<br />
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