Motta Coqueiro ou a Pena de Morte - Unama
Motta Coqueiro ou a Pena de Morte - Unama
Motta Coqueiro ou a Pena de Morte - Unama
Create successful ePaper yourself
Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.
www.nead.unama.br<br />
O sub<strong>de</strong>legado Oliveira apress<strong>ou</strong>-se em pronunciar os réus, como autores<br />
do crime <strong>de</strong> homicídio previsto no art. 192 do código criminal, aduzindo as<br />
circunstâncias agravantes <strong>de</strong> paga <strong>ou</strong> esperança <strong>de</strong> recompensa, entrada em casa<br />
do ofendido com intento <strong>de</strong> cometer o crime; resultar, além do crime, <strong>ou</strong>tro mal ao<br />
ofendido <strong>ou</strong> pessoa <strong>de</strong> sua família, aumento da dor física por circunstância<br />
extraordinária; aumento do crime por circunstância extraordinária <strong>de</strong> ignomínia, pela<br />
natureza irreparável do dano; e, finalmente, aumento da aflição ao aflito.<br />
Conclusos os autos ao juiz municipal substituto <strong>de</strong> Macaé, foram enviados<br />
ao promotor que, <strong>de</strong>pois da apreciação das provas, pediu que se fizesse a <strong>de</strong>vida<br />
justiça.<br />
<strong>Motta</strong> <strong>Coqueiro</strong>, <strong>de</strong>clarado incomunicável <strong>de</strong>s<strong>de</strong> a sua prisão até a véspera<br />
<strong>de</strong> seu julgamento, continu<strong>ou</strong> a sua peregrinação <strong>de</strong> infortúnio.<br />
Apregoavam por toda a parte os seus <strong>de</strong>tratores que sempre fora um<br />
homem perdido no conceito público, e entretanto não o julgaram seguro na ca<strong>de</strong>ia<br />
<strong>de</strong> Macaé, pelo que foi mandado para a capital do império.<br />
C<strong>ou</strong>sa extraordinária! Des<strong>de</strong> que o mandante do nefando morticínio foi<br />
encarcerado, as autorida<strong>de</strong>s, que tão solicitas se mostravam na captura <strong>de</strong> todos os<br />
réus, esqueceram os <strong>de</strong>mais escravos <strong>de</strong> <strong>Motta</strong> <strong>Coqueiro</strong>, que tinham sido<br />
acusados e ninguém mais <strong>ou</strong>viu falar em diligências à casa do fazen<strong>de</strong>iro a fim <strong>de</strong><br />
prendê-los!<br />
É que a população pedia sangue para <strong>de</strong>safrontar-se e já havia quatro<br />
vítimas para satisfazer-lhe a secura das fauces justiceiras.<br />
Fossem elas justa <strong>ou</strong> injustamente imoladas, p<strong>ou</strong>co importava; o que era<br />
mister, o que não podia ser dispensado, era o espetáculo da morte para reparar a<br />
morte.<br />
O verda<strong>de</strong>iro criminoso <strong>de</strong>via alegrar-se na sua barbarida<strong>de</strong> ao ver como a<br />
socieda<strong>de</strong> <strong>de</strong>monstrava compreen<strong>de</strong>r a justiça.<br />
Enquanto na paz insensata da vingança ele passava <strong>de</strong>sembaraçado, talvez<br />
por diante dos mesmos magistrados, que se jactavam <strong>de</strong> ler na fisionomia do<br />
fazen<strong>de</strong>iro os atestados do crime; uma família esmagada pela execração pública<br />
fraqueando diante <strong>de</strong> tão dolorosa sentença, buscava retratar-se <strong>de</strong> um <strong>de</strong>lito que<br />
não tinha cometido, e riscava do nome o apelido herdado a seus pais!<br />
E <strong>Motta</strong> <strong>Coqueiro</strong>, o cavalheiro que repelia evadir-se para justificar-se; o<br />
homem po<strong>de</strong>roso que contemporizava com o agregado para não parecer que<br />
abusava da força <strong>de</strong> que então podia dispor, era apontado, injuriado pelo anônimo<br />
popular e pela imprensa como um tipo <strong>de</strong> malda<strong>de</strong> e <strong>de</strong> cinismo.<br />
Longe, porém, da socieda<strong>de</strong> polida e amiga da justiça h<strong>ou</strong>ve um coração a<br />
quem a sorte do fazen<strong>de</strong>iro compungiu até a l<strong>ou</strong>cura.<br />
Sabendo no interior das matas <strong>de</strong> Macabu, por on<strong>de</strong> errava foragido qual a<br />
acusação que pesava sobre seu senhor, Carlos, que involuntariamente contribuíra<br />
para ela, sentiu revoltarem-se-lhe os instintos generosos.<br />
Quisera po<strong>de</strong>r fazer acreditar a todos a inocência do seu senhor; quisera<br />
pela verda<strong>de</strong> confundir a calúnia que já ameaçava a vida, <strong>de</strong>pois <strong>de</strong> haver tisnado a<br />
reputação e a honra <strong>de</strong> um homem <strong>de</strong> bem. Mas era impossível que lhe <strong>de</strong>ssem<br />
crédito, a ele, um escravo e <strong>de</strong>mais acusado também como autor do crime.<br />
Impelido pelo impotente <strong>de</strong>sespero, que o assenhoreara, o nobre escravo<br />
resolveu protestar <strong>de</strong> maneira solene contra a injustiça que se fazia, quer a si, quer<br />
ao seu senhor.<br />
181