Motta Coqueiro ou a Pena de Morte - Unama
Motta Coqueiro ou a Pena de Morte - Unama
Motta Coqueiro ou a Pena de Morte - Unama
You also want an ePaper? Increase the reach of your titles
YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.
www.nead.unama.br<br />
Quando Balbina cheg<strong>ou</strong> ao terreiro encontr<strong>ou</strong> aí o fazen<strong>de</strong>iro, diante do<br />
qual, com o chapéu na mio, Fidélis falava humil<strong>de</strong>mente.<br />
O feitor <strong>de</strong>pois <strong>de</strong> contar as diversas tropelias feitas pelo agregado, junt<strong>ou</strong>lhes<br />
a narração do estrago feito nas balsas e o expediente que tomara, como feitor.<br />
— Eu fui falar com seu Chico, disse ele, mas não fui atendido, e ainda o filho<br />
<strong>de</strong>u uma cacetada em Alexandre. Zangado, eu quis pôr fogo à casa, mas não<br />
cheguei...<br />
— E quem <strong>de</strong>u-lhe or<strong>de</strong>m para fazer semelhante c<strong>ou</strong>sa? Interrog<strong>ou</strong> o<br />
fazen<strong>de</strong>iro.<br />
— Senhora mand<strong>ou</strong> que pusesse fora o agregado <strong>de</strong> qualquer sorte.<br />
— E o que fez <strong>de</strong>pois o compadre?<br />
— Parece que foi dar parte ao inspetor.<br />
— Po<strong>de</strong> ir, po<strong>de</strong> ir embora, exclam<strong>ou</strong> <strong>Motta</strong> <strong>Coqueiro</strong> dirigindo-se ao<br />
escravo, mas saiba que não po<strong>de</strong> <strong>de</strong> hoje em diante fazer nada sem minha or<strong>de</strong>m.<br />
O fazen<strong>de</strong>iro, que durante algum tempo conservara-se no mesmo lugar com<br />
a cabeça sumida entre as mãos, levant<strong>ou</strong>-se por fim e entr<strong>ou</strong> na sala <strong>de</strong> jantar<br />
completamente <strong>de</strong>sfigurado.<br />
Balbina que observava todos os movimentos, ao vê-lo assim perturbado,<br />
resmung<strong>ou</strong> através do ódio encanecido:<br />
— A Estrela do céu já não <strong>de</strong>fen<strong>de</strong> a porta dos brancos e Deus não olha<br />
mais para a banda em que ela está. A escrava po<strong>de</strong> rir, vai ser vingada.<br />
A noite foi uma longa tortura para o fazen<strong>de</strong>iro, que estava ainda muito longe<br />
da realida<strong>de</strong> horrorosa da sua situação.<br />
Via no ato dos escravos, autorizado pela senhora, o <strong>de</strong>scrédito <strong>de</strong> seu nome<br />
e, o que lhe doía igualmente, uma arma segura com a qual os seus adversários<br />
combatessem-lhe a popularida<strong>de</strong>.<br />
Com que prestígio, ele que mandava incendiar a casa <strong>de</strong> um pobre e seu<br />
hóspe<strong>de</strong> po<strong>de</strong>ria pedir ao povo da localida<strong>de</strong> apoio e <strong>de</strong>dicação, se <strong>de</strong>pois,<br />
esquecendo tudo, viria talvez a persegui-los cruelmente?<br />
Tar<strong>de</strong> da noite <strong>Motta</strong> <strong>Coqueiro</strong>, cuja insônia afeava cada vez mais o<br />
acontecimento, foi ter com o seu amigo Conceição e comunic<strong>ou</strong>-lhe o ocorrido.<br />
O honrado negociante mostr<strong>ou</strong>-se também profundamente abalado e só<br />
<strong>de</strong>pois <strong>de</strong> longo silêncio disse para o fazen<strong>de</strong>iro:<br />
— O único remédio é pagar pelo preço que Francisco Benedito pedir as<br />
benfeitorias do sítio.<br />
— Isto é o menos, meu amigo, o que eu queria era que você visse como se<br />
me preparam <strong>de</strong>sgraças.<br />
Antes do nascer do sol, <strong>Motta</strong> <strong>Coqueiro</strong>, que passara a noite em atroz vigília,<br />
saiu para o terreiro, e, <strong>de</strong>pois <strong>de</strong> or<strong>de</strong>nar que lhe tr<strong>ou</strong>xessem o cavalo, porque<br />
<strong>de</strong>sejava sair logo <strong>de</strong>pois do almoço, pôs-se a passear <strong>de</strong> um para <strong>ou</strong>tro lado.<br />
Os escravos vieram alinhar-se e com eles apareceram também no terreiro<br />
Faustino Silva e Florentino.<br />
O primeiro vinha pedir ao fazen<strong>de</strong>iro que lhe ce<strong>de</strong>sse algum açúcar, e o<br />
segundo tratar acerca da venda da posse na serra dos Olhos d'Água.<br />
162