Motta Coqueiro ou a Pena de Morte - Unama
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P<strong>ou</strong>co <strong>de</strong>pois via-se luz na sala <strong>de</strong> visitas da casa gran<strong>de</strong>, e <strong>ou</strong>viam-se falas<br />
entrecortadas por francas risadas.<br />
Recostado num canapé, junto do qual estavam assentados alguns homens<br />
<strong>de</strong> fisionomias distintas, <strong>Motta</strong> <strong>Coqueiro</strong> presidia uma conversa <strong>de</strong> amigos.<br />
O mais jovial e que mostrava mais privança com o fazen<strong>de</strong>iro era o Sr.<br />
Conceição, negociante resi<strong>de</strong>nte em Macaé.<br />
O seu rosto cheio e vulgar era entretanto atraente porque iluminava-o um<br />
olhar cheio <strong>de</strong> insinuante sincerida<strong>de</strong>.<br />
No mais era um homem <strong>de</strong> estatura mediana, sem reservas aristocráticas,<br />
sem posições estudadas; o antigo tipo do homem do comércio, que se per<strong>de</strong>u no<br />
dilúvio fervido do aperaltamento mo<strong>de</strong>rno, que olhando, para a fidalguia, fica sempre<br />
no ridículo.<br />
— Se você não tivesse chegado hoje, dizia o Sr. Conceição, amanhã só<br />
encontraria aqui muitas lembranças nossas. Batíamos asas sem mais <strong>de</strong>mora.<br />
— O que custa é o mais <strong>de</strong>sejado, respondia o capitão; e além disso as<br />
minhas ma<strong>de</strong>iras são como o vinho, quanto mais velhas mais caras. Está aí por que<br />
me <strong>de</strong>morei.<br />
— E lá ficaria se o vento não o fosse buscar. Pelo que eu vejo você não<br />
chega aqui sem tempesta<strong>de</strong>.<br />
— Nem sempre; aconteceu hoje para que vocês paguem-me não só as<br />
ma<strong>de</strong>iras mas ainda o incômodo da viagem. Eu levo só <strong>de</strong>z por cento. Antes isso do<br />
que ir para a estrada.<br />
— Homem! Por falar em estrada, é verda<strong>de</strong>; que se <strong>de</strong>u aqui um<br />
<strong>de</strong>saguisado entre você e um agregado?<br />
— É verda<strong>de</strong>; mas eu nem penso mais nisso, porque o tal agregado, que é<br />
meu compadre, gosta <strong>de</strong>mais do copo.<br />
— Mas neste caso cozinhe as carraspanas em casa, e não se engane com<br />
os cacos alheios. Se fosse comigo o negócio não ficaria assim.<br />
— Eu também quis processá-lo; mas não só tive <strong>de</strong> lutar com a animosida<strong>de</strong><br />
do Oliveira e trampolinice do Licério, mas também <strong>de</strong> compa<strong>de</strong>cer-me do tal meu<br />
compadre, aten<strong>de</strong>ndo a que tem uma família numerosa. Ele há <strong>de</strong> achar quem o<br />
ensine, porque ninguém as faz que não as pague. Há c<strong>ou</strong>sas que dito-me muito<br />
mais que pensar...<br />
— Ah! Tem também seus segredos; <strong>de</strong>ixe estar que eu hei <strong>de</strong> pô-lo em bons<br />
lençóis com a D. Maria. Vejam o sonsinho.<br />
— Qual, por este lado não há que temer; já tenho os meus cinqüenta sobre<br />
as costas. O que me impressiona mais hoje é a eleição <strong>de</strong> <strong>de</strong>putados gerais, para<br />
cuja vitória o governo mand<strong>ou</strong> para Campos um juiz <strong>de</strong> direito, escolhido a <strong>de</strong>do.<br />
— Ora <strong>de</strong>ixe-se disso; você bem sabe que, trabalhando, taboqueia o bicho.<br />
— Não é tão fácil; os diabos dos caudilhos do governo têm-me intrigado à<br />
gran<strong>de</strong>. Pois o que é a convivência do Oliveira com o meu agregado, senão um meio<br />
<strong>de</strong> <strong>de</strong>smoralizar-me? Agora a verda<strong>de</strong> é que o finório per<strong>de</strong> <strong>de</strong> todo o seu tempo.<br />
A conversação esten<strong>de</strong>u-se por mais <strong>de</strong> uma hora sempre salpicada pelos<br />
epigramas e malignida<strong>de</strong>s joviais do Sr. Conceição, que assim confirmava uma<br />
regra geral; os caracteres sadios e vigorosos são intimamente alegres.<br />
Já pela madrugada os amigos separaram-se e tomaram os seus aposentos.<br />
O sol, apesar <strong>de</strong> alto, iluminava furtivamente o céu, quando <strong>de</strong> novo o<br />
fazen<strong>de</strong>iro avist<strong>ou</strong>-se com os seus hóspe<strong>de</strong>s.<br />
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