Motta Coqueiro ou a Pena de Morte - Unama
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www.nead.unama.br<br />
Passaram os dois dias do prazo fixado por Francisco Benedito para a<br />
solução <strong>de</strong>finitiva.<br />
Mais <strong>de</strong> meta<strong>de</strong> do dia 7 <strong>de</strong> <strong>de</strong>zembro <strong>de</strong> 1851 esper<strong>ou</strong> <strong>Motta</strong> <strong>Coqueiro</strong> pela<br />
chegada <strong>de</strong> seu compadre para que se concordasse o preço da paz e da<br />
tranqüilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> ambos.<br />
Vã expectativa. Na véspera o agregado voltara à casa, após a consulta às<br />
autorida<strong>de</strong>s locais, e <strong>de</strong>clar<strong>ou</strong>-se <strong>de</strong>cidido a não ce<strong>de</strong>r a sua posse e a não entrar<br />
em ajuste algum razoável.<br />
A causa <strong>de</strong>sta resolução <strong>de</strong>u-a ele à sua mulher, que, apesar <strong>de</strong> discordar,<br />
não resistiu-lhe.<br />
— Bem me estava palpitando o coração, disse o agregado, assentando-se<br />
em um mocho da sala da entrada; aquele <strong>de</strong>mônio o que quer é ferrar-me uma<br />
logra<strong>de</strong>la, mas eu já não caio, e hei <strong>de</strong> ensinar-lhe o bom caminho.<br />
— Duzentos mil réis valem a pena, seu Chico, e é melhor você pegar no<br />
trato e ficarmos <strong>de</strong>scansados; advertiu a fleumática mulher.<br />
— Você não enten<strong>de</strong> <strong>de</strong> negócios, senhora; pergunte ali ao Sebastião se é<br />
logro <strong>ou</strong> não, e pense bem no caso.<br />
O violeiro que, tendo chegado com Francisco Benedito, fora sentar-se a um<br />
canto da sala, respon<strong>de</strong>u com a sua natural vivacida<strong>de</strong>:<br />
— Nem é preciso perguntar, isto está a entrar pelos olhos <strong>de</strong>ntro. Só a casa<br />
pela ma<strong>de</strong>ira <strong>de</strong> que foi construída vale mais do que a oferta. Agora ajunte-lhe um<br />
cafezal <strong>de</strong> mais <strong>de</strong> quinhentos pés, roças <strong>de</strong> mandioca, milho, etc., e veja quanto o<br />
capitão <strong>de</strong>ve pagar. Tolo será seu Chico se estiver pelo que o bicho quer.<br />
— Mas o compadre não disse que os duzentos eram a sua última palavra,<br />
talvez dê mais uns trinta <strong>ou</strong> cinqüenta.<br />
— Qual, mulher! Se ele não escarrar quinhentos, <strong>ou</strong> ao menos, ao menos<br />
quatrocentos, não leva o meu suor. É rico, po<strong>de</strong> pagar; e há <strong>de</strong> pagar, exclam<strong>ou</strong> o<br />
agregado.<br />
À vista <strong>de</strong> tão <strong>de</strong>scabida exigência a boa mulher sacudiu os ombros e<br />
retir<strong>ou</strong>-se.<br />
Eram horas <strong>de</strong> sossego e rep<strong>ou</strong>so; já havia muito que <strong>de</strong> envolta com o<br />
crepúsculo tinha cessado o gazear das aves, e que haviam acordado com as<br />
estrelas os zumbidos dos grilos importunos e da mosquitada impertinente.<br />
Mora estes ruídos, o fraquíssimo silêncio, o religioso remanso da natureza, a<br />
solene afonia da noite.<br />
— São horas <strong>de</strong> dormir, meu velho, disse o violeiro p<strong>ou</strong>co <strong>de</strong>pois que a<br />
mulher <strong>de</strong> Francisco Benedito se retir<strong>ou</strong>. Precisamos acordar cedo; salvo se você já<br />
não está pelo que trat<strong>ou</strong> comigo.<br />
— Palavra é pedra, respon<strong>de</strong>u o agregado; o que fic<strong>ou</strong> assentado, está<br />
assentado.<br />
A sala fic<strong>ou</strong> em absoluto silêncio.<br />
De manhãzinha já Sebastião estava <strong>de</strong> pé, agitava-o uma impaciência febril.<br />
Abriu as janelas da sala, cantarol<strong>ou</strong>, mediu a passos o recinto e afinal saiu para o<br />
terreiro.<br />
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