Motta Coqueiro ou a Pena de Morte - Unama
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www.nead.unama.br<br />
O pru<strong>de</strong>nte Sr. Oliveira já a esse tempo braçara-se com o agregado, que,<br />
vociferando, forcejava por <strong>de</strong>sembaraçar-se e dirigir-se à filha, a quem cercavam<br />
suas irmãs e mãe, banhadas em pranto.<br />
— Homem, escute, arrazo<strong>ou</strong> Sebastião para o possesso pai; não é<br />
per<strong>de</strong>ndo o siso que você há <strong>de</strong> <strong>de</strong>slindar a meada. Não esteja também fazendo<br />
futuros maus. Você é criança <strong>ou</strong> é um pai <strong>de</strong> família? Atenda primeiro, com<br />
seiscentos mil raios. Está a <strong>de</strong>scompor à toa a rapariga.<br />
Vencendo a pertinaz resistência do agregado, o Sr. Oliveira e Sebastião<br />
conseguiram tirá-lo para fora da sala e acalmá-lo um p<strong>ou</strong>co.<br />
Feito isto, o violeiro, que impressionara-se vivamente com o estado <strong>de</strong><br />
abatimento <strong>de</strong> Antonica e ainda mais com os olhares súplices <strong>de</strong> Chiquinha, <strong>ou</strong><br />
melhor pela evocação dos seus atos, segur<strong>ou</strong> Viana por um braço, e falando-lhe à<br />
parte, disse-lhe terminantemente:<br />
— Fique sabendo que o negócio é só com o capitão; <strong>de</strong>ixe-se, portanto, <strong>de</strong><br />
acusar a rapariga. Faça carga no bicho e p<strong>ou</strong>pe os mais, <strong>ou</strong> então eu parto para a<br />
cida<strong>de</strong> e v<strong>ou</strong> na presença do capitão <strong>de</strong>sarmar toda a igrejinha.<br />
— Mas já lhe contei o que ela me fez, respon<strong>de</strong>u colérico o ven<strong>de</strong>iro; eu não<br />
s<strong>ou</strong> homem para agüentar <strong>de</strong>saforos.<br />
— Está bom, está bom, seu Viana; nenhum <strong>de</strong> nós engana um ao <strong>ou</strong>tro;<br />
você não quer nem queria casar-se com Antonica e podia fazer como nós, não quis<br />
por tolo. Venha daí e veja se acomoda o velho. Nós temos sido amigos até hoje e<br />
não <strong>de</strong>vemos brigar por c<strong>ou</strong>sas <strong>de</strong> p<strong>ou</strong>ca monta. A zanga da menina há <strong>de</strong> passar;<br />
assim seja você bom para ela agora.<br />
Os escrúpulos <strong>de</strong> consciência, o sonho da vitória do amor pelo amor,<br />
nascem da sincerida<strong>de</strong> do afeto e da limpeza das intenções, quando, porém, a<br />
paixão limita-se ao <strong>de</strong>sejo da posse material da mulher, quaisquer que sejam os<br />
meios são sempre atraentes e exeqüíveis.<br />
Acresce que as paixões <strong>de</strong>sta or<strong>de</strong>m vegetam sempre nos corações<br />
apodrecidos pelo vício <strong>ou</strong> pela ignorância, do mesmo modo que certas parasitas<br />
preferem as árvores mortas para se proverem <strong>de</strong> seiva.<br />
O ven<strong>de</strong>iro não podia ser classificado senão na última das duas classes <strong>de</strong><br />
amantes, e por isso mesmo con<strong>de</strong>scen<strong>de</strong>u com a esperança dada por Sebastião.<br />
Sentando-se ao lado <strong>de</strong> Francisco Benedito, começ<strong>ou</strong> a asserená-lo,<br />
quando lhe pareceu oportuno.<br />
O velho, já vencido pela argumentação tersa do sub<strong>de</strong>legado e pelas meias<br />
palavras consoladoras <strong>de</strong> Sebastião, havia pon<strong>de</strong>rado criteriosamente.<br />
— Quem po<strong>de</strong> dizer se eu tenho <strong>ou</strong> não motivo para danar é o Viana, ele é<br />
quem sabe do negócio, mas está aí calado como um garrafão lacrado; é que ele<br />
pensa comigo.<br />
— Tem seus conformes, seu Chico, observ<strong>ou</strong> o ven<strong>de</strong>iro; eu ainda não falei<br />
nada.<br />
— Pois safe-se daí logo com o que sabe, grit<strong>ou</strong> o violeiro; é preciso a gente<br />
saber a quantas anda. Vamos por ora às apalpa<strong>de</strong>las.<br />
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