Hélio Rebello Cardoso Júnior - ICHS/UFOP
Hélio Rebello Cardoso Júnior - ICHS/UFOP
Hélio Rebello Cardoso Júnior - ICHS/UFOP
You also want an ePaper? Increase the reach of your titles
YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.
A partir dessas primeiras observações, pode-se pensar que a parrhesia<br />
era um exercício de disciplina individual, uma espécie de fala consigo mesmo<br />
ou oração meramente sussurrada. Mas, na verdade, falar a verdade envolvia<br />
uma atividade coletiva, pois na relação entre o falante e sua audiência estava<br />
pressuposta uma diferença social e por isso mesmo a verdade era perigosa<br />
para quem a proferia. Além disso, a parrhesia deve distinguir-se da mera<br />
verborragia daquele que fala desatinadamente para um plenário, perante o qual<br />
fazer o uso da palavra é prerrogativa em uma democracia. Ela distingue-se<br />
igualmente da confissão de quem abre a palavra e descreve em detalhe todos<br />
os movimentos de seu coração, supondo que a confissão, nesse sentido, o<br />
aproximaria de Deus. A parrhesia, então, não seria nem um direito democrático<br />
nem um exercício cristão.<br />
Para nós, quer dizer, hoje, um falante qualquer possui uma crença ou<br />
opinião e procura provar que ela é verdade através da reunião de provas que<br />
confiram à sua opinião o caráter de evidência. Ele procura prová-lo, antes de<br />
tudo, para si mesmo. Somente a partir dessa operação mental será possível<br />
fazer com que uma crença corresponda à verdade. Já, quanto à parrhesia dos<br />
Antigos, a operação não era mental, mas verbal, através da fala o falante sabia<br />
que sua opinião coincidia com a verdade e não tinha dúvida de que estava na<br />
posse da verdade. O falante não tinha de provar que o que dizia era verdade<br />
através de uma operação mental, pois a prova de que ele tinha acesso à<br />
verdade eram qualidades morais. E ele devia dispor destas, não apenas para<br />
garantir-lhe acesso à verdade, mas também para ter a autoridade de comunicá-<br />
la a outras pessoas. Por isso a maior prova de que o falante diz a verdade era<br />
a coragem de dizer algo diferente do que a maioria acreditava, de modo que