Hélio Rebello Cardoso Júnior - ICHS/UFOP
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Então, o paradoxo da amizade e do silêncio na sua forma mais simples é<br />
o seguinte: a amizade, inclusive para exercer o pensamento, deve passar pela<br />
prova do silêncio e da amnésia, tendo em vista a quantidade demente de falas<br />
e de imagens nas quais está imersa e nas quais o amigo é ofuscado.<br />
O problema de falar a verdade também está envolvido em certas<br />
circunstâncias que põem em evidência a clássica discussão a respeito de<br />
sentido histórico. Afinal, qual o sentido de dizer a verdade e como isso afeta<br />
nossa existência, historicamente falando?<br />
Em suas pesquisas a respeito do Mundo Antigo, em um de seus últimos<br />
textos, Foucault (1983) mostra que, durante a Antiguidade Greco-Romana e<br />
até os primeiros séculos da Era Cristã, existiam regras culturalmente vigentes a<br />
respeito de dizer a verdade (parrhesia – etimologicamente, “dizer tudo”). Isso<br />
significa que alguém que diz a verdade não pode se esconder atrás de<br />
qualquer efeito retórico, pois precisa dizer exatamente o que tem em mente,<br />
sem nada omitir. Então, o falante não pode esconder nada do ouvinte, ele<br />
precisa se aproximar o máximo possível do que está pensando, o sujeito que<br />
diz pela sua boca coincide com a consciência que pensa dentro dele, com sua<br />
opinião. Dessa forma, a parrhesia, falar a verdade difere de convencer alguém<br />
de uma verdade. A parrhesia, portanto, não é, em primeira instância, uma<br />
relação do falante com sua audiência, na qual ele levaria em conta as opiniões<br />
daqueles a quem fala mesmo que não fossem as suas próprias, procurando<br />
retoricamente precaver-se de reações contrárias para melhor convencer seus<br />
ouvintes. Antes de qualquer coisa, a parhesia é uma relação do falante com o<br />
que ele diz; é um exercício de si para consigo mesmo através da fala.