A Atividade Humana do Trabalho [Labor] em Hannah Arendt ...
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objeto, trabalha<strong>do</strong> [Die Arbeit (...) ist vergegenständlicht und der Gegenstand ist<br />
verarbeitet]”. 41<br />
Para Marx, a produção capitalista e a grande indústria, <strong>em</strong> particular,<br />
“completam finalmente, a separação entre as potências espirituais <strong>do</strong> processo de<br />
produção e o trabalho manual, b<strong>em</strong> como a transformação das mesmas <strong>em</strong> poderes <strong>do</strong><br />
capital sobre o trabalho”. 42 Não é, portanto, <strong>do</strong> “animal laborans” que Marx está<br />
tratan<strong>do</strong> quan<strong>do</strong> define o processo de trabalho nos seus el<strong>em</strong>entos simples, e é<br />
provavelmente o fato de ele não ter reduzi<strong>do</strong> o trabalho a uma atividade que produziria<br />
apenas bens de consumo necessários à vida biológica <strong>do</strong> hom<strong>em</strong> que provoca a crítica<br />
de <strong>Arendt</strong>. No fun<strong>do</strong>, é toda a concepção <strong>do</strong> hom<strong>em</strong> e <strong>do</strong> trabalho, <strong>em</strong> Marx, que ela<br />
recusa. 43<br />
<strong>Arendt</strong> termina esta primeira divisão (“O trabalho <strong>do</strong> nosso corpo e a obra de<br />
nossas mãos”) com o exame da categoria mais popular, diz ela, de trabalho manual e<br />
intelectual, e com as relações entre o pensar (“a atividade da cabeça”) e o “trabalho” e a<br />
“obra” (HC, pp. 79-81). Uma vez que <strong>Arendt</strong> entende por trabalho o que Adam Smith<br />
considerava como o trabalho improdutivo de um cria<strong>do</strong> <strong>do</strong>méstico, ou seja, um trabalho<br />
que não deixa atrás de si uma marca durável ou valor, é justamente a essa concepção de<br />
trabalho que ela vai comparar a “atividade da cabeça”. O pensamento ass<strong>em</strong>elha-se, de<br />
certa forma, ao trabalho assim defini<strong>do</strong> já que “não deixa coisa alguma tangível”: “Por<br />
si mesmo, o processo de pensar jamais se materializa <strong>em</strong> objetos” (HC, p. 79). Seria,<br />
então, apenas no que diz respeito à manifestação de seus pensamentos que um pensa<strong>do</strong>r<br />
ass<strong>em</strong>elha-se a um artesão. Mas “pensar” e “fabricar” são duas atividades que nunca<br />
chegam a coincidir:<br />
“(...) o pensa<strong>do</strong>r que deseja que o mun<strong>do</strong> conheça o “conteú<strong>do</strong>” de seus<br />
pensamentos t<strong>em</strong>, antes de mais nada, que parar de pensar e rel<strong>em</strong>brar seus<br />
pensamentos. A m<strong>em</strong>ória, neste caso, como <strong>em</strong> to<strong>do</strong>s os casos, prepara o<br />
intangível e o fugaz para sua materialização eventual; é o começo <strong>do</strong><br />
processo de fabricação [work process] e (...) o seu estágio mais imaterial.<br />
Assim, a própria obra s<strong>em</strong>pre requer algum material sobre o qual ela será<br />
realizada e que, por meio da fabricação, a atividade <strong>do</strong> homo faber, será<br />
transforma<strong>do</strong> <strong>em</strong> um objeto-<strong>do</strong>-mun<strong>do</strong> [wordly object]” (HC, p. 79).<br />
41. Ibid<strong>em</strong>; ver<strong>em</strong>os mais adiante a interpretação de <strong>Arendt</strong> deste último parágrafo.<br />
42. K. Marx, O Capital, Livro Primeiro, vol. 1, tomo 2, p. 44.<br />
43. H. <strong>Arendt</strong> poderia ter critica<strong>do</strong> a concepção <strong>do</strong> hom<strong>em</strong> <strong>em</strong> Marx. Toda a sua leitura de Marx consiste,<br />
ao contrário, numa tentativa de encontrar neste autor um conceito de trabalho como atividade nãoprodutiva,<br />
e essa leitura consegue apenas distorcer os próprios textos de Marx.<br />
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