contos de fadas: a construção discursiva ea ... - ICHS/UFOP
contos de fadas: a construção discursiva ea ... - ICHS/UFOP
contos de fadas: a construção discursiva ea ... - ICHS/UFOP
Create successful ePaper yourself
Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.
entretanto, é diferente em relação à <strong>de</strong> Perrault, pois passava por ali um lenhador que ouviu o<br />
roncar da velha e achou aquilo estranho. Entrou na casa e ao ver o lobo dormindo, disse: “E<br />
não é que o encontro aqui, seu velho pecador! – exclamou. – Faz bastante tempo que venho<br />
procurando você” (p. 287). O lenhador pega a espingarda, mas lhe ocorreu que talvez o lobo<br />
tivesse <strong>de</strong>vorado a velha, com uma faca, então, abre a barriga do lobo, <strong>de</strong> on<strong>de</strong> saem<br />
Chapeuzinho e sua vovozinha são e salvas. A menina trouxe umas pedras com as quais<br />
rech<strong>ea</strong>ram o lobo, quando o animal acordou e tentou correr, caiu morto. O conto se finda com<br />
a seguinte reflexão <strong>de</strong> Chapeuzinho: “Quando minha mãe proibir, nunca mais vou sair<br />
pass<strong>ea</strong>ndo pela floresta enquanto eu viver.” (p. 287).<br />
Para Mariza Men<strong>de</strong>s, no livro Em busca dos Contos Perdidos (2000), o fato da versão<br />
francesa não ter um final feliz contribui para que o conto seja caracterizado não como um<br />
conto <strong>de</strong> <strong>fadas</strong>, mas um conto <strong>de</strong> advertências. Além disso, ela nos lembra que no conto <strong>de</strong><br />
Perrault, diferentemente no dos Grimm, a menina não <strong>de</strong>sobe<strong>de</strong>ce à mãe, que, por sua vez,<br />
não lhe faz nenhuma advertência. No conto dos Grimm, entretanto, a mãe adverte a menina<br />
para que an<strong>de</strong> rápido e que não se afaste do caminho, mas ela a <strong>de</strong>sobe<strong>de</strong>ce e, como punição,<br />
é <strong>de</strong>vorada.<br />
Angela Carter inicia o conto A Companhia dos Lobos com uma inversão. Ao invés <strong>de</strong><br />
caracterizar a protagonista, a autora nos apresenta uma série <strong>de</strong> lendas que qualificam a<br />
personagem masculina, o anti-herói: o lobo. Nessas lendas, o narrador heterodiegético além<br />
<strong>de</strong> caracterizar o lobo como um ser feroz, astuto e como a “personificação carnívora”,<br />
também nos mostra a sua outra face, a <strong>de</strong> um lobisomem.<br />
O lobisomem vive cerca <strong>de</strong> sete anos, mas, se lhe queimarmos as roupas <strong>de</strong><br />
homem, con<strong>de</strong>namo-lo a ser lobo pelo resto da vida; por isso as velhas<br />
daqui pensam que se protegem atirando um chapéu ou avental a um<br />
lobisomem, como se as roupas fizessem o homem. (...) (CARTER, 1999, p.<br />
204)<br />
Angela Carter, através <strong>de</strong>ssas lendas, mostra o quão mal o lobo/lobisomem po<strong>de</strong> ser, o<br />
que, <strong>de</strong> certa forma, potencializa o clímax do conto que vai se manifestar no final da história.<br />
Como fora dito anteriormente, a escritora britânica constrói sua personagem<br />
modificando o discurso que caracterizava uma protagonista <strong>de</strong> <strong>contos</strong> <strong>de</strong> <strong>fadas</strong> dos séculos<br />
XVII, XVIII e XIX. Po<strong>de</strong>mos ver isso logo no começo da segunda parte, quando, em pleno<br />
inverno, a menina <strong>de</strong> “espírito indômito” insiste em atravessar o bosque para levar o cesto à