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contos de fadas: a construção discursiva ea ... - ICHS/UFOP

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CORRENDO COM OS LOBOS<br />

Ítalo Calvino, em Seis Propostas Para o Próximo Milênio (1995), ao se pronunciar<br />

sobre a “rapi<strong>de</strong>z”, afirma que a principal característica dos <strong>contos</strong> <strong>de</strong> <strong>fadas</strong> é a economia <strong>de</strong><br />

expressão, uma vez que, nesse gênero, os <strong>de</strong>talhes inúteis são negligenciados. Ou seja,<br />

(...) as peripécias mais extraordinárias são relatadas levando em conta<br />

apenas o essencial; é sempre uma luta contra os obstáculos que impe<strong>de</strong>m ou<br />

retardam a r<strong>ea</strong>lização <strong>de</strong> um <strong>de</strong>sejo ou a restauração <strong>de</strong> um bem perdido (...)<br />

(CALVINO, 1995, p. 50).<br />

Mas em Carter não vemos essa economia nas palavras. Como nos afirma Marina<br />

Warner (1999), nos <strong>contos</strong> da autora britânica, <strong>de</strong>paramos-nos com uma prosa híbrida, sendo,<br />

ao mesmo tempo, elaborada e vulgar. Angela Carter, ao atualizar os conteúdos daquilo que<br />

um dia foi “a ficção dos pobres e iletrados”, nos mostra uma linguagem <strong>de</strong>licadamente<br />

complexa, artificial e rebuscada.<br />

Conforme Cristina Bacchilega, em “An Introduction to the ‘Innocent Persecuted<br />

Heroine’ Fairy Tales” (1993), os discursos narrativos dos <strong>contos</strong> <strong>de</strong> <strong>fadas</strong> tradicionais<br />

limitam o papel das mulheres a “mães” e “filhas”. O fato dos narradores dos <strong>contos</strong> <strong>de</strong> <strong>fadas</strong><br />

serem geralmente em terceira pessoa e também por essas histórias terem sido transcritas por<br />

homens, contribuíram para que as personagens femininas fossem construídas a partir <strong>de</strong><br />

i<strong>de</strong>ologias patriarcais. Nessas narrativas, na maioria das vezes as heroínas não têm voz. Suas<br />

inocências e perseguições que geralmente sofrem são construídas sob a i<strong>de</strong>alização <strong>de</strong> uma<br />

socieda<strong>de</strong> aristocrática, em que a heroína está disponível para ser salva pelo herói. No fim da<br />

jornada do príncipe encantado, haverá uma mulher esperando por ele, com a qual irá se casar<br />

e possuí-la sexualmente.<br />

Angela Carter, em The Bloody Chamber, <strong>de</strong>sconstrói todas essas características<br />

advindas <strong>de</strong> uma socieda<strong>de</strong> patriarcal por meio das quais as personagens femininas foram<br />

constituídas <strong>discursiva</strong>mente nos <strong>contos</strong> <strong>de</strong> <strong>fadas</strong> tradicionais. Suas heroínas não são frágeis<br />

nem inocentes, mas ambivalentes e, em alguns <strong>contos</strong>, elas têm a oportunida<strong>de</strong> <strong>de</strong> contar as<br />

suas próprias histórias. Percebemos, portanto, que as personagens femininas nos <strong>contos</strong> <strong>de</strong><br />

Carter não são construídas <strong>de</strong> uma maneira simplista como nos <strong>contos</strong> <strong>de</strong> <strong>fadas</strong> <strong>de</strong> outrora. A<br />

complexida<strong>de</strong> psicológica e a audácia que a elas são atribuídas <strong>de</strong>marcam suas i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong>s.<br />

Dessa forma, a escritora britânica, ao <strong>de</strong>senvolver suas personagens, nos mostra os <strong>de</strong>sejos<br />

femininos mais profundos.

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