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Doenças inflamatórias da orelha média - SPR

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<strong>Doenças</strong> <strong>inflamatórias</strong> <strong>da</strong> <strong>orelha</strong> <strong>média</strong> / Boasquevisque GS et al.<br />

<strong>Doenças</strong> <strong>inflamatórias</strong> <strong>da</strong> <strong>orelha</strong> <strong>média</strong><br />

Artigo Original<br />

Gustavo Santos Boasquevisque1 , Carlos Ramon de Andrade2 , Eliana Teles Santos Boasquevisque3 ,<br />

Augusto José Cavalcante Neto4 , Edson Mendes Boasquevisque5 Descritores:<br />

Colesteatoma; Otite <strong>média</strong>; Orelha <strong>média</strong>;<br />

Tomografia computadoriza<strong>da</strong>; Ressonância<br />

magnética.<br />

Recebido para publicação em 13/4/2009. Aceito,<br />

após revisão, em 15/7/2009.<br />

Trabalho realizado no Instituto Nacional de Câncer<br />

(INCA)/Ministério <strong>da</strong> Saúde, Rio de Janeiro, RJ, e<br />

na Clínica Vale Imagem, Barra Mansa, RJ.<br />

1<br />

Médico Radiologista do Hospital São Vicente de<br />

Paula, Rio de Janeiro, RJ, e <strong>da</strong> Clínica Vale Imagem.<br />

2<br />

Médico Otorrinolaringologista <strong>da</strong> Santa Casa de<br />

Misericórdia de Barra Mansa, Chefe do Serviço de<br />

Saúde Auditiva.<br />

3 Médica Radiologista, Chefe do Departamento de<br />

Imagem do INCA.<br />

4<br />

Médico Radiologista <strong>da</strong> Clínica Vale Imagem.<br />

5<br />

Médico Radiologista do INCA e <strong>da</strong> Clínica Vale<br />

Imagem, Professor Doutor <strong>da</strong> Facul<strong>da</strong>de de Medicina<br />

<strong>da</strong> Universi<strong>da</strong>de do Estado do Rio de Janeiro<br />

(UERJ).<br />

Correspondência: Dr. Gustavo Santos Boasquevisque.<br />

Rua Tonelero, 2/903, Copacabana. Rio de<br />

Janeiro, RJ, 22030-010. E-mail: gsboas@gmail.<br />

com<br />

Resumo<br />

OBJETIVO: Determinar as alterações tomográficas mais frequentes na doença inflamatória <strong>da</strong> <strong>orelha</strong><br />

<strong>média</strong> e comparar os achados <strong>da</strong> tomografia computadoriza<strong>da</strong> e <strong>da</strong> ressonância magnética com<br />

os <strong>da</strong>dos otológicos e cirúrgicos. MATERIAL E MÉTODO: Foram comparados os resultados dos exames<br />

de imagem, clínico e cirúrgico de 95 pacientes (95 tomografias computadoriza<strong>da</strong>s e uma ressonância<br />

magnética). RESULTADOS: Em 52 casos os resultados dos exames de imagem foram<br />

normais. Dos 43 pacientes com alterações radiológicas, a comparação com os achados dos exames<br />

de imagem, otolaringológico e histopatológico demonstrou: otomastoidite agu<strong>da</strong> em 2 (4,6%)<br />

pacientes, otomastoidite crônica unilateral em 9 (21,0%), otomastoidite crônica bilateral em 2 (4,6%),<br />

colesteatoma unilateral em 26 (60,5%) e colesteatoma bilateral em 4 (9,3%). CONCLUSÃO: A tomografia<br />

computadoriza<strong>da</strong> foi capaz de definir as características <strong>da</strong>s lesões e as complicações existentes<br />

na maioria dos casos e foi necessário o uso <strong>da</strong> ressonância magnética em um dos 43 pacientes<br />

com alterações radiológicas, para definir o tipo de material presente na <strong>orelha</strong> <strong>média</strong>. O conhecimento<br />

dos <strong>da</strong>dos clínicos e do exame otológico permitiu a interpretação dos achados de imagem<br />

mais apropria<strong>da</strong> para ca<strong>da</strong> caso.<br />

A <strong>orelha</strong> <strong>média</strong> é o segmento aerado do osso temporal situado entre a membrana<br />

timpânica e a <strong>orelha</strong> interna, compondo um espaço de fun<strong>da</strong>mental importância<br />

para a audição.<br />

Anatomicamente e di<strong>da</strong>ticamente, no plano axial a cavi<strong>da</strong>de timpânica é dividi<strong>da</strong><br />

em protímpano, mesotímpano e tímpano posterior, a partir <strong>da</strong>s bor<strong>da</strong>s anterior<br />

e posterior do conduto auditivo externo (CAE). No plano coronal, utilizando<br />

como limites as paredes inferior e superior do CAE, ela é dividi<strong>da</strong> em hipotímpano,<br />

mesotímpano e epitímpano [1] (Fig.1– A,B).<br />

A cavi<strong>da</strong>de epitimpânica abriga a cadeia ossicular (martelo, bigorna e estribo),<br />

seus ligamentos e os tendões dos músculos tensor do tímpano e do estribo [2] (Fig. 1<br />

– C,D). Os ossículos situam-se equidistantes <strong>da</strong>s paredes medial e lateral do epitímpano.<br />

As pregas mucosas, considera<strong>da</strong>s como o mesentério <strong>da</strong> cavi<strong>da</strong>de, juntamente<br />

com os ossículos criam compartimentos que aju<strong>da</strong>m limitar as doenças nestes espaços,<br />

por tempo variado.<br />

O diafragma timpânico, descrito inicialmente por Proctor, é formado pela cabeça<br />

e pescoço do martelo, corpo e processo curto <strong>da</strong> bigorna, ligamentos anterior<br />

e lateral do martelo, ligamento <strong>da</strong> bigorna, pregas lateral e medial <strong>da</strong> bigorna e prega<br />

tensora. Este diafragma separa o ático do mesotímpano, os quais se comunicam<br />

através de duas aberturas referi<strong>da</strong>s como istmos timpânicos [1,2] .<br />

A membrana timpânica separa a <strong>orelha</strong> externa <strong>da</strong> <strong>orelha</strong> <strong>média</strong> e é dividi<strong>da</strong><br />

em duas partes, a parte fláci<strong>da</strong> (membrana de Shrapnell) e a parte tensa. Histologicamente,<br />

é composta de três cama<strong>da</strong>s de células: uma interna, continuação <strong>da</strong> mucosa<br />

de revestimento <strong>da</strong> <strong>orelha</strong> <strong>média</strong>; uma externa, continuação <strong>da</strong> mucosa do CAE;<br />

e uma cama<strong>da</strong> <strong>média</strong> de tecido fibroso, que só está presente na parte tensa. Isto<br />

Rev Imagem 2008;30(4):143–151<br />

143


Boasquevisque GS et al. / <strong>Doenças</strong> <strong>inflamatórias</strong> <strong>da</strong> <strong>orelha</strong> <strong>média</strong><br />

explica a propensão à formação de bolsas retráteis na<br />

parte fláci<strong>da</strong>, que facilitam o acúmulo de débris celulares<br />

e o desenvolvimento do colesteatoma no espaço de<br />

Prussak [2] .<br />

O espaço de Prussak (Fig. 1D) situa-se no epitímpano,<br />

entre o martelo e a membrana timpânica (margem<br />

lateral limita<strong>da</strong> pela parte fláci<strong>da</strong> <strong>da</strong> membrana timpânica,<br />

cau<strong>da</strong>l pelo processo curto do martelo e anterior<br />

e superiormente pelo ligamento lateral do martelo), e<br />

seu reconhecimento é importante pois é o local de origem<br />

<strong>da</strong> maioria dos colesteatomas adquiridos [1,3] .<br />

A comunicação entre o epitímpano e o antro mastoideo<br />

ocorre através de um estreito com formato triangular,<br />

conhecido como aditus ad antrum [1] (Fig. 1E), que,<br />

juntamente com o istmo, estão frequentemente obstruídos<br />

nos processos inflamatórios crônicos.<br />

A comunicação entre as <strong>orelha</strong>s <strong>média</strong> e interna<br />

ocorre através <strong>da</strong> janela oval (fen<strong>da</strong> vestibular) e <strong>da</strong> janela<br />

redon<strong>da</strong> (fen<strong>da</strong> coclear), a primeira recoberta pela<br />

platina do estribo.<br />

144<br />

A B<br />

Ao longo <strong>da</strong> parede medial do epitímpano acha-se<br />

o segmento horizontal ou timpânico do nervo facial, coberto<br />

por uma fina lâmina óssea, que se estende até a<br />

parte posterior do epitímpano, onde forma o segundo<br />

joelho e se continua como segmento mastoideo (porção<br />

descendente). A deiscência do canal ósseo do nervo facial<br />

é frequente, considera<strong>da</strong> variante do normal.<br />

MATERIAL E MÉTODO<br />

C D E<br />

Foram avaliados, retrospectivamente, os exames de<br />

95 pacientes com sintomas clínicos de doença <strong>da</strong> <strong>orelha</strong><br />

<strong>média</strong>. Em todos foram realizados exame clínico e<br />

tomografia computadoriza<strong>da</strong> (TC), e para um deles<br />

também foi realiza<strong>da</strong> ressonância magnética (RM). A<br />

i<strong>da</strong>de dos pacientes variou de 6 a 82 anos.<br />

Os pacientes investigados eram virgens de tratamento<br />

cirúrgico <strong>da</strong>s <strong>orelha</strong>s. O primeiro exame realizado<br />

foi sempre a TC, e a RM foi utiliza<strong>da</strong> em um único<br />

caso para esclarecer extensão endocraniana <strong>da</strong> doença.<br />

Fig. 1 – Anatomia. (A,B) TC nos planos axial e coronal: divisão <strong>da</strong> cavi<strong>da</strong>de timpânica (linhas tangenciais). (C,D,E) Plano axial: AMB – articulação<br />

martelo-bigorna; Adi – aditus ad antrum; Antro – antro; Big – bigorna; Cabo – cabo do martelo; CAI – conduto auditivo interno; Coc –<br />

cóclea; CC – crus comum; CM – cabeça do martelo; CSA – canal semicircular anterior; CSH – canal semicircular horizontal; CSP – canal semicircular<br />

posterior; ECh – parede lateral do ático; Epi – epitímpano; EPr – espaço de Prussak; GG – gânglio geniculado; MTimp – membrana<br />

timpânica; MTT – músculo tensor do tímpano ; VII – nervo facial; Vest – vestíbulo coclear.<br />

Rev Imagem 2008;30(4):143–151


As TCs foram realiza<strong>da</strong>s em equipamento helicoi<strong>da</strong>l<br />

com aquisição no plano axial através de cortes contíguos<br />

com 1 mm de espessura, com posterior reconstrução<br />

nos planos coronal e oblíquo. Nos casos duvidosos,<br />

imagens adquiri<strong>da</strong>s diretamente no plano coronal<br />

foram obti<strong>da</strong>s. A solução de contraste io<strong>da</strong>do foi administra<strong>da</strong><br />

por via venosa para avaliar envolvimento <strong>da</strong>s<br />

estruturas meníngeas e encefálicas.A RM foi realiza<strong>da</strong><br />

em equipamento de 0,2 T, com sequências pondera<strong>da</strong>s<br />

em T1 antes e após administração de contraste, T2 e difusão<br />

de prótons no plano coronal. As imagens foram<br />

interpreta<strong>da</strong>s por dois radiologistas.<br />

RESULTADOS<br />

Dos 95 pacientes estu<strong>da</strong>dos, 52 tinham exames<br />

normais. Os 43 restantes apresentaram os exames alterados<br />

(Tabela 1), com os achados a seguir descritos.<br />

Otomastoidite agu<strong>da</strong><br />

A otomastoidite agu<strong>da</strong> foi encontra<strong>da</strong> em dois casos<br />

(4,6%) com comprometimento unilateral. Os sinto-<br />

TABELA 1 – Resultados <strong>da</strong> tomografia computadoriza<strong>da</strong>.<br />

Resultados<br />

n Porcentagem<br />

Normais<br />

Anormais<br />

Otomastoidite agu<strong>da</strong><br />

Otomastoidite crônica<br />

– unilateral<br />

– bilateral<br />

Colesteatoma adquirido<br />

– unilateral<br />

– bilateral<br />

Total<br />

Fig. 2 – Abscesso de Bezold.<br />

TC no plano axial: velamento<br />

<strong>da</strong> <strong>orelha</strong> <strong>média</strong>, células<br />

mastoideas e tuba auditiva,<br />

com desmineralização<br />

<strong>da</strong>s trabéculas na apófise<br />

mastoide e formação de<br />

abscesso na inserção proximal<br />

do músculo esternocleidomastoideo.<br />

52<br />

43<br />

2<br />

11<br />

9<br />

2<br />

30<br />

26<br />

4<br />

95<br />

55%<br />

45%<br />

4,6%<br />

25,5%<br />

69,7%<br />

100%<br />

A B<br />

<strong>Doenças</strong> <strong>inflamatórias</strong> <strong>da</strong> <strong>orelha</strong> <strong>média</strong> / Boasquevisque GS et al.<br />

mas clínicos eram otalgia, otorreia purulenta e febre, e<br />

um dos pacientes apresentava abaulamento retroauricular<br />

doloroso. Ao exame otoscópico, a membrana timpânica<br />

encontrava-se avermelha<strong>da</strong> e abaula<strong>da</strong>.<br />

Os achados de imagem foram opacificação <strong>da</strong> <strong>orelha</strong><br />

<strong>média</strong> e <strong>da</strong>s células <strong>da</strong> mastoide por material hipodenso,<br />

desmineralização do trabeculado ósseo com áreas<br />

de destruição e coalescência <strong>da</strong>s células com formação<br />

de nível líquido (Fig. 2A). Em um dos casos observou-se<br />

perfuração <strong>da</strong> membrana timpânica, além de erosão <strong>da</strong><br />

parede do seio sigmoide, destruição <strong>da</strong> apófise mastoide<br />

e formação de abscesso na inserção do músculo esternocleidomastoideo,<br />

o que explica o abaulamento retroauricular<br />

doloroso – abscesso de Bezold (Fig. 2B).<br />

Otomastoidite crônica<br />

Onze pacientes (25,6%) apresentavam otomastoidite<br />

crônica, dos quais 9 (21,0%) tinham doença unilateral<br />

e 2 (4,6%), bilateral. Os pacientes com otomastoidite<br />

crônica bilateral apresentavam quadro clínico e<br />

achados radiológicos compatíveis com doença de evolução<br />

prolonga<strong>da</strong>. Clinicamente, apresentavam ou já<br />

haviam apresentado descarga purulenta e déficit auditivo<br />

parcial. Ao exame otoscópico identificou-se membrana<br />

timpânica espessa<strong>da</strong>, avermelha<strong>da</strong> e com perfuração<br />

central, além de alterações <strong>inflamatórias</strong> na mucosa<br />

<strong>da</strong> <strong>orelha</strong> <strong>média</strong>.<br />

Os achados na TC foram velamento <strong>da</strong>s células <strong>da</strong><br />

mastoide, espessamento e retração <strong>da</strong> membrana timpânica.<br />

Nos casos com menor tempo de evolução, o<br />

espessamento do trabeculado ósseo predominava em<br />

relação às áreas esparsas de desmineralização, além <strong>da</strong><br />

presença de espessamento <strong>da</strong>s estruturas tendíneas e<br />

ligamentares <strong>da</strong> <strong>orelha</strong> <strong>média</strong>, principalmente os tendões<br />

tensor do tímpano e do músculo do estribo e do<br />

ligamento anterior do martelo, presentes em alguns<br />

Rev Imagem 2008;30(4):143–151 145


Boasquevisque GS et al. / <strong>Doenças</strong> <strong>inflamatórias</strong> <strong>da</strong> <strong>orelha</strong> <strong>média</strong><br />

casos (Fig. 3 – A,B). Nos casos de evolução mais prolonga<strong>da</strong><br />

havia acentua<strong>da</strong> esclerose do trabeculado ósseo,<br />

redução importante do número de células e preenchimento<br />

<strong>da</strong>s células remanescentes por material com densi<strong>da</strong>de<br />

de partes moles. Nos casos mais avançados observaram-se<br />

timpanoesclerose e calcificação <strong>da</strong> cadeia<br />

ossicular no nível do epitímpano (Fig. 3C).<br />

Colesteatoma adquirido<br />

Dos 43 pacientes com exames alterados, 30 (69,8%)<br />

apresentaram colesteatoma, sendo 26 (60,5%) unilaterais<br />

e 4 (9,3%) bilaterais. Todos os colesteatomas eram<br />

<strong>da</strong> parte fláci<strong>da</strong> <strong>da</strong> membrana timpânica. Os sinais e sintomas<br />

mais frequentes foram otorreia crônica, surdez<br />

de condução, labirintite e paralisia facial. Ao exame otoscópico<br />

observou-se retração <strong>da</strong> membrana timpânica,<br />

com perfuração <strong>da</strong> parte fláci<strong>da</strong> e drenagem de material<br />

espesso com débris.<br />

A B C<br />

146<br />

A TC mostrou a presença de tecido com densi<strong>da</strong>de<br />

de partes moles ocupando a cavi<strong>da</strong>de timpânica, em<br />

especial o espaço de Prussak e o epitímpano, destruição<br />

<strong>da</strong> parede lateral do ático e do tegmen timpani, destruição<br />

e luxação medial <strong>da</strong> cadeia ossicular e retração<br />

<strong>da</strong> membrana timpânica, que em alguns casos encontrava-se<br />

aderi<strong>da</strong> ao promontório (Fig. 4). Num dos casos<br />

em que havia extensa destruição do teto timpânico,<br />

a TC de crânio mostrou coleções subdurais na fossa<br />

<strong>média</strong> e abscesso intraparenquimatosa no lobo temporal<br />

(Fig. 5 – A,B). Nos casos em que os pacientes apresentavam<br />

paralisia facial periférica e labirintite, identificou-se<br />

erosão do canal ósseo do nervo facial e fístula do<br />

canal semicircular posterior, respectivamente (Fig. 5C).<br />

A RM foi realiza<strong>da</strong> em um paciente para exclusão de<br />

complicações intracranianas, e a sequência em difusão<br />

de prótons foi capaz de evidenciar a presença do colesteatoma<br />

na <strong>orelha</strong> <strong>média</strong> (Fig. 5D).<br />

Fig. 3 – Otomastoidite crônica. (A,B) TC axial: espessamento <strong>da</strong> membrana timpânica (MTimp), do tendão do tensor do tímpano (TTT), do<br />

músculo do estribo (TME) e do ligamento anterior do martelo (LAM). Notar o velamento <strong>da</strong>s células mastoideas (M), em menor número e com<br />

trabeculado ósseo espessado. ACI – artéria caróti<strong>da</strong> interna. (C) Timpanoesclerose: estágio avançado de otomastoidite crônica, com esclerose<br />

<strong>da</strong>s células mastoideas e calcificação irregular na cápsula ótica, compatível com timpanoesclerose .<br />

A B C<br />

Fig. 4 – Colesteatoma. TC nos planos coronal e axial. (A) Massa de partes moles no espaço de Prussak (P), com erosão do esporão de Chaussée<br />

(Ch). (B,C) Massa de partes moles no epitímpano destruindo a parede lateral do ático (At), com erosão do corpo <strong>da</strong> bigorna e destruição <strong>da</strong><br />

cabeça do martelo (Os).<br />

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DISCUSSÃO<br />

A<br />

Otomastoidite agu<strong>da</strong><br />

C D<br />

A otite <strong>média</strong> agu<strong>da</strong> é um processo que começa no<br />

trato aéreo superior e nasofaringe, ascende pela trompa<br />

audutiva (trompa de Eustáquio) e atinge a <strong>orelha</strong> <strong>média</strong>.<br />

Na maioria <strong>da</strong>s vezes, o diagnóstico se baseia nos<br />

<strong>da</strong>dos clínicos e achados <strong>da</strong> otoscopia, que mostra eritema,<br />

edema e abaulamento <strong>da</strong> membrana timpânica [4,5] .<br />

Atualmente, as complicações são raras, mas na presença<br />

de sinais clínicos de suspeição, a investigação com<br />

os métodos de imagem está indica<strong>da</strong> e deve se iniciar<br />

com a TC [4] .<br />

A progressão do processo infeccioso <strong>da</strong> mucosa<br />

pode levar à infecção óssea, considera<strong>da</strong> causa <strong>da</strong> maioria<br />

<strong>da</strong>s complicações [4] . A destruição dos septos intercelulares<br />

<strong>da</strong> mastoide resulta em áreas de coalescência,<br />

supuração e formação de abscesso (Fig. 2A). A erosão <strong>da</strong>s<br />

paredes ósseas <strong>da</strong> mastoide leva ao extravasamento <strong>da</strong><br />

<strong>Doenças</strong> <strong>inflamatórias</strong> <strong>da</strong> <strong>orelha</strong> <strong>média</strong> / Boasquevisque GS et al.<br />

Fig. 5 – Complicações do colesteatoma. TC e RM. (A,B) Erosão do teto do tímpano, com formação de coleção subdural e abscesso intraparenquimatoso<br />

no lobo temporal (cabeça de seta). (C) Tecido com densi<strong>da</strong>de de partes moles no antro e no epitímpano, com destruição dos ossículos<br />

e erosão do canal semicircular posterior. (D) RM com imagem em difusão no plano coronal: lesão com restrição à difusão na <strong>orelha</strong> <strong>média</strong><br />

esquer<strong>da</strong> (seta).<br />

doença, com abscesso subperiosteal, abscesso extraósseo<br />

na inserção do músculo esternocleidomastoideo no processo<br />

mastoide, conhecido como abscesso de Bezold<br />

(Fig. 2B), envolvimento do ápice petroso (síndrome de<br />

Gradenigo), trombose séptica de seio dural, meningite,<br />

abscesso epidural, subdural e intraparenquimatoso [4,5] .<br />

A síndrome de Gradenigo resulta <strong>da</strong> infecção <strong>da</strong><br />

mucosa <strong>da</strong>s células do ápice petroso com envolvimento<br />

meníngeo e dos nervos próximos à região <strong>da</strong> ponta do<br />

rochedo (V e VI pares cranianos), cursando com trigeminalgia<br />

e paralisia do abducente, além de otorreia [4] .<br />

Há velamento <strong>da</strong>s células do ápice petroso associado a<br />

destruição óssea <strong>da</strong> ponta do rochedo.<br />

A paralisia facial é outra complicação possível, porém<br />

menos frequente. Quando ocorre no início do<br />

quadro, o envolvimento do nervo facial é decorrente <strong>da</strong><br />

inflamação e edema <strong>da</strong> parte do nervo dentro do canal<br />

ósseo. A recuperação <strong>da</strong> função do nervo ocorre com o<br />

tratamento conservador. A RM após injeção venosa de<br />

Rev Imagem 2008;30(4):143–151 147<br />

B


Boasquevisque GS et al. / <strong>Doenças</strong> <strong>inflamatórias</strong> <strong>da</strong> <strong>orelha</strong> <strong>média</strong><br />

gadolínio pode mostrar realce do segmento do nervo<br />

envolvido. A paralisia facial após duas semanas do início<br />

<strong>da</strong> doença pode estar associa<strong>da</strong> a erosão do canal<br />

ósseo, com extensão <strong>da</strong> infecção para o seu interior [5] .<br />

A RM é mais sensível do que a TC para a avaliação<br />

dos seios venosos e pode mostrar, com maior acurácia,<br />

a trombose do seio sigmoide, a extensão intracraniana<br />

do processo infeccioso e o comprometimento neural [6] .<br />

Nesta última situação, os nervos comprometidos ficam<br />

espessados e apresentam realce após a administração<br />

venosa de contraste [4] .<br />

A otite externa maligna necrotizante é uma infecção<br />

bacteriana causa<strong>da</strong> por Pseudomonas que acomete<br />

diabéticos e pacientes imunodeprimidos. O quadro clínico<br />

inicial é de uma otite externa que se estende às<br />

paredes do CAE, resultando em osteomielite que pode<br />

se estender para a <strong>orelha</strong> <strong>média</strong>, envolver o nervo facial,<br />

os nervos cranianos IX, X, XI e XII, a fossa jugular e a<br />

articulação temporomandibular. Os resultados dos exames<br />

de imagem são similares aos do carcinoma do CAE,<br />

com extensa destruição óssea que pode comprometer<br />

a <strong>orelha</strong> <strong>média</strong> e as suas estruturas. Em casos mais avançados,<br />

pode haver comprometimento do ápice petroso,<br />

forame estilomastoideo, articulação temporomandibular<br />

e fossa jugular [5] . Na nossa casuística não houve caso<br />

de otite externa maligna necrotizante.<br />

Otomastoidite crônica<br />

A otite <strong>média</strong> crônica pode ser de causa primária<br />

ou secundária, e a associação com defeito <strong>da</strong> pneumatização<br />

<strong>da</strong> mastoide é frequente. Essas condições podem<br />

coexistir, mas diferenciá-las é fun<strong>da</strong>mental quando se<br />

considera a proposta de tratamento cirúrgico [2,4] .<br />

A forma primária, mais conheci<strong>da</strong> como aticoantral,<br />

decorre de doença crônica que obstrui o istmo timpânico,<br />

limitando a doença ao epitímpano. As causas principais<br />

são a infecção crônica por microorganismos de<br />

baixa virulência, doença polipoide e anomalias congênitas<br />

[2,4] . Clinicamente, pode-se observar a membrana<br />

timpânica espessa<strong>da</strong> e avermelha<strong>da</strong>, com perfuração<br />

central e descarga de secreção purulenta, associa<strong>da</strong> a<br />

hipoacusia [5] . A forma secundária, ou tubotimpânica, está<br />

associa<strong>da</strong> a má-aeração <strong>da</strong> <strong>orelha</strong> <strong>média</strong> e <strong>da</strong>s células <strong>da</strong><br />

mastoide por doença <strong>da</strong> mucosa <strong>da</strong> nasofaringe, mal<br />

funcionamento <strong>da</strong> trompa auditiva ou doença <strong>da</strong> mucosa<br />

do mesotímpano – otite <strong>média</strong> crônica adesiva [2,5] .<br />

A TC deve ser o método de imagem adotado para<br />

avaliar estes pacientes. A mucosa que reveste a <strong>orelha</strong><br />

<strong>média</strong> normalmente não é visível ao exame tomográfico,<br />

portanto, qualquer espessamento observado é indicativo<br />

de doença – processo inflamatório [2] .<br />

148<br />

A otite <strong>média</strong> crônica frequentemente está acompanha<strong>da</strong><br />

de hipoaeração <strong>da</strong> mastoide. O que se observa<br />

na TC é a presença material com densi<strong>da</strong>de de partes<br />

moles de aspecto inespecífico ocupando a cavi<strong>da</strong>de timpânica<br />

e as células <strong>da</strong> mastoide, representando uma<br />

mistura de efusão com tecido de granulação, e a TC não<br />

é capaz de diferenciá-los [2,4,5] . A inflamação crônica <strong>da</strong><br />

mucosa causa vários graus de alteração óssea, observando-se<br />

desde lise à formação de osso reativo. Com a perpetuação<br />

do processo inflamatório, a osteogênese leva<br />

ao espessamento do trabeculado ósseo e redução progressiva<br />

do número e do volume <strong>da</strong>s células <strong>da</strong> mastoide,<br />

resultando no aspecto final de osso esclerótico com<br />

obliteração <strong>da</strong>s células previamente aera<strong>da</strong>s [5] . Na ausência<br />

de preenchimento do espaço aéreo por transu<strong>da</strong>to<br />

ou tecido de granulação, a análise cui<strong>da</strong>dosa pode<br />

mostrar espessamento <strong>da</strong>s estruturas ligamentares e do<br />

tendão do músculo tensor do tímpano [2] (Fig. 3 – A,B).<br />

Na otite <strong>média</strong> crônica adesiva, a membrana timpânica<br />

encontra-se espessa<strong>da</strong> e retraí<strong>da</strong>, reduzindo a amplitude<br />

<strong>da</strong> <strong>orelha</strong> <strong>média</strong> [5] . Este é um fator importante<br />

para diferenciar a otite <strong>média</strong> crônica do colesteatoma,<br />

uma vez que no colesteatoma a membrana timpânica<br />

encontra-se abaula<strong>da</strong> [2] .<br />

Pode haver vários graus de alteração <strong>da</strong> cadeia ossicular,<br />

como erosão do processo longo <strong>da</strong> bigorna e do<br />

cabo do martelo, anquilose <strong>da</strong> cabeça do martelo e aderência<br />

<strong>da</strong> membrana timpânica com o estribo nos casos<br />

mais severos, acarretando hipoacusia de condução [4,5,7] .<br />

A erosão <strong>da</strong> cabeça do martelo e corpo <strong>da</strong> bigorna<br />

(articulação martelo-bigorna) ocorre na presença de<br />

colesteatoma [4,5] .<br />

Timpanoesclerose<br />

É caracteriza<strong>da</strong> por depósito de material calcificado<br />

ou neoformação óssea na <strong>orelha</strong> <strong>média</strong>, sobretudo no<br />

epitímpano, ádito e membrana timpânica, revelados<br />

pela TC como placas ósseas mal defini<strong>da</strong>s. É um processo<br />

irreversível que acontece na fase tardia <strong>da</strong> otomastoidite<br />

crônica quando há esclerose <strong>da</strong>s células <strong>da</strong> mastóide<br />

[7] . Os ossículos podem estar circun<strong>da</strong>dos pelas<br />

placas ou envolvidos pelo processo de osteíte, causando<br />

per<strong>da</strong> do seu contorno e aderência às paredes do epitímpano<br />

[4,5,7] (Fig. 3C).<br />

Colesteatoma adquirido <strong>da</strong> <strong>orelha</strong> <strong>média</strong><br />

e <strong>da</strong> mastoide<br />

Histologicamente, o colesteatoma é um cisto epidermoide<br />

cujo conteúdo é formado de débris de epitélio<br />

descamado envolvido por processo inflamatório crônico<br />

em que há deposição de cristais de colesterol e forma-<br />

Rev Imagem 2008;30(4):143–151


ção de células gigantes. O cisto possui uma cama<strong>da</strong> interna<br />

de epitélio estratificado escamoso e outra externa<br />

de tecido conjuntivo [3–5] . A destruição óssea observa<strong>da</strong><br />

pode ser explica<strong>da</strong> pela presença de colagenase na periferia<br />

do cisto, já que o colágeno é a principal proteína<br />

do tecido ósseo [3] .<br />

Os colesteatomas adquiridos representam 98% dos<br />

casos e se localizam na <strong>orelha</strong> <strong>média</strong>, geralmente no<br />

epitímpano. Podem se estender à mastoide e, ocasionalmente,<br />

à ponta do rochedo [5] .<br />

Os colesteatomas adquiridos são caracterizados por<br />

perfuração <strong>da</strong> parte fláci<strong>da</strong> ou <strong>da</strong> parte tensa <strong>da</strong> membrana<br />

timpânica associa<strong>da</strong> a processo inflamatório crônico<br />

<strong>da</strong> <strong>orelha</strong> <strong>média</strong>, descarga purulenta e surdez de<br />

condução ou mista [5] . Todos os casos encontrados no<br />

grupo estu<strong>da</strong>do localizavam-se na <strong>orelha</strong> <strong>média</strong> ou mastoide.<br />

O otorrinolaringologista é capaz de fazer o diagnóstico<br />

na maioria dos casos, mas utiliza os métodos de<br />

imagem para estabelecer a dimensão <strong>da</strong> lesão, o estado<br />

dos ossículos, do labirinto, do teto do tímpano e do<br />

nervo facial [4,5,7] .<br />

Como diagnóstico diferencial do colesteatoma adquirido<br />

existe o granuloma de colesterol <strong>da</strong> <strong>orelha</strong><br />

<strong>média</strong>, que consiste numa massa de tecido inflamatório<br />

composta por cristais de colesterol circun<strong>da</strong>dos por<br />

células gigantes. É um processo inflamatório crônico<br />

não específico <strong>da</strong> <strong>orelha</strong> <strong>média</strong> e <strong>da</strong> mastoide, frequentemente<br />

associado a sangramento e às vezes com trauma<br />

[5] . Pode coexistir com a otite <strong>média</strong> crônica e o colestatoma,<br />

e a TC isola<strong>da</strong>mente pode não ser capaz de<br />

distingui-lo do tecido de granulação ou <strong>da</strong> simples efusão,<br />

sendo necessário o uso <strong>da</strong> RM [2,4,7] . Na presença de<br />

membrana timpânica azula<strong>da</strong> e retraí<strong>da</strong>, os achados na<br />

TC de otomastoidite crônica devem levar à suspeição de<br />

granuloma de colesterol [2,3] .<br />

O granuloma de colesterol apresenta hipersinal nas<br />

sequências pondera<strong>da</strong>s em T1 e T2. Em T1, o hipersinal<br />

é decorrente do seu conteúdo lipídico elevado e de<br />

material de degra<strong>da</strong>ção <strong>da</strong> hemoglobina, ao passo que<br />

o tecido de granulação e a efusão apresentam hipossinal.<br />

Após a administração intravenosa do gadolínio, o<br />

tecido de granulação realça, o que não é observado na<br />

efusão. Quando o granuloma de colesterol ocorre no<br />

ápice petroso, a TC pode sugerir o diagnóstico, mas o<br />

estudo por RM está indicado para confirmar esta hipótese<br />

[4,5] .<br />

Os colesteatomas congênitos são histologicamente<br />

idênticos aos adquiridos. Também são conhecidos como<br />

tumor epidermoide, originam-se de restos embriológicos<br />

e 20% ocorrem em localização extradural. Mais co-<br />

<strong>Doenças</strong> <strong>inflamatórias</strong> <strong>da</strong> <strong>orelha</strong> <strong>média</strong> / Boasquevisque GS et al.<br />

mumente crescem no ápice petroso, espaço epidural<br />

adjacente ou ain<strong>da</strong> na <strong>orelha</strong> <strong>média</strong> e mastoide. Os sintomas<br />

apresentados pelo paciente estão diretamente<br />

relacionados com o tamanho e o sítio do tumor [8] .<br />

A ausência de afecção otológica prévia e a membrana<br />

timpânica intacta são condições para o diagnóstico<br />

clínico de colesteatoma congênito [8] .<br />

Na TC, as lesões do ápice petroso aparecem como<br />

massas hipodensas bem defini<strong>da</strong>s e sem realce após a<br />

administração venosa do meio de contraste. Há elevação<br />

e afilamento <strong>da</strong> lâmina óssea superior e, com a progressão<br />

<strong>da</strong> doença, observa-se erosão do conduto auditivo<br />

interno e do labirinto. Estes achados podem ser<br />

idênticos ao do granuloma de colesterol e mucocele,<br />

porém, permitem excluir outros diagnósticos como<br />

neurinoma do facial, meningioma, tumor glômico, tumor<br />

cartilaginoso, cordoma e linfoma. Na RM, apresenta<br />

hipossinal em T1 e hipersinal em T2 e na difusão,<br />

o que aju<strong>da</strong> a diferenciá-los do granuloma de colesterol,<br />

que exibe hipersinal em T1, e <strong>da</strong> mucocele, que<br />

apresenta hipossinal na difusão.<br />

Na <strong>orelha</strong> <strong>média</strong>, o colesteatoma congênito tem<br />

aspecto semelhante aos demais, com a membrana timpânica<br />

intacta, podendo haver destruição <strong>da</strong> cadeia ossicular.<br />

Se houver associação com otite <strong>média</strong> serosa,<br />

to<strong>da</strong> a cavi<strong>da</strong>de timpânica poderá estar vela<strong>da</strong>. A margem<br />

anterior <strong>da</strong> parede lateral do epitímpano (esporão<br />

de Chaussée/parede lateral do ático/scutum) é poupa<strong>da</strong><br />

pelo colesteatoma congênito, ao contrário do colesteatoma<br />

adquirido, enquanto a parede medial frequentemente<br />

encontra-se destruí<strong>da</strong>.<br />

Aspectos gerais <strong>da</strong> imagem do colesteatoma adquirido<br />

O diagnóstico é baseado no achado de massa de tecidos<br />

moles na <strong>orelha</strong> <strong>média</strong> com destruição óssea. Pode<br />

ser encontra<strong>da</strong> destruição <strong>da</strong> parede lateral do epitímpano<br />

(parede lateral do ático, esporão de Chausseé,<br />

scutum), <strong>da</strong> cadeia ossicular, do teto do tímpano, do canal<br />

do nervo facial e parede dos canais semicirculares.<br />

Deve-se ter especial atenção com o seio timpânico e o<br />

recesso facial, no epitímpano posterior, pois são locais<br />

de difícil visualização durante a cirurgia e sítios frequentes<br />

de doença residual [4,5] . A erosão do processo longo <strong>da</strong><br />

bigorna e do cabo do martelo, juntamente com a retração<br />

<strong>da</strong> membrana timpânica, podem estar presentes na<br />

otite <strong>média</strong> crônica não colesteatomatosa [1,3,5,7] .<br />

A RM pode facilitar a diferenciação do colesteatoma<br />

com o tecido de granulação ao redor <strong>da</strong> lesão, bem como<br />

afastar a presença de doença residual ou recidiva<strong>da</strong><br />

através do uso <strong>da</strong>s imagens pesa<strong>da</strong>s em difusão de prótons<br />

(Fig. 5D).<br />

Rev Imagem 2008;30(4):143–151 149


Boasquevisque GS et al. / <strong>Doenças</strong> <strong>inflamatórias</strong> <strong>da</strong> <strong>orelha</strong> <strong>média</strong><br />

Colesteatoma <strong>da</strong> parte fláci<strong>da</strong><br />

A lesão pode ser pequena e de difícil definição caso<br />

o estudo por imagem não obedeça ao protocolo adequado<br />

para a investigação. Há retração <strong>da</strong> parte fláci<strong>da</strong><br />

<strong>da</strong> membrana timpânica com massa de partes moles no<br />

espaço de Prussak. O crescimento acompanha o trajeto<br />

de menor resistência, seguindo o sentido superior e<br />

posterior, abaixo do ligamento lateral do martelo. Pode<br />

haver extensão à fossa <strong>da</strong> bigorna, chegando ao ádito,<br />

antro e mastoide. A erosão do septo de Koerner (septo<br />

ósseo do tegmen timpani, que se estende inferiormente<br />

ao antro), é indicativo de massa no tegmen [2–5] . O colesteatoma<br />

adquirido <strong>da</strong> parte fláci<strong>da</strong> de pequeno tamanho<br />

raramente afeta o canal semicircular horizontal, pela<br />

interposição dos ossículos.<br />

Os achados clinicorradiológicos são (Fig. 4):<br />

• retração <strong>da</strong> membrana timpânica;<br />

• massa de partes moles no espaço de Prussak com erosão<br />

<strong>da</strong> porção anterior <strong>da</strong> parede lateral do ático (scutum/esporão<br />

de Chaussée);<br />

• erosão dos ossículos, sobretudo <strong>da</strong> cabeça do martelo<br />

e do corpo <strong>da</strong> bigorna, com deslocamento medial <strong>da</strong><br />

cadeia ossicular, e alargamento do antro [4,5] .<br />

Colesteatoma <strong>da</strong> parte tensa<br />

O diagnóstico radiológico dessa enti<strong>da</strong>de é mais<br />

difícil, pois a parede lateral do epitímpano está frequentemente<br />

intacta. Os achados de imagem dos colesteatomas<br />

<strong>da</strong> parte tensa são [3–5] :<br />

• massa de partes moles na <strong>orelha</strong> <strong>média</strong>, com extensão<br />

direta à parede medial do epitímpano e destruição<br />

dos ossículos, principalmente <strong>da</strong> bigorna;<br />

• deslocamento lateral <strong>da</strong> cadeia ossicular, geralmente<br />

preservando a cabeça do martelo e causando erosão<br />

do corpo e processo longo <strong>da</strong> bigorna;<br />

• o espaço de Prussak usualmente está poupado, nos<br />

casos iniciais.<br />

Complicações<br />

As complicações ocorrem quando o colesteatoma se<br />

estende além dos limites <strong>da</strong> <strong>orelha</strong> <strong>média</strong>, antro e mastóide<br />

[5] (Fig. 5). São elas:<br />

• erosão do tegmen timpani: está associa<strong>da</strong> com complicações<br />

meníngeas e encefálicas;<br />

• fístula labiríntica: é causa de vertigem e ocorre mais<br />

frequentemente com o canal semicircular horizontal<br />

(erosão <strong>da</strong> cápsula ótica) e menos comumente com a<br />

janela oval [3] . O comprometimento dos demais componentes<br />

do labirinto pode ocorrer se a lesão atingir<br />

grandes dimensões;<br />

150<br />

• extensão ao ápice petroso: é uma complicação incomum<br />

e o trajeto usual é o canal do nervo facial. Os<br />

pacientes apresentam paralisia facial periférica e o estudo<br />

por RM é o mais indicado [3,4] ;<br />

• erosão do canal do nervo facial: a erosão do canal<br />

ósseo do facial leva à compressão e edema do nervo<br />

pela reação ao processo inflamatório. O local mais<br />

comum de erosão é o segmento timpânico, acima <strong>da</strong><br />

janela oval. A erosão <strong>da</strong> porção anterior e no nível do<br />

gânglio geniculado ocorre na presença de grandes<br />

massas do epitímpano, e a destruição do segmento<br />

mastoideo pode estar presente quando a lesão envolver<br />

to<strong>da</strong> a mastoide. A RM pós-gadolínio poderá mostrar<br />

espessamento e realce do nervo. Os casos de deiscência<br />

do canal ósseo do facial não devem ser confundidos<br />

com erosão pelo colesteatoma e, geralmente,<br />

são encontra<strong>da</strong>s no segmento timpânico do facial [4] .<br />

Avaliação pós-cirúrgica<br />

O espessamento tecidual em cavi<strong>da</strong>des previamente<br />

manipula<strong>da</strong>s é de fácil visualização, porém, de difícil<br />

interpretação, pois pode representar regeneração cicatricial,<br />

tecido de granulação, enxerto (gordura ou músculo)<br />

ou ain<strong>da</strong> doença residual ou recidiva<strong>da</strong>.<br />

O surgimento de novas manifestações clínicas é indício<br />

de recorrência do colesteatoma. Os achados na TC<br />

que sugerem a presença de doença são massa com aumento<br />

progressivo de volume, destruição óssea ou deslocamento<br />

<strong>da</strong> cadeia ossicular. Para isso, é relevante o<br />

conhecimento <strong>da</strong>s condições anatômicas após o procedimento<br />

cirúrgico [4,9] . A RM tem sido de grande valor<br />

nos casos inconclusivos, sendo a sequência de difusão<br />

de prótons capaz de mostrar hipersinal quando há débris<br />

celulares do colesteatoma por determinar restrição<br />

<strong>da</strong> difusão <strong>da</strong>s moléculas de água livre.<br />

CONCLUSÃO<br />

Assim como em outros estudos, a investigação clínica<br />

adequa<strong>da</strong> contribuiu expressivamente para a interpretação<br />

dos exames de imagem [2,4] .<br />

As lesões unilaterais foram mais frequentes que as<br />

bilaterais e as complicações mais graves estavam relaciona<strong>da</strong>s<br />

com o tempo de evolução e o tamanho <strong>da</strong> lesão.<br />

A TC foi capaz de definir as lesões e as complicações <strong>da</strong><br />

maioria dos casos, e permanece o método de imagem<br />

de escolha na avaliação radiológica destes pacientes.<br />

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Rev Imagem 2008;30(4):143–151


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otomastoiditis: a conceptual understanding of CT findings.<br />

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3. Silver AJ, Janecka I, Wazen J, Hilal SK, Rutledge JN. Complicated<br />

cholesteatomas: CT findings in inner ear complications of middle<br />

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5. Valvassori GE, Mafee MF, Carter BL. Head and neck imaging.<br />

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mastoid. Part II: tubotympanic disease. Radiology 1983;148:455–<br />

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8. Warren FM, Bennett ML, Wiggins RH 3rd, et al. Congenital<br />

cholesteatoma of the mastoid temporal bone. Laryngoscope<br />

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9. Maheshwari S, Mukherji SK. Diffusion-weighted imaging for<br />

differentiating recurrent cholesteatoma from granulation tissue<br />

after mastoidectomy: case report. AJNR Am J Neuroradiol<br />

2002;23:847–9.<br />

<strong>Doenças</strong> <strong>inflamatórias</strong> <strong>da</strong> <strong>orelha</strong> <strong>média</strong> / Boasquevisque GS et al.<br />

Abstract. Inflammatory diseases of the middle ear.<br />

OBJECTIVE: To determine the aspects and frequency of middle ear<br />

alterations at computed tomography and magnetic resonance imaging<br />

in patients with clinical suspicion for middle ear inflammatory<br />

disease. MATERIAL AND METHOD: Imaging examination results<br />

of 95 patients (95 computed tomography and 1 magnetic resonance<br />

imaging) were compared with the results of otology, imaging and<br />

surgical findings. RESULTS: Fifty-two patients had normal imaging<br />

results. Forty-three patients had radiologic alterations compared<br />

to the physical, otology and hystopathologic exams: acute otomastoiditis<br />

in 2 patients (4.6%), unilateral chronic otomastoiditis in 9<br />

(21.0%), bilateral chronic otomastoiditis in 2 (4.6%), unilateral cholesteatoma<br />

in 26 (60.5%), and bilateral cholesteatoma in 4 (9.3%).<br />

CONCLUSION: Computed tomography was able to demonstrate the<br />

characteristics of the lesions and found complications in majority<br />

of the cases. Magnetic resonance imaging was used only in one<br />

patient to rule out scar and cholesteatoma. The knowledge of the<br />

clinical and otologic <strong>da</strong>ta enables the radiologist to elaborate a<br />

more appropriate interpretation of the imaging findings.<br />

Keywords: Cholesteatoma; Middle ear; Computed tomography; Magnetic<br />

resonance imaging.<br />

Rev Imagem 2008;30(4):143–151 151

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