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moralidade, civilização e decadência - Programa de Pós ...

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moral e, com ela, todos os âmbitos da cultura e da <strong>civilização</strong> algo remoto, sem significado<br />

e, assim, uma lembrança dolorosa e perplexa daquilo que não é mais possível para um<br />

homem que sucumbe <strong>de</strong>batendo-se <strong>de</strong>ntro e fora <strong>de</strong> si.<br />

De acordo com Nietzsche, o combate incessante dos instintos entre si ten<strong>de</strong> a causar<br />

primeiramente uma forte excitabilida<strong>de</strong>: os instintos outrora subjugados, ávidos por darem<br />

livre vazão à sua força, vêm à tona. Se, sob a imposição <strong>de</strong> uma moral (os escravos), ou em<br />

concordância instintiva com esta (os nobres), uma <strong>de</strong>terminada forma <strong>de</strong> comportamento é<br />

assegurada, com a caotização dos instintos e, por conseguinte, <strong>de</strong>clínio da moral, dá-se a<br />

perda <strong>de</strong> força <strong>de</strong> resistências contra os estímulos, ficando o comportamento, com isso –<br />

quer seja do nobre ou do escravo –, condicionado pelos acasos. Ora, essa casualida<strong>de</strong><br />

comportamental implica em um homem <strong>de</strong> comportamento amorfo: o déca<strong>de</strong>nt<br />

experimenta, sem or<strong>de</strong>m ou trégua, toda espécie <strong>de</strong> paixões, inclusive as que antes se<br />

encontravam tenazmente subjugadas. Não pensemos, porém, que essa amorfia no<br />

comportamento seria algo como uma recondução do homem ao estado não-domesticado<br />

(pré-<strong>moralida<strong>de</strong></strong> dos costumes). Sob a lógica da déca<strong>de</strong>nce, o homem não só per<strong>de</strong> a<br />

seletivida<strong>de</strong> nas suas experiências, como as vulgariza e exagera até o <strong>de</strong>scomunal (VP §44)<br />

– arruinando, com isso, o seu sistema nervoso, tornando-se um “doente dos nervos e da<br />

cabeça”. Daí a irritabilida<strong>de</strong> extrema, a <strong>de</strong>bilida<strong>de</strong> da personalida<strong>de</strong> e a oscilação do humor<br />

passarem a fazer parte do caráter do déca<strong>de</strong>nt (VP §43), enquanto, em contrapartida,<br />

características como a temperança, a dureza para consigo, a razoabilida<strong>de</strong> frente às<br />

paixões, enfim todas as qualida<strong>de</strong>s relacionadas a uma hierarquia coesa, saem<br />

<strong>de</strong>finitivamente <strong>de</strong> cena.<br />

Se, no homem saudável 65 , os instintos se dispõem <strong>de</strong> acordo com a morfologia da<br />

vonta<strong>de</strong> <strong>de</strong> potência – os mais fortes se assenhoram dos mais fracos para garantir e<br />

potencializar a vida –, no homem déca<strong>de</strong>nt, eles se dispõem <strong>de</strong> acordo com a lógica da<br />

déca<strong>de</strong>nce, o que significa que buscam aquilo que é prejudicial, que <strong>de</strong>genera e aniquila a<br />

vida: “Digo que um animal, uma espécie, um indivíduo está corrompido quando per<strong>de</strong> seus<br />

instintos, quando escolhe, prefere o que lhe é <strong>de</strong>svantajoso” (AC §6). Para Nietzsche,<br />

“[t]udo o que é feito na fraqueza malogra”, e, <strong>de</strong>sse modo, uma vez iniciada a déca<strong>de</strong>nce, o<br />

mais apropriado seria simplesmente não agir, “não fazer nada”. Todavia, tal como vimos<br />

no parágrafo anterior, a força <strong>de</strong> não resistir, <strong>de</strong> não reagir, encontra-se extremamente<br />

65 Como po<strong>de</strong>mos perceber, ao tratar do problema da déca<strong>de</strong>nce, os pólos nobre e escravo são substituídos<br />

pelos pólos saudável e doente – justamente <strong>de</strong>vido à intra-relação entre déca<strong>de</strong>nce e fisiologia. No<br />

capítulo seguinte, trataremos <strong>de</strong> situar os pólos nobre e escravo e, por conseguinte, a moral dos senhores e<br />

a dos escravos, na discussão acerca da déca<strong>de</strong>nce.<br />

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