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moralidade, civilização e decadência - Programa de Pós ...

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Quando se chega, porém no estrangeiro, o valor do “outro” não é reconhecido como<br />

um valor; os membros dos diferentes clãs, ao não se reconhecerem como iguais – “o<br />

orgulho do clã pela distância, o sentir-se <strong>de</strong>sigual, a aversão contra a mediação” (VP §773)<br />

–, põem-se livres <strong>de</strong> todas as regras <strong>de</strong> conduta impostas no interior da sua comunida<strong>de</strong>,<br />

po<strong>de</strong>ndo exercer assim a sua se<strong>de</strong> <strong>de</strong>senfreada por domínio, que, e aqui temos um dado<br />

novo, não é aniquilada com a obtenção da civilida<strong>de</strong>:<br />

“os mesmos homens tão severamente contidos pelo costume, o respeito,<br />

os usos, a gratidão, mas ainda pela vigilância mútua, pelo ciúme inter<br />

pares, que por outro lado se mostram tão pródigos em consi<strong>de</strong>ração,<br />

autocontrole, <strong>de</strong>lica<strong>de</strong>za, orgulho, amiza<strong>de</strong>, nas relações entre si – para<br />

fora, ali on<strong>de</strong> começa o que é estranho, o estrangeiro, eles não são<br />

melhores que animais <strong>de</strong> rapina <strong>de</strong>ixados a solta. Ali <strong>de</strong>sfrutam a<br />

liberda<strong>de</strong> <strong>de</strong> toda coerção social, na selva se recobram da tensão trazida<br />

por um longo cerceamento e confinamento na paz da comunida<strong>de</strong>,<br />

retornam à inocente consciência <strong>de</strong> animais <strong>de</strong> rapina, como jubilosos<br />

monstros que <strong>de</strong>ixam atrás <strong>de</strong> si, com ânimo elevado e equilíbrio interior,<br />

uma sucessão horrenda <strong>de</strong> assassínios, incêndios, violações e torturas,<br />

como se tudo não passasse <strong>de</strong> brinca<strong>de</strong>ira <strong>de</strong> estudantes” (GM I §11).<br />

O comportamento agressivo, acima <strong>de</strong>scrito, não é comum a todos os clãs. Retomando<br />

o que foi dito, há povos mais fortes e outros mais fracos, bem como povos que conseguem<br />

potencializar o crescimento e outros que entram em <strong>de</strong>bilida<strong>de</strong> precoce 59 . Como, para<br />

Nietzsche, a força está necessariamente ligada ao pathos agressivo (EC I §7) – lembremos<br />

do caráter da vonta<strong>de</strong> <strong>de</strong> potência, “necessita <strong>de</strong> resistências e, portanto busca resistências”<br />

–, dá-se que foram as raças agressivas, as raças violentas, mais propriamente os<br />

“bárbaros”, os responsáveis pela auto elevação do homem e, <strong>de</strong>sse modo, pela criação da<br />

cultura, no seu sentido mais estrito: “Foram as raças nobres que <strong>de</strong>ixaram na sua esteira a<br />

noção <strong>de</strong> 'bárbaro'” (GM I §11). De acordo com o pensamento nietzschiano, portanto, uma<br />

raça dominadora só po<strong>de</strong> <strong>de</strong>senvolver-se a partir <strong>de</strong> começos terríveis e violentos (VP<br />

§868). Tamanhas terribilida<strong>de</strong> e violência revelam-se na exploração impiedosa <strong>de</strong> outros<br />

povos, na utilização insaciável da potência <strong>de</strong> outros povos a partir do seu próprio valor,<br />

para a elevação do seu próprio valor 60 . Daí a Nietzsche conceber que “[t]oda elevação do<br />

tipo 'homem' foi, até o momento, obra <strong>de</strong> uma socieda<strong>de</strong> aristocrática – e assim será<br />

sempre: <strong>de</strong> uma socieda<strong>de</strong> que acredita numa longa escala <strong>de</strong> hierarquias e diferenças <strong>de</strong><br />

59 “Essa humanida<strong>de</strong> não é nenhum conjunto global: é uma multiplicida<strong>de</strong> insolúvel <strong>de</strong> processos vitais<br />

ascen<strong>de</strong>ntes e <strong>de</strong>crescentes – ela não tem uma juventu<strong>de</strong>, em seguida uma maturida<strong>de</strong> e por fim uma<br />

velhice. Os estratos estão misturados e sobrepostos – em alguns milênios po<strong>de</strong> haver tipos mais jovens <strong>de</strong><br />

homem do que os que nós po<strong>de</strong>mos apontar hoje” (VP §339).<br />

60 Remetamo-nos à questão da interpretação mencionada no item anterior.<br />

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