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moralidade, civilização e decadência - Programa de Pós ...

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Numa perambulação pelas muitas morais, as mais finas e as mais<br />

grosseiras, que até agora dominaram e continuam dominando a Terra,<br />

encontrei certos traços que regularmente retornaram juntos e ligados entre<br />

si: até que finalmente se revelaram dois tipos básicos, e uma diferença<br />

fundamental sobressaiu. Há uma moral dos senhores e uma moral dos<br />

escravos (BM §260).<br />

2. Nobreza e auto-elevação: a moral dos senhores<br />

Como vimos anteriormente na página 13 da presente dissertação, as socieda<strong>de</strong>s<br />

arcaicas, possibilitadas pela <strong>moralida<strong>de</strong></strong> dos costumes, eram conformadas por dois pólos: o<br />

dos legisladores e o dos executores das leis. Os primeiros (sempre em menor número)<br />

ocupavam uma perspectiva privilegiada ao mesmo tempo que perigosa: cabia a eles o<br />

papel <strong>de</strong> criar costumes 52 , isto é, <strong>de</strong> formar os homens e a socieda<strong>de</strong>. Tal formação, por sua<br />

vez, estava circunscrita, como era inevitável, a limites bastante restritos. Numa época em<br />

que nem o domínio sobre a natureza, nem o domínio sobre os próprios instintos estavam<br />

conquistados, a moral configurava-se exclusivamente como o “princípio <strong>de</strong> conservação <strong>de</strong><br />

gran<strong>de</strong>s totalida<strong>de</strong>s”, ou seja, como o elemento <strong>de</strong> restrição dos membros pertencentes a<br />

uma “totalida<strong>de</strong>” (para a possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong>sta). Frente a isso, po<strong>de</strong>mos afirmar que a<br />

<strong>moralida<strong>de</strong></strong>, nesse seu primeiro estágio, era apenas um instrumento (o único existente) para<br />

o domínio da natureza interna e externa ao homem (VP §266).<br />

Retomando o que foi dito, na época da <strong>moralida<strong>de</strong></strong> dos costumes, <strong>de</strong>vido ao homem<br />

encontrar-se bastante próximo da sua natureza disforme e múltipla, a estabilida<strong>de</strong> da<br />

comunida<strong>de</strong> era ainda muito tênue, e, <strong>de</strong>sse modo, nenhuma inclinação pessoal, nenhuma<br />

autenticida<strong>de</strong> (amorfa) podia ser permitida. Essa tênue estabilida<strong>de</strong> era assegurada por<br />

todos os membros da comunida<strong>de</strong>, e não apenas pelo legislador, através da vigilância<br />

mútua. De acordo com o filósofo, os membros da comunida<strong>de</strong> arcaica, fossem legisladores<br />

ou executores da lei, ao <strong>de</strong>sfrutarem das vantagens <strong>de</strong> uma vida em comunida<strong>de</strong> – que<br />

englobavam “o viver protegido, cuidado, em paz e confiança, sem preocupações com<br />

certos abusos e hostilida<strong>de</strong>s a que está exposto o homem <strong>de</strong> fora” –, empenhavam-se e<br />

comprometiam-se com ela 53 . Desse modo, aquele que quebrava a palavra e o contrato com<br />

52 Apesar <strong>de</strong> soar estranha a concepção <strong>de</strong> que a alguém caiba “criar costumes”, tal criação parece ser o que,<br />

para Nietzsche, melhor <strong>de</strong>fine o papel do legislador dos tempos arcaicos: “Originalmente, portanto, tudo<br />

era costume, e quem quisesse ergue-se acima <strong>de</strong>le tinha <strong>de</strong> se tornar legislador e curan<strong>de</strong>iro, e uma<br />

espécie <strong>de</strong> semi<strong>de</strong>us: isto é, tinha <strong>de</strong> criar costumes – algo terrivelmente perigoso!” (A §9).<br />

53 Frente o que está sendo dito, po<strong>de</strong>mos concluir que o homem se forma enquanto tal através da<br />

gregarieda<strong>de</strong>, sendo, portanto, um animal gregário: “Na medida em que sempre, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> que existem<br />

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