moralidade, civilização e decadência - Programa de Pós ...
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conduziram Nietzsche à sua avaliação da moral dominante e, concomitante, rejeição. Tais<br />
critérios, como veremos, serão aplicados não só para a avaliação da moral dominante, mas<br />
para a avaliação <strong>de</strong> toda e qualquer moral.<br />
Apesar da rejeição instintiva da moral dominante, Nietzsche não preten<strong>de</strong> remontar a<br />
sua origem a partir <strong>de</strong> puras e simples idiossincrasias. Longe disso, e, segundo ele, até<br />
mesmo em oposição ao trabalho dos <strong>de</strong>mais genealogistas da moral – cujas hipóteses “se<br />
per<strong>de</strong>m no azul” –, o filósofo busca <strong>de</strong>senvolver um olhar agudo, imparcial, científico para<br />
essa origem: ele visa <strong>de</strong>senvolver “a efetiva história da moral”. Posto o seu intento, a<br />
filologia, história, psicologia e, em especial no último ano, a fisiologia são as ciências<br />
reivindicadas como fundamentais para a reconstrução da origem dos valores morais – cujo<br />
momento inicial, <strong>moralida<strong>de</strong></strong> dos costumes, foi tratado no primeiro item do capítulo<br />
anterior: “Pois é óbvio que uma outra cor <strong>de</strong>ve ser mais importante para um genealogista<br />
da moral: o cinza, isto é, o efetivamente constatável, o realmente havido, numa palavra a<br />
longa e quase in<strong>de</strong>cifrável escrita hieroglífica do passado moral humano” (GM, “Prólogo”<br />
§7).<br />
De acordo com Oswaldo Giacoia Jr., Nietzsche, ao se posicionar <strong>de</strong> maneira<br />
“efetivamente científica” ante a origem da moral, recusa a estratégia empregada pelos<br />
<strong>de</strong>mais genealogistas que, como vimos, consiste na “justificação da moral” (dominante):<br />
“Percebe-se, assim, que o primeiro passo em direção a uma postura efetivamente científica<br />
diante da moral [...] consiste em recusar a estratégia da justificação, pois esta se enraíza em<br />
uma crença irrefletida, que é também a expressão erudita da mesma <strong>moralida<strong>de</strong></strong> dominante<br />
e, com isso, a confissão velada <strong>de</strong> uma interdição” (GIACOIA, 2008, p. 192). Ora, ainda<br />
que admitamos que essa justificação se enraize numa crença irrefletida, ousamos discordar<br />
que a negação <strong>de</strong>ssa estratégia se <strong>de</strong>va a uma postura “efetivamente científica”.<br />
De acordo com S. Kemal, não há na genealogia nietzschiana separação entre método e<br />
finalida<strong>de</strong>: se “o 'objetivo' do diagnóstico é i<strong>de</strong>ntificar a or<strong>de</strong>m e a relação entre valor e<br />
po<strong>de</strong>r, então, paradoxalmente, o 'método' <strong>de</strong>ste [diagnóstico] também consiste em<br />
i<strong>de</strong>ntificar a or<strong>de</strong>m e relação entre valor e po<strong>de</strong>r” (KEMAL, 1990, p. 33). Traduzindo essa<br />
concepção, a partir das nossas palavras, isso significa que a genealogia da moral<br />
<strong>de</strong>senvolvida por Nietzsche pressupõe na sua orientação metodológica a hipótese que<br />
<strong>de</strong>veria tratar <strong>de</strong> provar, qual seja: a relação entre valor e po<strong>de</strong>r, ou em outras palavras, a<br />
pertinência da noção <strong>de</strong> vonta<strong>de</strong> <strong>de</strong> potência. Daí a Kemal afirmar, num sentido bastante<br />
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