moralidade, civilização e decadência - Programa de Pós ...
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isso:<br />
“Supondo, porém, que alguém tome os afetos <strong>de</strong> ódio, inveja, cupi<strong>de</strong>z,<br />
ânsia <strong>de</strong> domínio, como afetos que condicionam a vida, como algo que<br />
tem <strong>de</strong> estar presente, por princípio e <strong>de</strong> modo essencial, na economia<br />
global da vida, e em conseqüência <strong>de</strong>ve ser realçado, se a vida é para ser<br />
realçada – esse alguém sofrerá com tal orientação do seu julgamento<br />
como quem sofre <strong>de</strong> enjôo ao mar. No entanto, mesmo essa hipótese está<br />
longe <strong>de</strong> ser a mais dolorosa e mais estranha nesse <strong>de</strong>smesurado, quase<br />
inexplorado reino dos conhecimentos perigosos; e existe, <strong>de</strong> fato, uma<br />
centena <strong>de</strong> boas razões para que <strong>de</strong>le mantenha distância todo aquele que<br />
– pu<strong>de</strong>r!” (BM §23).<br />
In<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntemente, das concepções nietzschianas acerca da moral e da sua relação<br />
com o homem e as civilizações serem ou não pertinentes, Nietzsche, inegavelmente,<br />
contrapôs-se a aspectos muito caros à moral oci<strong>de</strong>ntal. E dada a ostensivida<strong>de</strong> da sua<br />
contraposição, ela, muitas vezes, ten<strong>de</strong> a provocar certo <strong>de</strong>sconforto e mesmo receio com<br />
relação às suas possíveis implicações. Para confirmar essa nossa posição, julgamos<br />
suficiente a reprodução do segundo aforismo <strong>de</strong> O Anticristo:<br />
O que é bom? – Tudo o que eleva o sentimento <strong>de</strong> po<strong>de</strong>r, a vonta<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />
po<strong>de</strong>r, o próprio po<strong>de</strong>r no homem.<br />
O que é mau? – Tudo o que vem da fraqueza.<br />
O que é felicida<strong>de</strong>? – O sentimento <strong>de</strong> que o po<strong>de</strong>r cresce, <strong>de</strong> que a<br />
resistência é superada.<br />
Não a satisfação, mas mais po<strong>de</strong>r; sobretudo não a paz, mas a guerra; não<br />
a virtu<strong>de</strong>; mas a capacida<strong>de</strong> (virtu<strong>de</strong> à maneira da Renascença, virtú,<br />
virtu<strong>de</strong> isenta <strong>de</strong> moralina).<br />
Os fracos e malogrados <strong>de</strong>vem perecer: primeiro princípio do nosso amor<br />
aos homens. E <strong>de</strong>ve-se ajudá-los nisso.<br />
O que é mais nocivo que qualquer vício? – A ativa compaixão por todos<br />
os malogrados e fracos – o cristianismo...<br />
Uma vez que expusemos – como nos é dado comprovar –, textualmente, a<br />
contraposição nietzschiana à moral dominante, já não é necessário tentar afirmar o alto<br />
grau da ostensivida<strong>de</strong> da sua contraposição e nem a sua “periculosida<strong>de</strong>”. Ao contrário,<br />
parece-nos necessário tentar amenizar o provável assombro que tais consi<strong>de</strong>rações tenham<br />
vindo a causar. Dito isso, sugerimos uma postura preventiva com relação a possíveis<br />
rejeições ou rotulações prematuras. Em palavras diretas: resguar<strong>de</strong>mo-nos, ao menos por<br />
ora, <strong>de</strong> tecer validações ou invalidações à filosofia nietzschiana – até mesmo porque não é<br />
este, o nosso propósito.<br />
A partir <strong>de</strong> agora, concentrar-nos-emos em compreen<strong>de</strong>r os critérios gerais que<br />
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