moralidade, civilização e decadência - Programa de Pós ...
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<strong>de</strong>terminados e específicos. Frente a isso, po<strong>de</strong>mos perceber que um tipo <strong>de</strong> homem só se<br />
estabelece quando o homem atinge aquele automatismo equivalente ao dos outros animais;<br />
quando a <strong>moralida<strong>de</strong></strong> se torna “instinto”; quando os instintos se fixam e propagam-se<br />
através <strong>de</strong> gerações, conformando uma <strong>de</strong>terminada estirpe, uma <strong>de</strong>terminada linhagem <strong>de</strong><br />
homens. A <strong>moralida<strong>de</strong></strong> é, pois, fundamental para a criação <strong>de</strong> um tipo. A sua justificação<br />
estética, resi<strong>de</strong>, para Nietzsche, nessa sua potencialida<strong>de</strong> em conformar diferentes<br />
exemplares humanos: “a justificação estética (a conformação <strong>de</strong> tipos sólidos juntamente<br />
com a satisfação do próprio tipo)” (VP §719).<br />
A formação <strong>de</strong> um tipo em nada se relaciona, portanto, ao indivíduo singular: o “reino<br />
do 'indivíduo' só po<strong>de</strong> ser curto. O <strong>de</strong>sperdício é muito gran<strong>de</strong>; falta a possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />
reunir, <strong>de</strong> capitalizar, e o esgotamento acossa nos calcanhares” (VP §93). Somente através<br />
<strong>de</strong> um processo <strong>de</strong> continuida<strong>de</strong> entre gerações – processo este, que, como vimos, é<br />
possibilitado e garantido pela moral: “[a moral é] essencialmente o meio <strong>de</strong> fazer com que<br />
algo dure para além dos indivíduos” (VP §730) – faz-se possível a criação <strong>de</strong> um<br />
<strong>de</strong>terminado tipo <strong>de</strong> homem. Ora, observemos que no item 1 essa mesma consi<strong>de</strong>ração foi<br />
feita, residindo a única diferença no fato <strong>de</strong> que agora acrescentamos o termo tipo. Esse<br />
acréscimo é <strong>de</strong> suma importância, pois, através <strong>de</strong>le, po<strong>de</strong>mos concluir que o antece<strong>de</strong>nte<br />
do homem ao moldar-se em homem (animal avaliador), moldou-se não em um homem<br />
<strong>de</strong>tentor <strong>de</strong> valores e características referentes a todos os outros homens, isto é, em um<br />
homem <strong>de</strong>tentor <strong>de</strong> valores e características gerais, mas em um <strong>de</strong>terminado tipo <strong>de</strong><br />
homem, ou seja, em um homem com características e valores específicos, diferentes das<br />
características e valores dos <strong>de</strong>mais tipos <strong>de</strong> homens 32 .<br />
De acordo com a interpretação por nós, até agora, <strong>de</strong>senvolvida, parece-nos claro que,<br />
para Nietzsche, a hierarquização dos instintos <strong>de</strong> um homem que se faz possível no interior<br />
<strong>de</strong> um <strong>de</strong>terminado grupo <strong>de</strong> homens que conseguiu marcar com as suas obras e criações<br />
(<strong>de</strong> início, sobretudo associadas às leis e ao cumprimento das leis) as gerações a ele<br />
posteriores 33 . Disso, po<strong>de</strong>mos afirmar, sem maiores receios, que homens pertencentes a<br />
32 Naturalmente, estamos cientes <strong>de</strong> que Nietzsche, ainda que não exclusivamente, utiliza o termo “tipo” em<br />
um sentido mais específico do que o utilizado no presente item, relacionando-o principalmente aos pólos,<br />
por ele criados, nobre e escravo – que serão explicitados mais adiante, quando tratarmos da tipologia<br />
nietzschiana propriamente dita. De qualquer sorte, como não po<strong>de</strong>ria ser diferente, julgamos estar <strong>de</strong><br />
acordo com a filosofia nietzschiana o modo que aqui utilizamos esse termo, que é o <strong>de</strong> relacioná-lo à<br />
noção <strong>de</strong> povo, <strong>de</strong> raça. E isso por dois motivos: primeiro, porque como <strong>de</strong>senvolveremos adiante, há<br />
toda uma crítica <strong>de</strong> Nietzsche à noção <strong>de</strong> humanida<strong>de</strong>, o que significa que, para ele, não po<strong>de</strong>mos falar do<br />
homem num sentido universal, mas somente em tipos <strong>de</strong> homens, segundo, porque o próprio filósofo,<br />
utiliza o termo nessa acepção mais plural, ainda que esta não se configure como o ponto mais trabalhado<br />
da sua tipologia – e daí o presente item ser apenas um prelúdio.<br />
33 Percebamos que o homem como indivíduo não é aqui consi<strong>de</strong>rado. Isso se <strong>de</strong>ve ao fato, como bem<br />
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