moralidade, civilização e decadência - Programa de Pós ...
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CONCLUSÃO<br />
Se os nossos argumentos foram pertinentes, po<strong>de</strong>mos afirmar (sem dificulda<strong>de</strong>) que,<br />
apesar <strong>de</strong> a moral ascética negar valorativamente a vida, ela é tão natural quanto qualquer<br />
outra moral. O que a diferencia fundamentalmente é que ela não se molda <strong>de</strong> acordo com<br />
os parâmetros da formação ou da auto-elevação <strong>de</strong> uma <strong>de</strong>terminada linhagem <strong>de</strong> homens<br />
– que é o que ocorre com as outras morais –, mas sim a partir da <strong>de</strong>generescência<br />
intrínseca a um <strong>de</strong>terminado tipo. A moral ascética é a expressão <strong>de</strong> uma força<br />
<strong>de</strong>scomunal: da força <strong>de</strong> um tipo capaz <strong>de</strong> transmutar a sua “vonta<strong>de</strong> <strong>de</strong> nada” –<br />
auto<strong>de</strong>struição advinda da caotização instintiva – em vonta<strong>de</strong> <strong>de</strong> potência. E, <strong>de</strong>sse modo,<br />
dominar – seja através do processo natural <strong>de</strong> perecimento, seja através da contaminação –<br />
a maioria das conformações humanas.<br />
Comparando a moral ascética com a <strong>moralida<strong>de</strong></strong> na sua primeira fase (a <strong>moralida<strong>de</strong></strong><br />
dos costumes), po<strong>de</strong>mos observar que se esta surgiu como instância capaz <strong>de</strong><br />
assegurar/hierarquizar os instintos caotizados, o mesmo se <strong>de</strong>u com aquela. Todavia,<br />
enquanto a caotização que prece<strong>de</strong>u a <strong>moralida<strong>de</strong></strong> dos costumes não implicava em<br />
<strong>de</strong>generescência – sendo capaz, portanto, <strong>de</strong> gerar uma moral saudável –, a que prece<strong>de</strong>u a<br />
moral ascética sim. A que se <strong>de</strong>ve a essa diferença?<br />
Acreditamos que há duas respostas para essa pergunta. A primeira, e mais simples<br />
<strong>de</strong>las, está relacionada à idéia <strong>de</strong> que a caotização referente ao antece<strong>de</strong>nte do homem não<br />
foi originada <strong>de</strong> uma impossibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> exteriorização dos instintos. O homem<br />
“selvagem” dava livre vazão aos seus instintos contraditórios. A sua caotização instintiva<br />
fazia da sua existência um intenso e múltiplo <strong>de</strong>vir, do qual ele, em algum momento,<br />
inevitavelmente se tornava presa – nada, além disso. Desprovido <strong>de</strong> uma interiorida<strong>de</strong>, o<br />
antece<strong>de</strong>nte do homem não era um sofredor <strong>de</strong> si: não tinha os seus instintos em um<br />
ininterrupto e silencioso combate. E é precisamente esse “silêncio”, essa não exteriorização<br />
o que envenena, o que conduz à má-consciência, o que torna o homem vítima <strong>de</strong> si mesmo,<br />
um <strong>de</strong>generado.<br />
A outra resposta vai um pouco mais fundo. Para que a <strong>de</strong>senvolvamos, temos <strong>de</strong> nos<br />
remeter primeiramente à relação entre homem e valor, à relação que, em nossa<br />
interpretação da filosofia nietzschiana, é a que mais propriamente diz sobre o bicho<br />
homem. O homem é, como diz Nietzsche, o animal in<strong>de</strong>terminado, mas o animal<br />
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