moralidade, civilização e decadência - Programa de Pós ...
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está arruinada porque não compreen<strong>de</strong>u o esgotamento como<br />
esgotamento: as confusões fisiológicas são causa <strong>de</strong> todo mal...<br />
A virtu<strong>de</strong> é nosso gran<strong>de</strong> mal-entendido.<br />
Problema: como os esgotados conseguiram fazer a lei dos valores?<br />
Perguntado <strong>de</strong> outra maneira: como chegaram ao po<strong>de</strong>r aqueles que são<br />
os últimos?... Como acontece do instinto do animal-homem ser posto <strong>de</strong><br />
cabeça para baixo?... (VP §54)<br />
3. A inversão da hierarquia ou o domínio do i<strong>de</strong>al ascético<br />
Para que compreendamos como os valores ascéticos conseguiram imperar, <strong>de</strong>stronar a<br />
moral como auto-elevação, a moral dos senhores, <strong>de</strong>vemos ter em mente que o asceta,<br />
sendo um novo tipo <strong>de</strong> animal <strong>de</strong> rapina, possui uma forte ânsia por domínio. Essa ânsia,<br />
surgindo não da plenitu<strong>de</strong> da vida, mas da sua <strong>de</strong>generescência é, igualmente <strong>de</strong>generada:<br />
ela <strong>de</strong>seja não assenhorar-se <strong>de</strong> algo da vida, mas sim da vida mesma, “<strong>de</strong> suas condições<br />
maiores, mais profundas e fundamentais” (GM III §11). Ora, esse assenhorar-se das<br />
condições fundamentais da vida significa que o asceta, com a sua vonta<strong>de</strong> <strong>de</strong> potência<br />
<strong>de</strong>generada, nega essas condições, isto é, nega tudo aquilo que expressa o caráter da<br />
vonta<strong>de</strong> <strong>de</strong> potência – em verda<strong>de</strong>, essa é a dinâmica da sua vonta<strong>de</strong> <strong>de</strong> potência<br />
<strong>de</strong>generada (vonta<strong>de</strong> <strong>de</strong> nada). Dito isso, não é difícil adivinhar que o asceta se põe não só<br />
contra a moral dos senhores, mas contra os próprios senhores – que, como vimos, são a<br />
expressão máxima da vonta<strong>de</strong> <strong>de</strong> potência.<br />
Contudo, não é por causa <strong>de</strong> uma mera lógica, tal como a explicitada acima, que o<br />
asceta se contrapõe aos nobres. De acordo com o filósofo, há um ódio, um ressentimento<br />
do tipo ascético, contra o nobre. Ódio esse que, na compreensão nietzschiana, é traduzido<br />
como o ódio dos medíocres contra os tipos <strong>de</strong> exceção, o ódio dos fisiologicamente<br />
<strong>de</strong>generados e psicologicamente atormentados contra os privilegiados <strong>de</strong> alma e corpo,<br />
enfim o ódio das almas fracassadas contra as almas belas, orgulhosas e confiantes (VP<br />
§283). Para Nietzsche, o sacerdote é o revoltado entre os mal-sucedidos (VP §209).<br />
Como não é difícil perceber, estamos agora diante <strong>de</strong> uma perspectiva bastante<br />
diferente da do item anterior. Lá, expusemos a criação da moral ascética ignorando as<br />
relações nas quais se inseria o sacerdote ascético, consi<strong>de</strong>ramos apenas a sua psique e,<br />
tratamos <strong>de</strong> enten<strong>de</strong>r a origem da moral, a partir da interpretação que ele lhe ofereceu. A<br />
questão, o dado novo que trazemos aqui para complementarmos o que lá foi dito, é que<br />
toda essa interpretação parece ter também surgido a partir <strong>de</strong> um pathos: o ressentimento