11.04.2013 Views

moralidade, civilização e decadência - Programa de Pós ...

moralidade, civilização e decadência - Programa de Pós ...

moralidade, civilização e decadência - Programa de Pós ...

SHOW MORE
SHOW LESS

You also want an ePaper? Increase the reach of your titles

YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.

homens e estamentos que foram subjugados e oprimidos por homens” (VP §55). Como<br />

vimos no item 3 do capítulo anterior, é o sofrimento sem interpretação o que se apresenta,<br />

ao bicho homem <strong>de</strong>generado, como um fardo <strong>de</strong>masiado pesado <strong>de</strong> suportar, fardo esse<br />

que o conduziria necessariamente à morte, caso não fosse a intervenção da interpretação<br />

ascética. O asceta, ao negar a vida e, através <strong>de</strong>ssa negação vir a afirmar um outro mundo,<br />

uma outra realida<strong>de</strong> aprazível ao sofredor, representa o “<strong>de</strong>sejo <strong>de</strong> ser outro, <strong>de</strong> ser-estar<br />

em outro lugar”, sendo precisamente o po<strong>de</strong>r do seu <strong>de</strong>sejo, o grilhão que o pren<strong>de</strong> à<br />

existência, que se torna o instrumento para que ele trabalhe na criação <strong>de</strong> condições mais<br />

propícias para o ser-aqui e o ser-homem. Desse modo, po<strong>de</strong>mos concluir que, embora a<br />

interpretação ascética traga mais sofrimento, ela garante aos “malogrados, <strong>de</strong>sgraçados,<br />

frustrados, <strong>de</strong>formados, sofredores”, o apego à vida (GM III §13).<br />

O tipo ascético, para Nietzsche, é um tipo extremamente paradoxal, pois ele é uma<br />

“<strong>de</strong>sarmonia que se quer <strong>de</strong>sarmônica, que frui a si mesma neste sofrimento, e torna-se<br />

mais triunfante e confiante à medida que diminui o seu pressuposto, a vitalida<strong>de</strong><br />

fisiológica” (GM III §11). Ora, mas esse tipo no qual se manifesta tamanha contradição é,<br />

tal como vimos, justamente aquele que garante a existência da maioria dos homens. Sendo<br />

assim “a vida contra vida” que se revela na sua psicologia, no seu i<strong>de</strong>al, só po<strong>de</strong> ser<br />

aparente se consi<strong>de</strong>rada do ponto <strong>de</strong> vista fisiológico. O asceta, essa espécie hostil à vida, é<br />

um interesse da vida mesma, pois caso não o fosse, ele que sequer propaga o seu modo <strong>de</strong><br />

valoração através da herança – tendo em vista que sua hostilida<strong>de</strong> para com a vida, o<br />

proíbe a procriação –, já teria sucumbido no curso do <strong>de</strong>vir (i<strong>de</strong>m). Assim, tal como nos<br />

indica Carlos A. R. <strong>de</strong> Moura, “esse aparente inimigo da vida é, na verda<strong>de</strong>, uma potência<br />

conservadora e afirmativa da vida” (MOURA, 2005, p.153) Para o filósofo, o i<strong>de</strong>al<br />

ascético é exatamente o contrário do que acreditam os seus adoradores, pois é a vida que<br />

“luta nele e através <strong>de</strong>le com a morte, contra a morte, o i<strong>de</strong>al ascético é um artifício para a<br />

preservação da vida”, ele está precisamente “entre as gran<strong>de</strong>s potências conservadoras e<br />

afirmadoras da vida”. De fato, esse tipo surge do seio da déca<strong>de</strong>nce, sendo o déca<strong>de</strong>nt por<br />

excelência, mas surge “do instinto <strong>de</strong> cura e proteção <strong>de</strong> uma vida que <strong>de</strong>genera, a qual<br />

busca manter-se por todos os meios, e luta por sua existência” (GM III §13). A dominação<br />

sobre os que sofrem é, pois então o reino do sacerdote ascético, esse novo tipo <strong>de</strong> animal<br />

<strong>de</strong> rapina (GM III §15):<br />

114<br />

Oh, esta insana e triste besta que é o homem! Que coisas não lhe<br />

ocorrem, que <strong>de</strong>snatureza, que paroxismos do absurdo, que bestialida<strong>de</strong>

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!