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moralidade, civilização e decadência - Programa de Pós ...

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Não do asceta garante-lhe, pois uma direção a seus instintos <strong>de</strong>generados, assegura a sua<br />

vonta<strong>de</strong> <strong>de</strong> potência, afirma o seu tipo – ainda que essa afirmação se baseie na negação do<br />

próprio corpo, dos seus instintos. Como o asceta, com a sua fisiologia <strong>de</strong>bilitada e a sua<br />

psique mórbida, não é capaz <strong>de</strong> na luta com os homens nobres, fortes e vigorosos, afirmar<br />

o seu po<strong>de</strong>r, ele cria uma lógica sob a qual a vida passa a valer como ponte para outra<br />

existência, existência que é conformada pela negação <strong>de</strong> tudo aquilo que, <strong>de</strong> acordo com o<br />

filósofo, é efetivamente dotado <strong>de</strong> existência:<br />

113<br />

Supondo que essa vonta<strong>de</strong> encarnada <strong>de</strong> contradição e antinatureza seja<br />

levada a filosofar: on<strong>de</strong> <strong>de</strong>scarregará o seu arbítrio mais íntimo? Naquilo<br />

que é experimentado do modo mais seguro como verda<strong>de</strong>iro, como real:<br />

buscará o erro precisamente ali on<strong>de</strong> o autêntico instinto <strong>de</strong> vida situa<br />

incondicionalmente a verda<strong>de</strong>. (GM III §12) 73<br />

Toda a prática ascética – que, como vimos rapidamente, é baseada na “<strong>de</strong>ssensualização”<br />

e na inativida<strong>de</strong> – está diretamente relacionada à essa negação da<br />

existência. “O asceta trata a vida como um erro que se refuta – que se <strong>de</strong>ve refutar com a<br />

ação” (GM III §11). Ora, uma vez que o mundo, bem verda<strong>de</strong> o seu próprio corpo se<br />

apresenta como um sofrimento intolerável, o asceta cria um mundo espiritual, que sendo<br />

em tudo contrário ao real, apresenta-se como uma promessa <strong>de</strong> felicida<strong>de</strong>. A partir disso,<br />

Nietzsche conclui que a vonta<strong>de</strong> <strong>de</strong> potência ascética, fundamentando-se numa negação da<br />

vida, do efetivamente real, seria antes uma vonta<strong>de</strong> <strong>de</strong> nada, uma vonta<strong>de</strong> <strong>de</strong> morte tornada<br />

i<strong>de</strong>al, possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> domínio.<br />

Frente a essas últimas consi<strong>de</strong>rações, já po<strong>de</strong>mos perceber que o sacerdote ascético<br />

tem no seu i<strong>de</strong>al, “não apenas a sua fé, mas também sua vonta<strong>de</strong>, seu po<strong>de</strong>r, seu interesse”,<br />

e isso <strong>de</strong> modo que seu “direito a existência se sustenta ou cai com esse i<strong>de</strong>al” (i<strong>de</strong>m).<br />

Afinal, é através da sua interpretação que o asceta consegue impor domínio não só sobre si<br />

mesmo, mas também sobre os <strong>de</strong>mais <strong>de</strong>generados, os homens subalternos, <strong>de</strong>tentores da<br />

má-consciência. Contudo, se a interpretação ascética garantiu a permanência e, como<br />

veremos no item a seguir, a supremacia do seu tipo, e, por conseguinte, da <strong>de</strong>generação,<br />

por outro lado, foi ela que, ao fornecer uma interpretação, uma vonta<strong>de</strong> <strong>de</strong> po<strong>de</strong>r ao<br />

sofrimento, à má-consciência, “protegeu a vida diante do <strong>de</strong>sespero e do salto no nada em<br />

73 A filosofia e o ascetismo estão, para Nietzsche, completamente imbricados. De acordo com ele, à<br />

“filosofia suce<strong>de</strong>u inicialmente o mesmo que a todas as coisas boas – por muito tempo não tiveram<br />

coragem <strong>de</strong> ser elas mesmas”. As virtu<strong>de</strong>s e impulsos dos filósofos são, pois, para Nietzsche, virtu<strong>de</strong>s e<br />

impulsos ascéticos (GM III §9). Sócrates, como marco do domínio ascético no Oci<strong>de</strong>nte, é o melhor<br />

exemplo <strong>de</strong>stas consi<strong>de</strong>rações.

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