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de julgamento do presidente como se eu estivesse dizendo que ele pairava acima da lei e da ética. Não foi o que eu disse. Disse que tudo que envolve o comportamento do presidente da República não é objeto da Comissão de Ética. Porque o presidente tem foro próprio, que é o Supremo Tribunal Federal, ou a avaliação popular por meio de ação por crime de responsabilidade previsto na Constituição, mas isso não passa pela comissão, isso é dos estatutos da comissão. RdB – Há uma posição leviana da grande imprensa em relação a diversos assuntos; como se faz para ela ser mais democrática? Maria Victoria – É bom lembrar que os leitores de jornal representam uma parcela muito pequena do nosso povo, e não só do povão. Todas as vezes que entro no primeiro dia de aula na USP pergunto quem tem hábito de ler jornal. Não chega a 5% dos alunos. Se nem os alunos da USP estão lendo, a situação é complicada. Mas os jornais atuam como pauta para a televisão e a TV, sim, atinge muita gente. Em relação à imprensa, propriamente, o que eu acho de pior é a dificuldade que temos para corrigir alguma coisa que sai equivocada. A notícia sai com o maior destaque e depois a correção é um “erramos” pequenininho. Outro problema é uma quantidade de jovens que no jornalismo tem reais possibilidades de ascensão social e em termos salariais, qualidade de vida, o que os torna, muito jovens, muito arrogantes, muito prepotentes e bajuladores de quem tem poder, a começar pelos chefes dentro do veículo de imprensa. Mas meu principal ponto são os vínculos da chamada grande imprensa de hoje com o poder econômico. O que vemos é que os meios de comunicação estão em situação financeira difícil e se aliam a grupos internacionais ou de banqueiros e acabam servindo politicamente a esses interesses. Há jornais que defendem, por exemplo, o ministro Palocci, a política do Banco Central, a política do ministro Rodrigues para a Agricultura, o agronegócio, mas têm uma radicalidade tremenda com tudo que possa ser social e em defesa dos setores mais pobres. Aquela velha questão da dificuldade de se implantar realmente um regime democrático com um mínimo de igualdade. Essa dependência da chamada grande imprensa com os interesses do capital comprometem muito uma informação correta. RdB – Há pouco tempo li uma entrevista em que a senhora afirma que quer seu PT de volta, o que é isso? Maria Victoria – Essa foi uma entrevista que dei, muito cansativa, e chegou uma hora estava cansada e disse à jornalista “Sabe Laura (Greenhalg, repórter de O Estado de S.Paulo), o que eu queria mesmo era meu partido de volta”. Até falei brincando. Na hora me acendeu uma luzinha e disse: isso vai ser a manchete. Depois, brincando, meu filho (também jornalista) disse, “mas mãe, se ela não pusesse isso como manchete seria despedida por péssimo jornalismo, porque qualquer jornalista poria isso como manchete.” Mas eu quero meu partido de volta porque acho que o que tem aparecido, veja bem não é o que existe na realidade, mas o que tem aparecido para a militância, para os simpatizantes, é algo muito diferente do partido antes dessa vitória. Em outros casos eu diria até que não só nessa vitória, mas também em outras, em estados e municípios. Acho que o partido precisa retomar seu papel pedagógico, que é de formação política, seu papel de ser realmente interlocutor dos movimentos sociais, o partido não os substitui, mas é um interlocutor, porque o meu PT é o quê? É fruto da união de amplíssimos movimentos sociais, de uma esquerda que tinha uma longa história de luta, de intelectuais comprometidos com a mudança social, de setores da Igreja com compromisso de organização pela base e o movimento sindical. Acontece que o partido acabou tomando muitas vezes a fisionomia de um partido do ABC paulista, do movimento social paulista, e foi muito mais que isso na sua criação e na sua história. Eu, por exemplo, sou uma militante desde antes da formação do partido, e não venho de movimento sindical nem tenho história de luta operária. O partido é um conjunto de tudo isso. É natural que tenha grupos que pensem diferente, que tenha disputas, mas o que tem de ser preservado é essa característica ética do partido, que dava uma cara muito respeitável, em que se dizia que era o único partido do sistema partidário brasileiro, porque tinha programa, militância, vida fora das eleições, compromisso com uma determinada parte da sociedade, a maioria, os pobres, os movimentos populares. E que tinha fidelidade partidária. Acho que, infelizmente, a disputa pelo poder tem aspectos perversos, demoníacos e que comprometem muito a ética do partido. Já avisei aos meus amigos que gostaria que o PT vencesse as eleições para o governo de São Paulo, mas se houver baixaria, falta de ética na disputa entre os candidatos, eu simplesmente não vou votar. RdB – Há alternativa se o projeto do PT for derrotado? Volta quem, a direita, o PSDB, o PFL? Maria Victoria – Não. Concordo muito com o que disse o Carlos Lessa (ex-presidente do BNDES) numa entrevista à Caros Amigos, quando dizia: “estou insatisfeito com muita coisa, mas quero que o Lula ganhe porque se os tucanos voltarem eles voltarão com uma voracidade tremenda.” Voracidade para assumir tudo do poder e para avançar num projeto neoliberal, cujo eixo mais danoso é a alienação do patrimônio nacional. Não me conformo com as privatizações que foram feitas. E agora estou vendo que aqui em São Paulo (Estado) estamos indo pelo mesmo caminho, com as perspectivas de privatização, de capital aberto para o que ainda restava. Vejo que há possibilidade ainda de melhorarmos nossas perspectivas em relação ao governo porque não tivemos ainda a reforma tributária, a trabalhista, nem a sindical. ❚ Veja íntegra da entrevista com a socióloga no www.spbancarios.com.br Quero o meu partido de volta. Acho que o PT precisa retomar seu papel pedagógico, de formação política, seu papel de ser realmente interlocutor dos movimentos sociais FOTOS: JAILTON GARCIA REVISTA DOS BANCÁRIOS | 13
CAPA , FORA DA ORDEM O consumo compulsivo e sem critério acelerou a exploração dos recursos naturais do planeta a níveis impraticáveis Um dos principais comportamentos que expressa a relação do homem moderno com o mundo é o consumo. Pouca gente, porém, tem a noção exata de que absolutamente tudo que se consome – dos tijolos para construção de casas às peças de carros e microchips dos computadores – é fabricado a partir de elementos vegetais, minerais 14 | REVISTA DOS BANCÁRIOS ou animais extraídos do planeta. Até os anos 50, a Terra ainda conseguia repor razoavelmente os recursos que cedia gentilmente à humanidade. Mas, a partir de então, o desenvolvimento tecnológico, largamente confundido com progresso, levou países desenvolvidos e em desenvolvimento a uma expansão consumista generalizada. E, alertam os defensores do consumo consciente – termo ainda novo para um problema nem tanto – passou da hora de botar o pé no freio. Dados da Organização das Nações Unidas denunciam que o mundo já utiliza 20% a mais do que o planeta pode produzir em recursos exploráveis para suprir as necessidades de consumo de seus habitantes (e isso considerando que há mais de um bilhão deles excluídos desse processo). A mesma ONU calcula que se todos os paí-
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