04.04.2013 Views

Antropologia e sexualidade - Miguel Vale de Almeida.pdf

Antropologia e sexualidade - Miguel Vale de Almeida.pdf

Antropologia e sexualidade - Miguel Vale de Almeida.pdf

SHOW MORE
SHOW LESS

You also want an ePaper? Increase the reach of your titles

YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.

vistas como sendo o seu resultado. Butler advoga a contestação <strong>de</strong>ssa<br />

naturalização através da repetição <strong>de</strong>slocada da sua performativida<strong>de</strong>,<br />

chamando assim atenção para os processos que consolidam as<br />

i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong>s sexuais. Uma das estratégias recomendadas é a repetição<br />

paródica das normas <strong>de</strong> género. Foca, pois, no drag (o qual seria, a<br />

meu ver, a expressão icónica da própria atitu<strong>de</strong> queer). O género é,<br />

então, performativo, não porque seja algo que o sujeito assume<br />

<strong>de</strong>liberadamente, mas porque, através da reiteração, consolida o<br />

sujeito. Não se trata, todavia, do mesmo que simplesmente “vestir<br />

roupa”: o constrangimento é o pré-requisito da performativida<strong>de</strong>.<br />

Embora esta ressalva tente ultrapassar o carácter difuso da localização<br />

do po<strong>de</strong>r a la Foucault, não indica, a meu ver, com a clareza<br />

suficiente, quais as instituições e lugares <strong>de</strong> po<strong>de</strong>r on<strong>de</strong> o género e a<br />

<strong>sexualida<strong>de</strong></strong> são formados e reproduzidos.<br />

Mais do que <strong>de</strong> transformações em instituições sociais como a<br />

família, a teoria queer advém <strong>de</strong> transformações no activismo social<br />

permeado pela própria teoria social. É o caso <strong>de</strong> novas formas <strong>de</strong> fazer<br />

política sexual e, simultaneamente, <strong>de</strong> enten<strong>de</strong>r as i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong>s (ou a<br />

fragilida<strong>de</strong> <strong>de</strong>stas): exemplo disso será o discurso sobre o HIV/Sida,<br />

que questionou o estatuto do sujeito no discurso biomédico; enfatizou<br />

as práticas sexuais e não as i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong>s; promoveu uma política <strong>de</strong><br />

coligação que repensou a i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong> em termos <strong>de</strong> afinida<strong>de</strong> e não <strong>de</strong><br />

essência; e enten<strong>de</strong>u o discurso como uma realida<strong>de</strong> não separada da<br />

prática ou <strong>de</strong> segunda or<strong>de</strong>m (Jagose 1996).<br />

Se é comum pensar que Queer funciona sobretudo como<br />

modismo para distinguir gays <strong>de</strong> “velho estilo” dos <strong>de</strong> “novo estilo”, é<br />

certo que o termo po<strong>de</strong> ser usado para <strong>de</strong>screver uma população<br />

aberta, cujas características partilhadas não são a i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong> mas um<br />

posicionamento anti-normativo em relação à <strong>sexualida<strong>de</strong></strong>. Como no<br />

início do liberacionismo gay, queer confun<strong>de</strong> as categorias que<br />

autorizam a normativida<strong>de</strong> sexual; mas difere <strong>de</strong> “gay” porque evita a<br />

ilusão <strong>de</strong> que o seu projecto seja inventar ou <strong>de</strong>svelar uma qualquer<br />

<strong>sexualida<strong>de</strong></strong> livre, natural ou primordial.<br />

Ao confrontar já não apenas os essencialismos das estruturas<br />

sociais e do conhecimento, mas também o essencialismo estratégico<br />

dos movimentos i<strong>de</strong>ntitários sexuais, a teoria queer lança como<br />

urgente a necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> repensar as noções <strong>de</strong> i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong>,<br />

comunida<strong>de</strong> e política. Curiosamente, são estas as noções que<br />

20

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!