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progressiva afirmação do negro na cidade. Os cucumbis baia<strong>no</strong>s<br />
reapareceriam <strong>no</strong> <strong>Rio</strong> de Janeiro a<strong>no</strong>s depois, em ranchos negros<br />
onde se cantava e dançava música africana em procissões que<br />
atravessavam os bairros populares, só interrompidas pelas luzes<br />
da manhã.<br />
A festa de Primeiro de Janeiro, que tinha seu ápice na<br />
procissão de Nosso Senhor dos Navegantes, também seria ligada<br />
indiretamente ao negro, já que era patrocinada por capitães e<br />
pilotos dos navios negreiros, se acostumando o povo a associá-la<br />
aos batuques de rua, às rodas de samba e capoeira nas praças e<br />
em tor<strong>no</strong> da igreja do “santo”. Uma das mais importantes, e ainda<br />
hoje celebrada em moldes semelhantes, é a do Senhor do Bonfim,<br />
a festa de Oxalá, que leva, na quinta-feira que a precede,<br />
inúmeros negros à sua igreja para a lavagem do chão, numa<br />
manifestação de devoção africana e piedade cristã. Mulheres<br />
vestidas com suas roupas rituais brancas levam, com um<br />
equilíbrio elegante, potes de barro com água, acompanhadas de<br />
carros e carroças decorados por bandeirolas e serpentinas sempre<br />
brancas. O príncipe Maximilia<strong>no</strong> da Áustria, insuspeitadamente<br />
excelente cronista, descreve com um sentido cinematográfico,<br />
onde não está ausente um excelente fecho de cena, uma dessas<br />
ocasiões, por volta da metade do século passado, enfatizando o<br />
surpreendente convívio da festa africana com a reunião da<br />
sociedade baiana e o rito católico:<br />
O tumulto de uma feira reinava, neste momento, na praça e na igreja.<br />
A população negra, em roupas de festa, empurrava-se com muito<br />
barulho. Viam-se suspensas sobre as cabeças caixas de vidro repletas<br />
de comestíveis. Peque<strong>no</strong>s grupos de vendedores de cachaça formavam<br />
como ilhas <strong>no</strong> meio deste ocea<strong>no</strong> de seres huma<strong>no</strong>s. Nós <strong>no</strong>s deixamos<br />
levar pela torrente até o edifício principal. Penetramos, por uma porta<br />
lateral, como água que se precipita numa represa. Uma longa fila de