TiaCiata_e_a_Pequena_%C3%81frica_no_Rio
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gente que aprende o fascínio da velha cidade baiana, onde, mesmo inferiorizada, acharia suas alternativas de resistência e prazer. De um escrito de 1870: Poucas cidades pode haver tão originalmente povoadas como a Bahia. Se não se soubesse que ela fica no Brasil, poder-se-ia sem muita imaginação tomá-la por capital africana, residência de poderoso príncipe negro, na qual passa inteiramente despercebida uma população de forasteiros brancos puros. Tudo parece negro: negros na praia, negros na cidade, negros na parte baixa, negros nos bairros altos. Tudo o que corre, grita, trabalha, tudo o que transporta e carrega é negro (Robert Avé-Lallemant, Reise Durchnord-brasilien). Pela cidade se dividem os pontos das nações, negros que saíam de casa com tarefas, ou gente de ofício, operários, pedreiros, carpinteiros, ferreiros, sapateiros, cocheiros, barbeiros, músicos, dividindo seus ganhos com os senhores. Estes ficam com a parte do leão, aqueles guardando, de tostão em tostão, as sobras para a compra da cara, portanto difícil, alforria. Geralmente, uma vez obtida a alforria, continuavam nos mesmo ofícios, os que podiam abrindo uma portinha onde exploravam suas habilidades ou instalavam um pequeno comércio. Suas roupas eram feitas pelas mulheres com o algodão grosso dos sacos: calças de enfiar de canos curtos, camisolões compridos com bolsos, às vezes sem mangas, vestimentas quase invariavelmente complementadas por gorros, também de algodão grosso. Ainda no início de século XX, restavam alguns desses pontos, onde se reuniam africanos, cada vez menos numerosos. Pierre Verger reconstrói Salvador de um pouco antes, da segunda metade do século passado [pg. 28] Na cidade baixa, nos Arcos de Santa Bárbara ficam os guruncis. Passos adiante entre os Arcos de Santa Bárbara e o hotel das Nações,
alguns velhinhos cansados e modorrentos, últimos representantes da outrora enérgica, belicosa e aguerrida colônia dos Haussas, ali diariamente se reúnem. Mais numerosos são os “cantos” dos Nagôs. No “canto” do Mercado, rua do Comércio ao lado dos Cobertos Grandes, em mais de um ponto da rua das Princesas em frente aos grandes escritórios comerciais, se congregam velhos Nagôs. São também dos Nagôs os “cantos” da cidade alta: rua da Ajuda, no largo da Piedade, na ladeira de S. Bento. No “canto” do Campo Grande, a alguns Nagôs se reúnem uns três ou quatro Gegês (Pierre Verger, Notícias da Bahia de 1850). Com a melhora das vias de comunicação abertas pelas tropas de bois a partir do início do século XIX, e com a abertura das estradas de ferro na província, a migração do campo para a capital se intensifica, por vezes carregando trabalhadores rurais de outras províncias nordestinas tocados pela seca, situação que chegaria a seu ápice depois com os flagelos de 1868 e 1871. A migração contínua somava-se o número crescente de negros forros disputando posições no mercado de trabalho de Salvador, diminuindo a oferta e agravando as condições de moradia e de fornecimento de alimento para os trabalhadores livres na cidade. Os bairros populares se superlotam, os negros se juntam em casarões alugados, geralmente com os irmãos de nação. São os hábitos da vida comum que os protegeriam nesses duros anos de transição. Muitos pensam em voltar para a África, outros, aqui já nascidos, não saberiam mais para onde se dirigir num continente rasgado pelas disputas colonialistas. Talvez valesse mais a pena, muitos pensavam, tentar a sorte em outra cidade brasileira. Na verdade, se trava no período uma luta surda entre trabalhadores livres e donos de escravos, provocando o aparecimento de uma série de disposições municipais, vedando a ocupação de funções públicas e de alguns ofícios aos escravos. Só
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gente que aprende o fascínio da velha cidade baiana, onde, mesmo<br />
inferiorizada, acharia suas alternativas de resistência e prazer. De<br />
um escrito de 1870:<br />
Poucas cidades pode haver tão originalmente povoadas como a Bahia.<br />
Se não se soubesse que ela fica <strong>no</strong> Brasil, poder-se-ia sem muita<br />
imaginação tomá-la por capital africana, residência de poderoso<br />
príncipe negro, na qual passa inteiramente despercebida uma<br />
população de forasteiros brancos puros. Tudo parece negro: negros na<br />
praia, negros na cidade, negros na parte baixa, negros <strong>no</strong>s bairros<br />
altos. Tudo o que corre, grita, trabalha, tudo o que transporta e<br />
carrega é negro (Robert Avé-Lallemant, Reise Durch<strong>no</strong>rd-brasilien).<br />
Pela cidade se dividem os pontos das nações, negros que<br />
saíam de casa com tarefas, ou gente de ofício, operários,<br />
pedreiros, carpinteiros, ferreiros, sapateiros, cocheiros, barbeiros,<br />
músicos, dividindo seus ganhos com os senhores. Estes ficam com<br />
a parte do leão, aqueles guardando, de tostão em tostão, as sobras<br />
para a compra da cara, portanto difícil, alforria. Geralmente, uma<br />
vez obtida a alforria, continuavam <strong>no</strong>s mesmo ofícios, os que<br />
podiam abrindo uma portinha onde exploravam suas habilidades<br />
ou instalavam um peque<strong>no</strong> comércio. Suas roupas eram feitas<br />
pelas mulheres com o algodão grosso dos sacos: calças de enfiar<br />
de ca<strong>no</strong>s curtos, camisolões compridos com bolsos, às vezes sem<br />
mangas, vestimentas quase invariavelmente complementadas por<br />
gorros, também de algodão grosso.<br />
Ainda <strong>no</strong> início de século XX, restavam alguns desses<br />
pontos, onde se reuniam africa<strong>no</strong>s, cada vez me<strong>no</strong>s numerosos.<br />
Pierre Verger reconstrói Salvador de um pouco antes, da segunda<br />
metade do século passado [pg. 28]<br />
Na cidade baixa, <strong>no</strong>s Arcos de Santa Bárbara ficam os guruncis.<br />
Passos adiante entre os Arcos de Santa Bárbara e o hotel das Nações,