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23.02.2013 Views

“incompetente” e “conivente” pelos inflamados artigos escritos no tom moralista tão ao gosto de nossos jornalistas e políticos, encimados por títulos como “O cancro da jogatina” ou “Escândalos do jogo”. Embora a campanha provocasse algumas medidas por parte das autoridades para não dar na vista, fechando alguns dos cassinos que funcionavam seguramente pagando uma taxa aos policiais, Irineu Marinho não esmorece. Com o espírito irreverente que sempre manteve na imprensa carioca, um grupo de jornalistas de A Noite, dos quais ficaram os nomes de Eustáquio Alves Castelar de Carvalho e do escritor e letrista Orestes Barbosa, instalam no dia 3 de maio daquele ano uma roleta de papelão em pleno dia no largo da Carioca, fazendo-se passar por banqueiro e jogadores, afixando o cartaz com os seguintes dizeres: “Jogo franco — Roleta com 32 números — Só ganha freguês”. Conta Jota Efegê: “Como seria de esperar, antes mesmo que o senhor Belisário Távora tomasse as providências cabíveis, o guarda civil n° 579 brandindo o cassetete desmantelou a roleta. Ação repressiva imediatamente completada [pg. 116] com o aparecimento do comissário Ribeiro Sá, do 3 o distrito policial, que, seguido de alguns cavalarianos, pôs o povo em fuga” (Uma reportagem satírica que acabou sucesso de Carnaval. O Globo, Rio de Janeiro, 5 fev. 1972). A matéria sairia no dia seguinte com uma foto de populares em torno da roleta com o título e subtítulo na primeira página: “O jogo é franco/ uma roleta em pleno largo da Carioca”. Assim é que de uma dessas “comédias” cariocas envolvendo populares, jornalistas, contraventores e policiais, sairia o tema do que é considerado o primeiro samba moderno, revelador dos novos caminhos por que passaria a música trazida pelos baianos frente

Capa da partitura Ai, si a rolinha, sinhô, sinhô. In: Almirante, op.cit., s.n.p. do museu, Museu da Imagem e do Som/RJ). à nova realidade encontrada na cidade do Rio de Janeiro. Donga, seu “autor”, pivô de uma interminável polêmica, se referia ao fato numa entrevista ao Museu da Imagem e do Som: “O episódio foi muito comentado. Isso dá samba, pensei eu. Escolhido um motivo melódico folclórico dos muito existentes, dei-lhe um desenvolvimento adequado e pedi ao repórter Mauro de Almeida que fizesse a letra” (Entrevista de Donga, em As vozes desassombradas De acordo, entretanto, com grande parte dos cronistas musicais e pesquisadores, entre os quais o considerado Almirante, o tema em voga teria sido desenvolvido, como tantos outros, na casa de Tia Ciata, numa das freqüentes rodas de samba, presentes, além da dona da casa, seu genro Germano, o “xará” Hilário Jovino, e outros. Em sua versão inicial como partido, e portanto aberto às improvisações, esse samba foi cantado “solto como um pássaro” até 1916 nos pagodes, quando, mantida a sua atualidade pela crônica questão do jogo na cidade e já com o novo chefe de polícia Aurelino Leal, Donga lhe teria dado um desenvolvimento definitivo com uma letra fixada pelo jornalista Mauro de Almeida, o conhecido carnavalesco Peru dos Pés Frios. Ainda de acordo com Almirante, o samba já em sua versão

“incompetente” e “conivente” pelos inflamados artigos escritos <strong>no</strong><br />

tom moralista tão ao gosto de <strong>no</strong>ssos jornalistas e políticos,<br />

encimados por títulos como “O cancro da jogatina” ou “Escândalos<br />

do jogo”.<br />

Embora a campanha provocasse algumas medidas por parte<br />

das autoridades para não dar na vista, fechando alguns dos<br />

cassi<strong>no</strong>s que funcionavam seguramente pagando uma taxa aos<br />

policiais, Irineu Marinho não esmorece. Com o espírito irreverente<br />

que sempre manteve na imprensa carioca, um grupo de jornalistas<br />

de A Noite, dos quais ficaram os <strong>no</strong>mes de Eustáquio Alves<br />

Castelar de Carvalho e do escritor e letrista Orestes Barbosa,<br />

instalam <strong>no</strong> dia 3 de maio daquele a<strong>no</strong> uma roleta de papelão em<br />

ple<strong>no</strong> dia <strong>no</strong> largo da Carioca, fazendo-se passar por banqueiro e<br />

jogadores, afixando o cartaz com os seguintes dizeres: “Jogo<br />

franco — Roleta com 32 números — Só ganha freguês”. Conta<br />

Jota Efegê:<br />

“Como seria de esperar, antes mesmo que o senhor Belisário Távora<br />

tomasse as providências cabíveis, o guarda civil n° 579 brandindo o<br />

cassetete desmantelou a roleta. Ação repressiva imediatamente<br />

completada [pg. 116] com o aparecimento do comissário Ribeiro Sá,<br />

do 3 o distrito policial, que, seguido de alguns cavalaria<strong>no</strong>s, pôs o povo<br />

em fuga” (Uma reportagem satírica que acabou sucesso de Carnaval. O<br />

Globo, <strong>Rio</strong> de Janeiro, 5 fev. 1972).<br />

A matéria sairia <strong>no</strong> dia seguinte com uma foto de populares<br />

em tor<strong>no</strong> da roleta com o título e subtítulo na primeira página: “O<br />

jogo é franco/ uma roleta em ple<strong>no</strong> largo da Carioca”.<br />

Assim é que de uma dessas “comédias” cariocas envolvendo<br />

populares, jornalistas, contraventores e policiais, sairia o tema do<br />

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