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não se restringindo aos negros e aos portugueses, a festa atraindo<br />
até a moderna burguesia urbana já em busca de algo exótico,<br />
forte, para quem o festeiro popular mesmo estigmatizado já<br />
desperta um interesse eventual, desequilibrando agradavelmente a<br />
vida civilizada das elites. Enquanto o Carnaval popular era<br />
comemorado na praça Onze, longe dos bailes e dos corsos da<br />
avenida Central, a Penha se constitui num primeiro local de<br />
encontro da massa negra com as demais classes urbanas, mesmo<br />
a africanização da festa sendo criticada pelos preconceitos dos<br />
religiosos e dos intelectuais, e, como conta Donga, pelo rigor da<br />
polícia.<br />
A imprensa carioca, a partir do início do século, começa a<br />
registrar a repercussão, da Penha na vida da cidade, muitas vezes<br />
se mostrando chocada com a força da festa que saíra do controle<br />
da Igreja sem ter passado pelo crivo da <strong>no</strong>va burguesia. Numa<br />
crônica de 1906 publicada na revista Kosmos, Olavo Bilac se<br />
refere à “ignóbil festa da Penha que todos os a<strong>no</strong>s, neste mês de<br />
outubro, reproduz <strong>no</strong> <strong>Rio</strong> de Janeiro as cenas tristes das velhas<br />
saturnais romanas, transbordamentos tumultuosos e alucinados<br />
dos instintos da gentalha”. Adiante, Bilac dá suas impressões de<br />
uma visita ao sítio das celebrações: “Ainda este a<strong>no</strong>, a festa foi tão<br />
brutal, desordenada e assinalada por tantas vergonhas e por<br />
tantos crimes, que não parecia um folguedo da Idade Moderna <strong>no</strong><br />
seio de uma cidade civilizada, mas uma daquelas orgias da Idade<br />
Média, em que triunfavam as mais belas paixões da plebe e dos<br />
escravos”.<br />
No entanto, um grupo de jornalistas cariocas, conhecidos<br />
exatamente como “carnavalescos”, daria outra abordagem à festa<br />
da Penha, expressando a sensibilidade popular na imprensa<br />
carioca, na época dominada por um espírito europeizado,