TiaCiata_e_a_Pequena_%C3%81frica_no_Rio
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de legitimar as organizações negras faria até com que os ranchos chegassem aos palácios de governo. Ainda no Diário Carioca (7 de fevereiro de 1931): “O Rei de Ouro em 1894, no Itamarati, em presença de Floriano Peixoto, e o outro foi o Ameno Resedá, no Guanabara, em presença do marechal Hermes da Fonseca. Na Bahia, os ranchos fazem cerimônias na praça do Palácio em cumprimento ao governador”. Nos ranchos, cortejos de músicos e dançarinos religiosos mas pândegos e democráticos, que já anteriormente apareciam na Bahia, lutariam carnavalescamente para impor a presença do negro e suas formas de organização e expressão nas ruas da capital da República. A baiana Bebiana, irmã de santo da grande Ciata de Oxum, é figura central da primeira fase dos ranchos cariocas, ainda ligada ao ciclo do Natal, guardando em sua casa, no antigo largo de São Domingos, a lapinha, em frente à qual os cortejos iam evoluir no dia de Reis. Hilário, que se tornaria o principal criador e organizador dos ranchos da Saúde, talvez o principal responsável pelo deslocamento dos desfiles para o Carnaval, o que transformaria substancialmente suas características: a festa profana passa a sugerir um novo enfoque musical e coreográfico, se transferindo para a Cidade Nova, em torno da praça Onze, os pontos de encontro, organização e desfile dos ranchos baianos. Com a modernização da cidade e o deslocamento dos antigos moradores do Centro para a Cidade Nova, o “pequeno Carnaval” toma a praça Onze de Junho. Além dos ranchos que se organizam, trabalhadores irregulares, biscateiros, desocupados, malandros, a gente estrangulada no mercado de trabalho e a molecada esperta, saem em grupos anárquicos, formando blocos e cordões, quando a alegria desenfreada se junta por vezes a violência, principalmente
nos esperados encontros com grupos rivais com [pg. 89] quem Baianos legítimos. Desenho de Mendez. In: Tipos e costumes do negro no Brasil. Rio de Janeiro, Casa Riedl, 1938. s.n.p. invariavelmente se atracam em formidáveis brigas. Mas os ranchos, vindos de bases familiares ou corporativas dos baianos, originavam-se da tradição processional- dramática de origem religiosa, elaborando uma narrativa dramática no desfile, a partir de acontecimentos históricos fundamentais e de seus personagens repetidos e atualizados. Muitos desses ranchos teriam seus “sujos” compostos por seus próprios integrantes, grupos carnavalescos que saíam depois do dia do desfile, informais e satíricos, já descomprometidos com as formalidades da situação festiva ligada à identidade tradicional do grupo. João do Rio descreve “do outro lado da rua” com sua habitual expressividade, impactado pelos negros: O cordão vinha assustador. À frente um grupo desenfreado de quatro ou cinco caboclos adolescentes com os sapatos desfeitos e grandes arcos pontudos corriam abrindo as bocas em berros roucos. Depois um negralhão todo de penas, com a face lustrosa como piche, a gotejar suor, estendia o braço musculoso e nu sustentando o tacape de ferro. Em seguida gorgolejava o grupo vestido de vermelho e amarelo com lantejoulas d’oiro a chispar no dorso das casacas e grandes cabeleiras de cachos, que se confundiam com a epiderme num empastamento nauseabundo. Ladeando o bolo, homens em tamancos ou de pés nus
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<strong>no</strong>s esperados encontros com grupos rivais com [pg. 89] quem<br />
Baia<strong>no</strong>s legítimos. Desenho de Mendez.<br />
In: Tipos e costumes do negro <strong>no</strong> Brasil.<br />
<strong>Rio</strong> de Janeiro, Casa Riedl, 1938. s.n.p.<br />
invariavelmente se atracam em<br />
formidáveis brigas. Mas os<br />
ranchos, vindos de bases<br />
familiares ou corporativas dos<br />
baia<strong>no</strong>s, originavam-se da<br />
tradição processional-<br />
dramática de origem religiosa,<br />
elaborando uma narrativa<br />
dramática <strong>no</strong> desfile, a partir<br />
de acontecimentos históricos<br />
fundamentais e de seus<br />
personagens repetidos e<br />
atualizados. Muitos desses<br />
ranchos teriam seus “sujos”<br />
compostos por seus próprios<br />
integrantes, grupos carnavalescos que saíam depois do dia do<br />
desfile, informais e satíricos, já descomprometidos com as<br />
formalidades da situação festiva ligada à identidade tradicional do<br />
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João do <strong>Rio</strong> descreve “do outro lado da rua” com sua<br />
habitual expressividade, impactado pelos negros:<br />
O cordão vinha assustador. À frente um grupo desenfreado de quatro<br />
ou cinco caboclos adolescentes com os sapatos desfeitos e grandes<br />
arcos pontudos corriam abrindo as bocas em berros roucos. Depois<br />
um negralhão todo de penas, com a face lustrosa como piche, a gotejar<br />
suor, estendia o braço musculoso e nu sustentando o tacape de ferro.<br />
Em seguida gorgolejava o grupo vestido de vermelho e amarelo com<br />
lantejoulas d’oiro a chispar <strong>no</strong> dorso das casacas e grandes cabeleiras<br />
de cachos, que se confundiam com a epiderme num empastamento<br />
nauseabundo. Ladeando o bolo, homens em tamancos ou de pés nus