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A PEQUENA ÁFRICA E O REDUTO DE TIA CIATA No tempo da criação, quando Oxum estava vindo das profundezas do orum, Oludumaré confiou-lhe o poder de zelar por cada uma das crianças criadas por Orixá que iriam nascer na terra. Oxum seria a provedora de crianças. Ela deveria fazer com que as crianças permanecessem no ventre de suas mães, assegurando-lhes medicamentos e tratamentos apropriados para evitar abortos e contratempos antes do nascimento; mesmo depois de nascida a criança, até ela não estar dotada de razão e não estar falando alguma língua, o desenvolvimento e a obtenção de sua inteligência estariam sob o cuidado de Oxum. Ela não deveria encolerizar-se com ninguém afim de não recusar uma criança a um inimigo e dar a gravidez a um amigo. Texto ioruba reproduzido no livro Os nagôs e a morte, de Juana Elbeim dos Santos A subida de cotação no mercado internacional dos preços do algodão, com a paralisação da produção americana pela Guerra de Secessão, abrindo novas frentes de trabalho na província da Bahia, não basta para absorver a grande massa de trabalhadores livres disponíveis, que aumenta com a progressão da legislação abolicionista. Assim, sob a proteção da bandeira branca de Oxalá, continuam chegando ao Rio de Janeiro, nos porões dos navios que faziam escala no porto de Salvador, negros baianos livres, principalmente das nações sudanesas, em busca de uma sociedade mais aberta onde pudessem se afirmar, superando os traumas da escravatura. Os primeiros que conseguem uma situação na capital, um lugar para morar e cultuar os orixás e uma forma de trabalho, não hesitam em fornecer comida e
moradia aos que vão chegando, o que permitiu um fluxo migratório regular até a passagem do século, garantindo uma forte presença dos baianos no Rio de Janeiro. De fato, os baianos se impõem no mundo carioca em torno de seus líderes vindos dos postos do candomblé e dos grupos festeiros, se constituindo num dos únicos grupos populares no Rio de Janeiro, naquele momento, com tradições comuns, coesão, e um sentido familístico que, vindo do religioso, expande o sentimento e o sentido da relação consangüínea, uma diáspora baiana cuja influência se estenderia por toda a comunidade heterogênea que se forma nos bairros em torno do cais do porto e depois na Cidade Nova, povoados pela gente pequena tocada para fora do Centro pelas reformas urbanísticas. A modernização da cidade e a situação de transição nacional fazem com que indivíduos de diversas experiências sociais, raças e culturas se encontrem nas filas da estiva ou nos corredores das cabeças-de- [pg. 86] porco, promovendo essa situação, já no fim da República Velha, a formação de uma cultura popular carioca definida por uma densa experiência sócio-cultural que, embora subalternizada e quase que omitida pelos meios de informação da época, se mostraria, juntamente com os novos hábitos civilizatórios das elites, fundamental na redefinição do Rio de Janeiro e na formação de sua personalidade moderna. Surgem novas sínteses culturais dessa ralé, instituições — formas de organização do grupo, inicialmente heterogêneo e disforme, formado por indivíduos reunidos apenas por uma situação de subalternidade comum — gêneros artísticos — musicais, dramáticos, festeiros, processionais, esportivos — como novas paixões populares, situações particulares a esta cidade, local de encontro e celebração. Em sua plasticidade, essa cultura
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No tempo da criação, quando Oxum estava vindo das profundezas do<br />
orum, Oludumaré confiou-lhe o poder de zelar por cada uma das<br />
crianças criadas por Orixá que iriam nascer na terra. Oxum seria a<br />
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permanecessem <strong>no</strong> ventre de suas mães, assegurando-lhes<br />
medicamentos e tratamentos apropriados para evitar abortos e<br />
contratempos antes do nascimento; mesmo depois de nascida a criança,<br />
até ela não estar dotada de razão e não estar falando alguma língua, o<br />
desenvolvimento e a obtenção de sua inteligência estariam sob o<br />
cuidado de Oxum. Ela não deveria encolerizar-se com ninguém afim de<br />
não recusar uma criança a um inimigo e dar a gravidez a um amigo.<br />
Texto ioruba reproduzido <strong>no</strong> livro Os nagôs e a morte, de Juana Elbeim<br />
dos Santos<br />
A subida de cotação <strong>no</strong> mercado internacional dos preços do<br />
algodão, com a paralisação da produção americana pela Guerra de<br />
Secessão, abrindo <strong>no</strong>vas frentes de trabalho na província da<br />
Bahia, não basta para absorver a grande massa de trabalhadores<br />
livres disponíveis, que aumenta com a progressão da legislação<br />
abolicionista. Assim, sob a proteção da bandeira branca de Oxalá,<br />
continuam chegando ao <strong>Rio</strong> de Janeiro, <strong>no</strong>s porões dos navios que<br />
faziam escala <strong>no</strong> porto de Salvador, negros baia<strong>no</strong>s livres,<br />
principalmente das nações sudanesas, em busca de uma<br />
sociedade mais aberta onde pudessem se afirmar, superando os<br />
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situação na capital, um lugar para morar e cultuar os orixás e<br />
uma forma de trabalho, não hesitam em fornecer comida e