TiaCiata_e_a_Pequena_%C3%81frica_no_Rio
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de algum “graúdo”, o que na época muitas vezes se confundia com se tornar seu “cabo eleitoral”. Isso com os componentes de traição que esse tipo de adesão implicava para um negro, que eventualmente estaria surrando um dos seus “em serviço”, o que se torna uma rotina. Na verdade, tanto a entrada para a polícia ou para a segurança dos poderosos, como a vida na malandragem, no crime, constituíam variações numa só vertente, fazendo cada um suas escolhas de acordo com as alternativas que se lhe abriam no momento, sofrendo tais indivíduos as deformações que o sistema exigia. Manduca da Praia, por cálculos, é cabo eleitoral do partido do governo e sua escolha nos colégios eleitorais, onde comparece sempre eriçado de facas, de navalhas e cédulas, um quebra-queixo a fumegar na boca, na mão vasto cajado de Petrópolis, nodosa e forte, marreta de ofício, que às vezes, varre até onde acaba a casa, garantindo com a vontade do partido o que ele chama soberarina nacioná. Cada eleição rende-lhe dinheiro, uns poses, como ele diz. Na semana em que há voto, a francesa do Manduca passa a ser caixa do partido. A Tezoura de Prata recebe, logo, encomenda mais um terno... (Luiz Edmundo, op. cit.). A mulher negra, vinda do trabalho doméstico na casa do senhor, ou alugada em serviços de ganho, herdeira da rica civilização africana e de toda a cultura doméstica de portugueses e brasileiros a que dera forma própria, se vale de suas habilidades se engajando na rede de empregos que se arma em torno da infra- estrutura das casas “de família”, senhoriais e burguesas, como cozinheiras, lavadeiras, copeiras ou em [pg. 72] qualquer outro serviço eventual requisitado. As próprias características do trabalho, quando muitas vezes era exigido morar no serviço, em pequenos quartos perto da cozinha para o melhor atendimento dos patrões, dificultam a reconstrução de suas vidas familiares e mesmo o cuidado e a educação de seus filhos, muitos criados à
sombra das casas patriarcais se iniciando desde cedo nos pequenos serviços de compras e recados. Em 1890, dois anos depois da Abolição, dos 74.785 empregados domésticos da capital, 41.320 eram negros, 21.009 brasileiros brancos, e 12.375 estrangeiros. O censo de 1890 mostra que dos 89 mil estrangeiros economicamente ativos na cidade, mais da metade tinham posições no comércio, no artesanato e na indústria manufatureira. Dos negros, 48% dos ativos trabalhavam nos serviços domésticos, 17% na indústria, 9% em atividades agrícolas, extrativas e na criação do gado, enquanto 16% não declararam profissão. Os números revelam que a grande maioria estava submetida a um regime de subemprego, sem segurança ou quaisquer proteções trabalhistas, situação que era também permitida pela “proteção” paternalista dos patrões, que mantinham sua boa consciência complementando os magros pagamentos com o fornecimento de roupas velhas e objetos usados, o que se torna uma solução de uso corrente entre as partes. Eram comuns, na imprensa carioca da época, anúncios requisitando para o serviço doméstico mulheres européias, alemãs, espanholas ou portuguesas, nesta ordem de preferência, as nacionais sendo preteridas mesmo nesta órbita do trabalho. “Precisa-se de criada para todo o serviço em casa de família sem crianças, prefere-se estrangeira, rua do Resende n° 180”. “Precisa- se de uma boa cozinheira alemã para casa de família de tratamento, paga-se bem, dirija-se à rua Cosme Velho n° 113”. As profissões domésticas e as tarefas do comércio que implicavam o contato com o público seriam também preferencialmente ocupadas pelos brancos, e quanto mais brancos melhor. Entretanto, sobravam vagas para os negros, porque era
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para a segurança dos poderosos, como a vida na malandragem, <strong>no</strong><br />
crime, constituíam variações numa só vertente, fazendo cada um<br />
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e sua escolha <strong>no</strong>s colégios eleitorais, onde comparece sempre eriçado<br />
de facas, de navalhas e cédulas, um quebra-queixo a fumegar na boca,<br />
na mão vasto cajado de Petrópolis, <strong>no</strong>dosa e forte, marreta de ofício,<br />
que às vezes, varre até onde acaba a casa, garantindo com a vontade<br />
do partido o que ele chama soberarina nacioná. Cada eleição rende-lhe<br />
dinheiro, uns poses, como ele diz. Na semana em que há voto, a<br />
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recebe, logo, encomenda mais um ter<strong>no</strong>... (Luiz Edmundo, op. cit.).<br />
A mulher negra, vinda do trabalho doméstico na casa do<br />
senhor, ou alugada em serviços de ganho, herdeira da rica<br />
civilização africana e de toda a cultura doméstica de portugueses e<br />
brasileiros a que dera forma própria, se vale de suas habilidades<br />
se engajando na rede de empregos que se arma em tor<strong>no</strong> da infra-<br />
estrutura das casas “de família”, senhoriais e burguesas, como<br />
cozinheiras, lavadeiras, copeiras ou em [pg. 72] qualquer outro<br />
serviço eventual requisitado. As próprias características do<br />
trabalho, quando muitas vezes era exigido morar <strong>no</strong> serviço, em<br />
peque<strong>no</strong>s quartos perto da cozinha para o melhor atendimento<br />
dos patrões, dificultam a reconstrução de suas vidas familiares e<br />
mesmo o cuidado e a educação de seus filhos, muitos criados à