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CULTURA
FOTOS: D VENDRAMINI PHOTO STUDIO
A arte de
transformar
com alegria
O Circo Social transformou a produção de Circo no Brasil, mas em Toledo,
mais do que isso: transformou a vida de milhares de crianças em situação
de vulnerabilidade social.
TODOS OS ANOS, AS CRIANÇAS
E ADOLESCENTES DO CIRCO
DA ALEGRIA APRESENTAM À
COMUNIDADE O QUE SÃO CAPAZES
DE FAZER NO PALCO DO TEATRO
MUNICIPAL
Da frente do picadeiro, construído ao
longo dos últimos anos com muita dedicação,
as crianças enxergam no horizonte
a silhueta da região central de Toledo.
O Jardim Europa fica distante quatro
quilômetros da área nobre da cidade,
onde, em geral, ficam as oportunidades.
Mas foi lá, no bairro, que em 25 anos de
história, o Circo da Alegria possibilitou a
mais de 10 mil crianças um novo horizonte
de possibilidades.
O projeto surgiu em 1992 após uma oficina
de circo promovida pela Barraca da
Amizade, com Guadêncio Siqueira e outros
dois educadores. Foram 15 dias de
trabalho na Escola Municipal Anita Garibaldi
e Colégio Estadual do Jardim Europa,
na época anexo à instituição. Poucos
alunos puderam participar das aulas
que resultaram em uma apresentação.
Mas depois da partida dos instrutores,
encantados, reivindicaram aulas permanentes
de Circo. Foi ai, que a educadora
física, Tânia Piazzetta, topou o desafio e
iniciou o que mais tarde se tornaria um
dos maiores projetos de Circo Social do
Brasil.
Com cerca de 150 crianças atendidas
anualmente, já são três gerações de artistas
nascidos a partir do projeto, que
forma uma grande família. O curioso é
que à frente desse trabalho está uma família
consanguínea, ou melhor, circense.
É que com o tempo, o marido de Tânia,
ator e professor de Teatro, começou a se
envolver como voluntário e hoje, após a
aposentadoria dela, é quem atua como
coordenador do projeto.
Já a filha, Paula Bombonato, uma ex-
-ginasta de sucesso, chegou por último.
É ela a responsável pela direção técnica
e artística do Circo, o que segundo
Dado Guerra faz toda diferença. “Depois
que ela veio para cá o circo passou a ter
outro nível. Ela trouxa a experiência da
Ginástica Rítmica e passou a dividir as
crianças por faixa etária e por rendimento,
sistematizou a forma de treinamento,
preparação física e técnica. Antes éramos
mais intuitivos e hoje temos noção
exata do que estamos fazendo, tanto
que somos referência em todo país”.
O filho da instrutora, de 13 anos e as sobrinhas
de 10 e 5 também participam do
projeto. Mas apesar da família aparecer à
frente do trabalho, outras pessoas também
são responsáveis. “Principalmente
os pais das crianças que acreditam e nos
apoiam”. O financiamento das atividades
é feito com o apoio da Associação
de Pais, Mestres e Funcionários (APMF)
da Escola Municipal Anita Garibaldi, as
Secretarias Municipais de Educação e
Assistência Social e o Governo Federal.
No picadeiro do Circo da Alegria, as
crianças aprendem de tudo, afinal, a arte
circense é, como dizem, a mãe de todas
as artes: tem esporte, dança, música, teatro,
artes visuais, artes plásticas e muita,
muita criatividade. O resultado é um
desenvolvimento completo. “Aqui elas
têm aprendizado teórico e prático focado
tanto na parte motora como cognitiva.
Além disso, o trabalho em equipe
e a responsabilidade são fundamentais
e seguem com elas para vida toda”, comenta
Paula.
O Wesley Feitosa de 13 anos é um
exemplo. Ele praticamente nasceu dentro
do Circo da Alegria. Chegou aos três
anos de idade, aos sete parou por um
período, mas logo se arrependeu e
voltou. Segundo ele para nunca mais
sair. “Vou estar sempre ligado ao Circo
da Alegria, mas meu sonho é chegar
ao Cirque du Soleil”. Por meio do
Projeto, ele e outras crianças tiveram
a oportunidade de ver de perto a atuação
da maior companhia de circo do
mundo esse ano, em São Paulo.
Quando questionado sobre o que o
Circo representa para si ele responde
enfático: “Tudo! Eu quase nasci aqui
e passo mais tempo aqui do que na
minha casa”. E falando em casa, a do
Wesley fica do outro lado da cidade
e quatro vezes por semana ele pega
duas conduções em uma viagem de
40 minutos para chegar ao local.
O adolescente, assim como os
demais, não se importa com as
dificuldades, por que enxerga no
Circo um novo horizonte possível
de alcançar. “De que jeito a gente
transforma uma criança? Como a
gente ensina uma criança a sonhar
com um mundo melhor? Dando
oportunidade! Por isso fazemos de
tudo para levá-las a exposições de
cultura e espetáculos de diversas
linguagens. Mostramos que elas
podem se inserir na sociedade, com,
por exemplo, incentivo a participação
em conselhos, e ai sim elas passam a
sonhar e sonhar alto”.
A semente germinou. Hoje já são
mais de 36 projetos de circo na região,
com instrutores que em sua maioria
tiveram a formação no Circo da
Alegria. No cenário nacional o impacto
é ainda mais positivo. “Na Escola
Nacional de Circo, os grupos que mais
enviam artistas são os projetos de
Circo Social, ou seja, apesar de não ser
o objetivo real, a formação de artistas
profissionais acaba acontecendo. Mas
o que realmente importa é a formação
do cidadão e isso nós temos certeza
que acontece com cada criança que
passa por aqui”, afirma Dado Guerra.
O Circo Social transformou a
produção de Circo no Brasil, mas em
Toledo, mais do que isso: transformou
a vida de milhares de crianças em
situação de vulnerabilidade social.
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