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impossibilia-8-octubre-2014

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econhecimento, mas porque oferece ao leitor o desdobramento de suas posibilidades intelectuais. Além desensibilizar e desenvolver no leitor a percepção crítica do mundo, a literatura infantojuvenil aproxima otexto com o prazer, o jogo: “Só eu, no imediato instante, olhei pela janela e vi barcos percorendo os ares,ancorando nos ramos altos. A água deitando-se no céu: um azul vertendo em outro azul” (Couto, 2004:30). No excerto selecionado, é descrita uma cena com tons sureais, já que o menino vê pela janela barcos anavegar no céu, lutuando na água que não descia para a tera. O autor parece criar um texto-jogo, em que afruição e o gozo são os protagonistas do ato de ler, pois cria imagens como a do barco lutuante e a daplástica cena em que o azul do céu se encontra com o azul da água, mesclando duas instâncias a im deconseguir uma igura plural. A escrita adotada por Mia Couto poderia ser considerada através da ótica dotexto de prazer de Barthes (2009), pois, para este último, é preciso que o texto seja “aquele que contenta,enche, dá euforia; aquele que vem da cultura, não rompe com ela, está ligado a uma prática confortável deleitura” (Barthes, 2009: 138). Desa forma, a narativa é vista não somente como uma históriainfantojuvenil, mas sim como um objeto de desejo, um caminho sensível a ser descoberto. Quando onarador comenta que somente ele pode ver a cena dos barcos percorendo os ares, percebe-se a sedução queo texto pode causar em cada indivíduo, pois a visão fantástica é individualizada com a presença da expresão‘só eu’. Através das estratégicas textuais criadas pelo autor, o prazer da leitura é conseguido, porque, paraBarthes (2009), a escrita que prima pelo deleite está repleta de telas invisíveis, como vocabulário, referênciase legibilidade.Somente o texto que se apresente como um espaço de linguagem no qual o leitor posa usar seuimaginário, através de uma leitura agradável, poderia garantir sua autonomia, independentemente dopúblico ao qual seja destinado: “Entretanto, na pequenina igreja, ecoavam as rezas e eu escutavaperfeitamente a voz da tia: – Pai noso, cristais no Céu, santo e icado seja o voso nome” (Couto, 2004:20). Na pasagem, nota-se a paródia à oração cristã do Pai Noso, vista nas trocas envolvendo as expresões‘que estais no céu’ e ‘santicado seja voso nome’. Ao se ler a frase, percebe-se com clareza a alusão à reza,mas a opção de colocar no livro a paródia evidencia alguns objetivos. Ao manipular a língua, Mia Coutodemonstra como aquela realidade retratada não comporta o raciocínio habitual. A comunidade de Semboraposui uma chuva estancada entre céu e tera, mostrando que não há limites bem delineados entre realidadee fantasia. A paródia da oração não enfraquece ou zomba da fé da personagem; apenas retira o texto de seulugar comum, alargando a capacidade criativa e polisêmica das palavras, pois os ‘cristais’ que a tia domenino cita se relacionam com as gotas de água da chuva pasmada. Uma ruptura linguística é conseguidacom a brincadeira textual e, citando novamente Barthes (2009), a fruição da leitura viria a partir dainstauração de uma margem subversiva que se localiza entre as duas margens na linguagem: a margemsensata, da linguagem formal, e a margem vazia, na qual se vê a morte da linguagem. No espaço entre asduas é que estaria o prazer do texto, a ser descoberto e recriado pelo leitor.Zuza, Júlia. “O fenômeno crosover fiction e as obras editadas para crianças e jovens de Mia Couto e Luandino Vieira: uma discusão sobre opúblico leitor”. Imposibilia Nº8, Págs. 86-103 (Octubre <strong>2014</strong>) Artículo recibido el 05/08/<strong>2014</strong> – Aceptado el 11/09/<strong>2014</strong> – Publicado el 30/10/<strong>2014</strong>.92

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