Edição Especial - Faap
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Outra coisa que chama a atenção, por exemplo, no caso do Brasil, é que o<br />
acesso a mercados externos é mais relevante que a redução do apoio ao<br />
doméstico nos países importadores. Na Argentina é o contrário, pois ela é<br />
grande exportadora de grãos que são altamente subsidiados no mundo, como<br />
o milho, a soja e o trigo.<br />
Ainda na questão do regionalismo, só para concluir esse assunto com um<br />
último, mas importante ponto, há essas dificuldades crescentes no Mercosul. É<br />
uma pena isso ocorrer, porque quando vimos que Brasil e Argentina passaram para<br />
o mesmo regime cambial de taxas flutuantes e, em seguida, elegeram Lula e<br />
Kirchner com grandes esperanças de maior integração, a perspectiva era a de que<br />
isso daria um grande impulso ao bloco. Mas infelizmente estamos com problemas<br />
crescentes para chegar ao mercado comum, e temos enormes problemas hoje na<br />
discussão conjunta no âmbito da Alca e entre o Mercosul e a UE.<br />
Quero me referir também à chamada Nova Geografia do Mundo, que<br />
enfatiza as relações Sul-Sul. Ela pode ser muito importante na discussão da política<br />
externa, mas as negociações são relevantes tanto nessa política como no comércio.<br />
E mais: na política comercial será muito difícil traduzir essa Nova Geografia em<br />
questões concretas, pois no comércio o papel da China é muito mais relevante para<br />
um país como o Brasil do que nas questões de política externa.<br />
A propósito, não vemos a China abrindo drasticamente seu mercado agrícola<br />
no curto prazo. Ela está mandando 17 milhões de chineses por ano do campo para<br />
as cidades, mas não irá acelerar este processo e, se for acelerar, isso será feito<br />
multilateralmente. Por outro lado, não vejo para o Mercosul uma possibilidade<br />
concreta de ganhos de comércio com a China. Negociar com ela faz sentido, mas<br />
isso não irá produzir resultados no curto prazo. Estes poderiam vir da Alca e dos<br />
acordos com a Europa, casos que já estão em andamento há 10 anos.<br />
Ainda no caso da China, vale lembrar que seu consumo concentra a demanda<br />
em alguns poucos países. Por exemplo, no caso do açúcar, predomina o Brasil; na<br />
carne de frango, a Índia; na carne bovina, EUA e Brasil; e assim por diante. Temos<br />
com a China um potencial extraordinário a desenvolver, mas é algo que virá<br />
lentamente e aos tropeços. Por exemplo, há poucos anos ela incentivou o Mercosul<br />
a produzir soja alucinadamente, e de repente nos deu um golpe suspendendo<br />
importações, e os preços despencaram. Assim, temos de tomar muito cuidado com<br />
uma dependência mais acentuada do mercado chinês.<br />
No caso da infra-estrutura, sua precariedade é dramática no Brasil, em<br />
particular nas estradas não-asfaltadas ou esburacadas, na participação ainda<br />
pequena das ferrovias, e nas dificuldades enfrentadas no acesso aos portos e na sua<br />
ineficiência. Pelo que sei, na Argentina a infra-estrutura não tem tantos problemas.<br />
Antes de concluir, quero insistir na importância das barreiras não-tarifárias,<br />
que às vezes surgem por nossa própria culpa. Só para ilustrar os problemas a que<br />
leva, houve a forte queda das exportações de carne bovina da UE, EUA e<br />
Canadá, que despencaram em 2004 por causa da doença da “vaca louca”. Mas<br />
não podemos confiar em crises que só afetam os outros, como demonstra o fato<br />
de que hoje temos 60% do mercado fechados por conta da febre aftosa que<br />
voltou a aparecer aqui.<br />
O mundo dos alimentos: desafios e oportunidades..., Marcos Sawaya Jank, p. 64-70<br />
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