Edição Especial - Faap

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27.08.2013 Views

Portanto, temos essa característica de sermos grandes exportadores e pequenos importadores de alimentos, essa capacidade muito grande de gerar superávits nesse setor, e esses excedentes estão na base hoje da enorme melhoria das contas externas brasileiras observada neste início de século. Com certeza, se não fosse o agronegócio a situação da Argentina seria verdadeiramente dramática. Assim, quem vem sustentando as contas externas são esses superávits comerciais do agronegócio. Mas não deveríamos imaginar que será possível manter saldos comerciais elevados por um longo período, nem que isso seja conveniente e desejável. O ideal seria aumentarmos tanto as exportações como as importações, nos dois sentidos, pois isso redundaria em maior crescimento econômico. Se olharmos a participação por produtos, o Mercosul tem hoje o primeiro lugar na exportação de vários deles, como soja, açúcar, carne bovina, frango, fumo, café e suco de laranja. No caso brasileiro, a taxa anual de crescimento das exportações de alguns produtos tem sido na faixa de 17% e 18%, o que refuta a velha idéia de que o agronegócio é mundialmente um setor pouco dinâmico. Em particular, é falso dizer, primeiro, que é um setor de baixa tecnologia; e, segundo, que é pouco dinâmico, porque hoje detemos no Mercosul a melhor tecnologia tropical no mundo, e o crescimento desse setor e de suas exportações tem sido extraordinário. Não há na área tropical quem consiga ter os ganhos de produtividade que alcançamos na região nos últimos dez anos. Não há nada comparável, e temos recebido aqui inúmeras missões de vários países interessados em buscar as tecnologias que dominamos. Mas, infelizmente, enfrentamos aqui no Brasil um certo obscurantismo na questão da biotecnologia, como no caso da oposição aos produtos transgênicos, pois o país poderia ser um importante gerador de biotecnologia tropical. Pelo menos, este não é tanto um problema na Argentina pois, quando se falou aqui dos direitos de propriedade, nós também temos aqui uma cruz um tanto mais pesada nessa questão, o que também é uma questão preocupante. De qualquer forma, os números são inquestionáveis, pois há tempos o crescimento anual das exportações é muito forte, estamos avançando na velocidade em que o mercado cresce na Ásia e em outros lugares, e ganhando “market share” em função de nossa competitividade. Nesse contexto, merecem destaque alguns produtos, pois a realidade de sua exportação é hoje bastante diferente de 10 anos atrás. A soja é fortíssima no Brasil e na Argentina, o açúcar é dominado pelo Brasil, que também passou a predominar no caso da carne. Carne de frango, café, carne suína, tabaco e suco de laranja também são dominados pelo Brasil, enquanto a Argentina permanece forte no trigo e se destaca também na carne bovina e nos lácteos em geral. Mesmo produtos como carne suína e leite em pó, que tinham participação muito pequena nas exportações ligadas aos agronegócios, tiveram um crescimento razoável e ele pode ser ainda bem maior. Acabo de participar de um seminário sobre leite, onde ficou claríssimo que, no futuro, seu mercado terá também importantes participações do Brasil e da Argentina, ao lado de Austrália e Nova Zelândia Três desafios e a questão macroeconômica Em que pese esse quadro, permanecem grandes desafios. No momento, 66 Revista de Economia & Relações Internacionais, vol.5(edição especial), 2006

estão no acesso a mercados (em particular onde há subsídios e proteções tarifárias à produção local), na infra-estrutura (que inclui logística e transporte) e em questões não-tarifárias (que abrangem sanitárias, técnicas e ambientais). Estas últimas dependem muito do nosso esforço interno, pois nesse âmbito há grandes problemas a resolver, como na questão dos surtos recentes de febre aftosa, que constituem um drama nacional no seu impacto sobre a produção e comercialização das carnes bovina e suína. No acesso a mercados, o qual depende muito de negociações, os caminhos são vários. Hoje o mundo não segue só pela roda do multilateralismo, este no âmbito da Organização Mundial de Comércio (OMC), mas também por meio de outras três rodas, constituindo uma tração assentada em quatro, pois há o unilateralismo, os acordos regionais e sub-regionais e finalmente a roda do bilateralismo e plurilateralismo (ver gráfico que se segue) 1. Temos, na verdade, uma explosão desses acordos bilaterais e plurilaterais. É como se esse movimento induzido por quatro rodas tivesse uma delas muito maior que as outras, e caminhando mais rapidamente, o que leva a desequilíbrios e a uma situação extremamente preocupante, particularmente para quem vende alimentos. Em sua essência, esses acordos bilaterais e plurilaterais têm o potencial e freqüentemente o efeito muito grande de desviar comércio e investimentos ligados aos agronegócios para regiões menos eficientes que o Mercosul. Por exemplo, no momento em que a Europa se amplia de 15 para 25 países, fatalmente investimentos irão migrar da França e da Alemanha para os países do Leste Europeu que se integrarão à UE. Alguns deles vão produzir carne bovina e exportá-la para a EU sem ter de pagar a tarifa de 3 mil euros por tonelada que nós pagamos. Ou seja, para colocar a carne lá dentro, não terão as mesmas barreiras que países como o Brasil enfrentam. Assim, nesse caso da UE o Mercosul também enfrenta dificuldades. De um modo geral, está claro que é muito preocupante essa explosão de acordos de comércio bilaterais e plurilaterais por todo o mundo, e os impactos que isso pode ter sobre as exportações do Mercosul – particularmente as de alimentos, 1 Esse gráfico nos foi cedido por R. Devlin, do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID). O mundo dos alimentos: desafios e oportunidades..., Marcos Sawaya Jank, p. 64-70 67

Portanto, temos essa característica de sermos grandes exportadores e<br />

pequenos importadores de alimentos, essa capacidade muito grande de gerar<br />

superávits nesse setor, e esses excedentes estão na base hoje da enorme melhoria<br />

das contas externas brasileiras observada neste início de século. Com certeza, se<br />

não fosse o agronegócio a situação da Argentina seria verdadeiramente dramática.<br />

Assim, quem vem sustentando as contas externas são esses superávits<br />

comerciais do agronegócio. Mas não deveríamos imaginar que será possível manter<br />

saldos comerciais elevados por um longo período, nem que isso seja conveniente<br />

e desejável. O ideal seria aumentarmos tanto as exportações como as importações,<br />

nos dois sentidos, pois isso redundaria em maior crescimento econômico.<br />

Se olharmos a participação por produtos, o Mercosul tem hoje o primeiro lugar<br />

na exportação de vários deles, como soja, açúcar, carne bovina, frango, fumo, café e<br />

suco de laranja. No caso brasileiro, a taxa anual de crescimento das exportações de<br />

alguns produtos tem sido na faixa de 17% e 18%, o que refuta a velha idéia de que o<br />

agronegócio é mundialmente um setor pouco dinâmico. Em particular, é falso dizer,<br />

primeiro, que é um setor de baixa tecnologia; e, segundo, que é pouco dinâmico,<br />

porque hoje detemos no Mercosul a melhor tecnologia tropical no mundo, e o<br />

crescimento desse setor e de suas exportações tem sido extraordinário.<br />

Não há na área tropical quem consiga ter os ganhos de produtividade que<br />

alcançamos na região nos últimos dez anos. Não há nada comparável, e temos<br />

recebido aqui inúmeras missões de vários países interessados em buscar as<br />

tecnologias que dominamos. Mas, infelizmente, enfrentamos aqui no Brasil um<br />

certo obscurantismo na questão da biotecnologia, como no caso da oposição aos<br />

produtos transgênicos, pois o país poderia ser um importante gerador de<br />

biotecnologia tropical. Pelo menos, este não é tanto um problema na Argentina<br />

pois, quando se falou aqui dos direitos de propriedade, nós também temos aqui<br />

uma cruz um tanto mais pesada nessa questão, o que também é uma questão<br />

preocupante. De qualquer forma, os números são inquestionáveis, pois há tempos<br />

o crescimento anual das exportações é muito forte, estamos avançando na<br />

velocidade em que o mercado cresce na Ásia e em outros lugares, e ganhando<br />

“market share” em função de nossa competitividade.<br />

Nesse contexto, merecem destaque alguns produtos, pois a realidade de sua<br />

exportação é hoje bastante diferente de 10 anos atrás. A soja é fortíssima no Brasil<br />

e na Argentina, o açúcar é dominado pelo Brasil, que também passou a predominar<br />

no caso da carne. Carne de frango, café, carne suína, tabaco e suco de laranja<br />

também são dominados pelo Brasil, enquanto a Argentina permanece forte no<br />

trigo e se destaca também na carne bovina e nos lácteos em geral. Mesmo<br />

produtos como carne suína e leite em pó, que tinham participação muito pequena<br />

nas exportações ligadas aos agronegócios, tiveram um crescimento razoável e ele<br />

pode ser ainda bem maior. Acabo de participar de um seminário sobre leite, onde<br />

ficou claríssimo que, no futuro, seu mercado terá também importantes<br />

participações do Brasil e da Argentina, ao lado de Austrália e Nova Zelândia<br />

Três desafios e a questão macroeconômica<br />

Em que pese esse quadro, permanecem grandes desafios. No momento,<br />

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