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Ostra Feliz Nao Faz Perola - Rubem Alves

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me que os botões foram aí colocados porque os homens, mal-educados e antihigiênicos,<br />

tinham o costume de limpar os narizes esfregando-os na ponta da<br />

manga. As golas dos marinheiros, curiosas, quadradas, como um babador que se<br />

coloca nas costas, era isso mesmo, um babador ao contrário. Em tempos muito<br />

antigos, os marinheiros usavam tranças que lubrificavam com óleo de peixe. As<br />

tranças lubrificadas lambuzavam a blusa. Então, uma pessoa inteligente,<br />

provavelmente a lavadeira, teve a ideia de colocar uma gola nas costas com a<br />

função de babador. Outra coisa que desperta a minha curiosidade é: por que, nas<br />

solenidades, se faz uma coisa chamada “composição da mesa”, que não tem<br />

função alguma? Compor a mesa é chamar para se assentar no palco, atrás de uma<br />

mesa, as pessoas importantes. Tenho horror de mesas compostas!<br />

Escrito numa calçada<br />

“Cachorro educado não faz cocô no chão.” Como cachorros não sabem ler, é óbvio<br />

que essa mensagem se dirige aos seus donos. Os cachorros que os donos levam a<br />

passear são extensões dos seus donos. Assim sendo, não são os cachorros que<br />

fazem cocô no chão. São os seus donos. Os donos e donas que contemplam seus<br />

pets na ridícula posição que tomam para realizar o ato fisiológico – são eles<br />

mesmos que, por metonímia, estão na posição ridícula, defecando na cidade.<br />

Propaganda<br />

Vamos ver se você tem cabeça de propagandista, se você pode se candidatar a um<br />

emprego na empresa do Duda Mendonça. Vi essa propaganda de um carro numa<br />

revista, quando morei nos Estados Unidos. Um conversível vermelho, sem capota,<br />

num bosque. Você colocaria uma, duas, três, quatro ou nenhuma pessoa dentro do<br />

carro? E as duas portas? Estariam fechadas? As duas estariam abertas? Ou apenas<br />

uma aberta? Pense e dê o seu palpite. A solução vem depois.<br />

O que o sogro imaginou<br />

A estória me foi contada por um amigo, um homem sábio e manso, que conhece as<br />

coisas da alma humana. Aconteceu na sua cidade, faz muito tempo. Um moço<br />

visitava pela primeira vez a casa dos pais da sua namorada. Era uma visita<br />

importante. Precisava que os pais o aprovassem. Tudo transcorria agradavelmente<br />

quando ele se sentiu premido por uma inadiável necessidade fisiológica. Vermelho<br />

de vergonha pediu para ir ao banheiro. Foi e fez. Não imaginava que esse ato<br />

simples, democraticamente partilhado por todos e ditado por pressões intestinais

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