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Ostra Feliz Nao Faz Perola - Rubem Alves

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silêncio na sala de embarque. Os passageiros olharam uns para os outros,<br />

incrédulos, pegaram suas bolsas, pastas e mochilas e em silêncio deixaram vazia a<br />

sala da TARIG, linhas aéreas democráticas, e foram em busca de uma linha aérea<br />

que, sem ser democrática, fosse inteligente e que escolhesse seus pilotos por<br />

competência e não por voto da maioria.<br />

O Estado<br />

A medicina é uma arte rigorosa, regida por princípios de assepsia e de ética. Por<br />

exemplo: quando se vai aplicar uma injeção é preciso desinfetar o lugar onde a<br />

agulha vai entrar no corpo. Pura curiosidade: os médicos que aceitam a função de<br />

carrascos nas penitenciárias desinfetam o lugar onde a agulha com o líquido letal<br />

vai penetrar na veia do condenado? Acho que sim. É preciso evitar infecções. Será<br />

que os carrascos na cama, de noite, pedem perdão ou se entendem apenas como<br />

executores de um ato burocrático? Os criminosos de guerra alemães alegaram que<br />

eles apenas cumpriam ordens. O argumento não foi aceito. Foram enforcados. Não<br />

é horrendamente imoral que o Estado tenha o direito de matar? Matam na guerra,<br />

milhões. Não são caçados como terroristas. São saudados como heróis. Como são<br />

bonitas as fardas dos generais! A diferença entre os morticínios de Estado e os<br />

morticínios dos terroristas está em que os primeiros são feitos em nome do Estado<br />

e os segundos são feitos em nome de uma crença política ou religiosa. Os<br />

morticínios são feitos por loucos. Mas a loucura do Estado é legítima.<br />

Os ratos viram gatos<br />

Diante do perigo do gato, os ratos se unem e sonham sonhos de fraternidade em<br />

que todos repartirão socialisticamente o queijo inacessível, guardado pelo gato.<br />

Morto o gato, os ratos se esquecem da solidariedade socialista e começam a brigar<br />

entre si por um pedaço maior do queijo.<br />

Futebol e política<br />

Alguns amigos se juntaram e resolveram fazer algo pela pequena cidade do interior<br />

em que moravam. Pensaram que seria possível colocar um pouco de razão nessa<br />

coisa tão movida a paixões que é a política. Nada partidário. Não levantaram<br />

bandeiras. Não defenderam candidatos. Não gritaram slogans. Propuseram aos dois<br />

candidatos a prefeito que respondessem a uma série de perguntas sobre os seus<br />

planos, as mesmas perguntas para os dois. As perguntas foram feitas por escrito e<br />

eles tiveram dez dias para escrever suas respostas. As perguntas e as respostas,

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