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Ostra Feliz Nao Faz Perola - Rubem Alves

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pequena estória: Havia numa cidade dos Estados Unidos uma igreja batista. Os<br />

batistas, como se sabe, são um ramo do cristianismo muito rigoroso nos seus<br />

princípios éticos. Havia na mesma cidade uma fábrica de cerveja que, para a igreja<br />

batista, era a vanguarda de Satanás. O pastor, representante de Deus, não<br />

poupava a fábrica de cerveja nas suas pregações. Aconteceu, entretanto, que, por<br />

razões pouco esclarecidas, a fábrica de cerveja fez uma doação de 500.000 dólares<br />

para a igreja batista. Os membros da igreja foram unânimes em denunciar aquela<br />

quantia como dinheiro do Diabo que não poderia ser aceito. Passada a exaltação<br />

dos primeiros dias, acalmados os ânimos, os mais ponderados começaram a<br />

analisar os benefícios que aquele dinheiro poderia trazer. Uma pintura nova para a<br />

igreja, um órgão de tubos, jardins mais bonitos, um salão social para festas.<br />

Reuniram-se então os membros da igreja em assembléia e depois de muita<br />

discussão registrou-se a seguinte decisão no livro de atas: “A Igreja Batista Betel<br />

resolve aceitar a oferta de 500.000 dólares feita pela cervejaria na firme convicção<br />

de que o Diabo ficará furioso quando souber que o seu dinheiro vai ser usado para<br />

a glória de Deus”. Quando a ideologia é nobre qualquer meio é permissível. Se<br />

esse acordo entre “ética” e “trapaça” valeu para a igreja, por que não valerá para<br />

os partidos políticos?<br />

A honestidade dos estúpidos<br />

... é mil vezes mais perigosa que a mentira dos inteligentes. É da honestidade dos<br />

estúpidos que surgem os fanáticos. Os fanáticos são pessoas honestas que<br />

acreditam nos seus pensamentos e nada os dissuade do seu caminho. E porque<br />

acreditam na verdade dos seus pensamentos tudo fazem para destruir aqueles que<br />

têm ideias diferentes.<br />

O voo 0666<br />

“Senhores passageiros do voo 0666, Paris-São Paulo, da TARIG, linhas aéreas<br />

democráticas.” A voz soou metálica na sala do aeroporto onde os passageiros<br />

aguardavam o início do embarque. Cessaram imediatamente as conversas, fez-se<br />

silêncio e os passageiros trataram de prestar atenção nas instruções que se<br />

seguiriam. A voz continuou: “A TARIG, linhas aéreas democráticas, no esforço para<br />

democratizar os seus serviços, avisa os senhores passageiros que dentro de alguns<br />

minutos terá início uma assembléia livre e soberana para a escolha democrática do<br />

piloto que comandará o voo Paris-São Paulo. Os candidatos poderão se inscrever no<br />

balcão da empresa devendo, para isso, preencher as seguintes condições: (1) ser<br />

maior de idade; (2) dar prova de ser capaz de assinar o nome”. Fez-se um grande

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