angelicamente inocentes que dão ares de idiotismo. Tem o crime unsresplendores do Inferno que reverberam nas caras e as alindam. Assim opensava eu de Paula, que seduzia diabolicamente com o seu gracioso despejo.E o mais é que me olhava com magnética sobranceria, e eu a ela com ignóbilhumildade. Todo o homem tem as suas intercadências de parvo, dedesprezível e de baixeza. A mim me quer parecer que lhe mandava outroperiquito, se abro a Primavera do sedutor Castilho naquela noite! Entendam láo homem!É certo que dormi sobressaltado e acordei a pensar nela. É engraçada coisa omodo como eu me queria a mim mesmo explicar a renascença do antigoamor, para me não envergonhar da razão, que me arguia de homem semhonra. Dizia eu, entre mim, que era honorífico vingar-me da afronta e que avingança devia ser simulada com aparências de amor. Planeava levá-la aoescândalo, exibi-la à irrisão pública e lançar pregão do meu despique; quandoporém ideava estas sordícias, indignas do meu género brando, imaginava aomesmo tempo que, chegado o lance da vingança, a comprimiria ao seio e mefaria sacerdote da vítima.Nestes e noutros pensamentos me ocorreu o dia seguinte, e outro, até chegara noite em que D. Paula tinha camarote. Namorei-a sem recato, sem biocos,sem velhacaria. Odiei os rapazes que vinham segredar-me os sabidosescândalos; cheguei a defendê-la por negação, e a benquistar a gargalhada dostafuis, que a não contemplavam com menos arrebatamento que eu.Ora, devo confessar que Paula encarava em mim com sorrir tãodesacostumado, e uns trejeitos tão esquisitos, que só a minha boa-fé, irmãgémea da inépcia, era capaz de aceitá-los como benignos e amoráveis. Alémde que, reparei algumas vezes que ela falava ao ouvido da prima Piedade, eriam ambas à socapa, sem olhar para mim, senão três minutos depois deespirrarem a risota. Agora é que eu penso circunspectamente na passagem.D. Maria da Piedade era uma linguareira com graça sarcástica, um folhetim degénio mordente, temida dos elegantes, a quem ela costumava crismar comepítetos truanescos. A mim sabia eu que ela me chamava Periquito, metendo ariso a dádiva sentimental, que seria minha glória aos olhos de uma mulhersensível. Não duvido apostar que a leitora, se eu alguma vez tiver uma leitora,simpatizará com a minha memória por ter visto a candura e lhaneza decoração com que eu ofertei à ingrata a avezinha. Estas singelezas do amor sãoas que mais enternecem as boas almas. Dê-me a leitora uma lágrima, que eu
não quero outra vingança das mulheres que me escarneceram a poéticasimplicidade, simbolizada naquele periquito.À saída do teatro, notei que Paula me encarara com o leque de dentro dacarruagem. Rarefez-se a nuvem negra da zombaria. Recolhi-me feliz aoGrémio Literário, e fui nessa noite eloquente em teorias de amor.Às duas horas do dia seguinte, quando eu estava escrevendo as comoçõesalegres da noite desvelada, recebi uma carta da posta-interna. Conheci a letrade Paula. Parou-me o sangue no peito; tremiam-me as mãos como se astomasse o horror de profanarem a missiva do anjo. Abri, e vi que eram versos.Versos! O idioma primitivo do coração! Os suspiros metrificados! Aexpressão suprema do amor que se envergonha de expandir-se em prosa!... Ójúbilo intumescente!Li:Ao terno cantor, que n'almaTem da amante o nome escrito,Solitária amante enviaSaudades do periquito.“Será isto escárnio?!”, exclamei. Respondeu-me a seguinte quadra:Ao meigo vate, que eu amoCom amor casto e infinito,Manda um doce e ardente beijoO saudoso periquito.Não tive alma para ler o terceiro insulto, que mais tarde pude ver:
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excruciei a estúpida ferocidade co
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O amor inventou-o depois o estragam
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Tomásia retirou as mãos. Não sei
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Vi-o na Foz, e conheci então a Sra
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Ó tempos patriarcaisDeixai que pos
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