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VERTENTES DA INSULARIDADE NA NOVELÍSTICA DE MANUEL LOPES

Vertentes da Insularidade na Novelística de Manuel Lopes

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Maria Luísa Baptista80marido, uma predisposição quase adolescente para o sonho acordado, odevaneio, a par de uma íntima intuição, uma crença amarga em pressentimentosominosos (10) . São traços que convergem num perfil de algummodo mediúnico. Tal perfil revela-se, por exemplo, num debate interior,na oposição que debalde mantém perante José da Cruz e a obstinaçãodeste, em não abandonar Terranegra, no prenúncio de desgraça quandose apercebe da «quebrada» nocturna: tal presságio não é mais do que aprevisão do que vai ocorrer. (FVL, pp. 132-133).A sua morte, como que prenunciada já na da primeira mulher de Joséda Cruz (p. 42), repete o rito fúnebre primordial da absorção pela terra:reactualiza-se o mito (11) (e reactualizar-se-á ainda com José da Cruz ecom Leandro).Nos antípodas da caracterização psicológica de Zepa, referiremosfinalmente a figura pressaga da vizinha viúva Aninhas da Assomada: éuma presença sempre agoirenta, porque insinuadora de «mexericos enovidades de arrepiar os cabelos» (p. 121); tida geralmente como feiticeira(12) , é ela quem antecipa o clima de desgraça que irá instalar-se emTerranegra (cf. o relato do caso macabro, FVL, p. 46), como é ela queminsinua que Leandro rouba a comida que traz à família e, assim, agravaa debilidade das crianças (o pai nega-se a aceitar a oferta), e suscita amaldição de José da Cruz sobre o filho mais velho.José da Cruz, Zepa, Leandro são de modos diversos personagens deuma estirpe excepcional, aristocracia não de linhagem mas de têmpera,vítimas ou heróis — semideuses, de qualquer modo.A despeito da mudança de lugar (que analisaremos com algum pormenorem 5.4 «Do espaço»), somos de opinião que a acção se inscrevenuma unidade global, a Ilha de Santo Antão. A ruralidade dominante da«Primeira parte», o êxodo para a zona suburbana de Porto Novo, a montanha,constituem aspectos parcelares da referida unidade — a Ilha —,vertentes diversificadas de um mesmo sofrimento; são locais directa ouindirectamente atravessados por uma mesma vis tragica. A própria montanha,na sua carga simbólica, apesar de um outro «lugar à parte» (13) ,apesar de mais próxima dos deuses, morada dos imortais, não logra, nasua sacralidade, escapar à sanha fatal da lestada. E a montanha sempreprotegera os que nela se refugiavam. A mudança é, aliás, o factor trá-E-book CEAUP 2007

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