Maria Luísa Baptista62Não encontramos, porém, datas especificadas ou menções históricoculturaisque situem a acção de Chuva Braba num quadro de sincroniasextradiegéticas.Sabemos entretanto que a história decorre em Setembro e cremosque nada mais, quanto ao tempo: «Me lembro bem; antigamente choviaem Junho ou Julho. Já estamos em Setembro e não vejo chuva cair. Émedonho...» (CB, p. 118).O decurso temporal da história de Chuva Braba circunscreve-se a umprazo que supomos não ultrapassar os sete dias. Entre a «proposta» e oadvento da Chuva, medeia o tempo do dilema, da decisão precária, dacontra-resolução.Quase surpreende entretanto a frieza deste breve, lacónico prazo,pois o discurso que suporta a história não assume as características doritmo tenso ou nervoso da vertigem, do suspense, do telegrafismo. A leiturade Chuva Braba introduz-nos antes num clima cálido, atmosféricae humanamente cálido, em que o amadurecimento das vivências e asreflexões das personagens se traduzem num discurso denso que contribuipara a aparente dilatação temporal da acção. Mas é a perspectiva dodesenraizamento que atormenta o protagonista o principal elemento deadensamento do clima, o que torna a segunda sequência a mais extensa,a mais complexa e a mais lenta. Da atenção demorada que o Autor reservaao problema, ampliando a sua dimensão relativa, é que precisamenteresulta esse efeito. Esta técnica discursiva reflecte de facto com êxitoum ritmo existencial vagaroso e, ao mesmo tempo, a fibra estoicista dacaboverdiana.O tempo da diegese, limitado, é compensado pelo malabarismo discursivo,modesto embora, que faculta o conhecimento analéptico detranslações como a de Joquinha (cap. I.8), de Sansão (cap. I.7) ou deLourencinho (cap. I.7) (28) .É esta deformação discursiva do tempo, a penetrar em profundidadeno passado que essencialmente permite a polidimensionação fisionómicadas personagens: o tempo, instância modeladora. Pensamos, comefeito, que o tempo discursivo funciona em Chuva Braba mais ao serviçoda caracterização das personagens do que ao serviço do avanço da acção.Assim, o tempo do discurso é, do ponto de vista da sequencialidadeE-book CEAUP 2007
Vertentes da insularidade na novelística de Manuel Lopesnarrativa, praticamente sobreponível ao tempo do real, à linha diegéticada prossecução narrativa. Chuva Braba inicia-se com a proposta do padrinhode Mané Quim que nele vem actualizar a latência do dilema entrepartir e ficar. A necessidade de precipitar uma resposta favorável do afilhadoleva o padrinho a servir-se de expedientes eficazes a curto prazo(mas só a curto prazo); e será a decepção, e será a experiência de umdesenraizamento precário, e será sobretudo a sobrevinda da chuva quelevam Mané Quim a desligar-se do padrinho, definitivamente isolado. Odiscurso segue simplicemente a rota (curta) da história.A par desta homologia (sequencialidade diegética/sequencialidadediscursiva), notaríamos uma outra: a duração discursiva das váriassequências (29) acompanha (embora, em rigor, não isocronicamente) asua duração cronológica. Assim, rápido é o tempo da «proposta», comoo da «decisão» ou o da «decisão definitiva». São segmentos notáveis danarrativa, mas segmentos pontuais; ocorrem num lapso de tempo restritoe merecem um tratamento discursivo equivalente. Esse tratamentoacentuará charneiras ou culminâncias diegéticas, golpes no tecido danarrativa, que não admitem delongas descritivas, dissolventes. Assimtambém, por outro lado, lento é o tempo da «tensão dilemática», ou oda «decepção». E enquanto, na cronologia da história, a «decepção» ganhaforma ao longo de cerca de vinte e quatro horas (entre a saída deRibeira das Patas e a recusa de partir, em Porto Novo), prazo que contrastajá substancialmente com o das primeiras sequências aqui analisadas,a sequência intitulada «tensão dilemática» corresponde a uma duraçãoaproximada de três e quatro dias (três na nossa contagem, quatrona do narrador). Verifica-se, por conseguinte, um paralelismo entre acronologia diegética e a discursiva (genericamente e neste particular),como também uma ênfase discursiva à mais longa sequência da história,através de processos que referiremos de seguida. O tempo psicológico é,assim, um tempo cheio, sobrecarregado, de uma densidade que se repercutenum ritmo lento.Reflectindo ainda sobre os procedimentos discursivos relativos aotempo de Chuva Braba, pensamos que as ‘histórias’ das personagens,quase todas de idades muito afastadas da do protagonista (que tem vintee três anos — cf. CB, p. 20), com excepção de Escolástica e Zé Viola,632007 E-BOOK CEAUP
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