Maria Luísa Baptista46insuficientes para superarem a intensidade do desejo de ficar, de ManéQuim. E será verdadeiramente à natureza, e em particular à chuva, que oprotagonista ficará devendo a ajuda definitiva.Joquinha, por sua parte, encontra como oponentes, além de ManéQuim, outros, como André (em certa medida), Zé Viola mais abertamente,Lourencinho e sobretudo Artur.André, o amigo hospedeiro, será o patriarca que não precisou desair da terra para conseguir uma situação económica desafogada, contribuindopara que não estagnasse a sua pequena povoação, e isso não étranquilizador para Joquinha.Zé Viola é um homem muito ligado à terra e a sua pretensa vontadede emigrar decerto não subsistiria quando seriamente considerada. (Cf.CB, pp. 16, 17 e 18).Lourencinho adverte frontalmente Joquinha do ‘crime’ que vaicometer, proporcionando um desenraizamento não desejado. A cenaonírica carregará as tintas da responsabilização. A incorruptibilidade,os anos e a semi-demência permitir-lhe-ão o estatuto do morigeradordesassombrado.Artur é o comerciante vesgo, de visão necessariamente distorcida eacanhada, que provoca a indignação de Joquinha pelos meios que, segundoconfidencia, usa para enriquecer: de facto, o açambarcamento e a especulaçãode cereais, quando a população se ressente de graves carências alimentares,dizem de uma ganância por demais alienante e deformadora.Raras as situações de diálogo em grupo, como rara a comunicaçãodas personagens secundárias entre si, já que na economia narrativa elasnão dispõem praticamente de autonomia: é antes uma existência em ordema, em função de uma caracterização indirecta dos modos de reacçãoquer sobretudo de Mané Quim, como enamorado, como filho, comocabo-verdiano, quer de Joquinha, como amigo, como caboverdiano detorna-viagem, como comerciante. Mesmo no que respeita a Artur ou aJoão Joana, o Autor serve-se do seguinte processo económico de construçãoda personagem: o objectivo de as multifacetar, de lhes atribuiralguma densidade psicológica é intentado não tanto pela via da interacçãocom outras personagens, mas principalmente por outra via, menoselaborada, através da disparidade dos juízos que visam a personagemE-book CEAUP 2007
Vertentes da insularidade na novelística de Manuel Lopesem causa. É assim que, segundo um amigo de Joquinha, que lhe apresentaraArtur em São Vicente, o comerciante era «pessoa amável e muitoprestável» (CB, p. 117), quando, para Joquinha, pelo conhecimento directoque trava, ele será o rosto da indignidade advinda de uma práticaprofissional fraudulenta, especulativa (cf. CB, pp. 118-119).É assim que, numa subalternização da sua individualidade, se moveEscolástica, no quadro estrito da rapariga a quem Mané Quim se ligaafectivamente (já após a proposta do padrinho, afirmação implícita, doseu — de Mané Quim — compromisso com a terra). Dela se sabe que édestra, leve, sensual, ágil, de um «instinto caprino de andar na rocha»(CB, p. 40), que vive a liberdade nos «intermináveis caminhos da ilha»(CB, p. 41). Afigura-se-nos como a própria liberdade, força telúrica viva,fora da alçada autoritária e violenta da mãe (cuja actuação propicia, aocontrário do que deseja, a aproximação da filha ao protagonista). De algummodo, entretanto, a filha «saiu a nha Totona: gostava das pessoascom raiva» (CB, p. 42). É, enfim, uma figura cuja existência sobretudopermite a Mané Quim um reforço do seu desejo de ficar.É assim que se move nha Joja, a mãe de Mané Quim, «uma amostrade gente, velha e magrinha, [...] que só falava do passado, dos seusmortos, de seus filhos ausentes» (CB, p. 28); «a resignação do costume,aquele jeito a que ela se habituara ultimamente de pôr na mão de Deus odestino das coisas» (CB, p. 30).Figura que se apaga e cujo apagamento discreto, vem, por ironia,agudizar o confronto do protagonista consigo próprio: Mané Quim, queesperava que a mãe clarificasse o seu debate interior e, em última análise,resolvesse por ele, vê que ela o deixa decidir, afirmando com amarguraque não pode «estorvar o destino de cada um» (CB, p. 31). Nha Jojaé, além disso, um novo apelo telúrico a ponderar, porque, afectivamente,dos mais próximos do protagonista.É assim ainda, que nhô Lourencinho, paradigma impoluto (tambémpara Mané Quim) do amor à terra mãe, é também hoje a solidão, o silêncio:«Homem de poucas falas, parecia ter mais gosto em conversar comas plantas do seu quintal e com os seus bichos. Viúvo, vivia com umairmã surda e entrevada...» (CB, p. 57). Ele «que outrora fora conversadorbrabo, habituara-se ao silêncio, e estava virando maníaco ultimamente»472007 E-BOOK CEAUP
- Page 5 and 6: VERTENTES DA INSULARIDADE NANOVELÍ
- Page 7 and 8: ÍNDICEApresentação 9Nota prévi
- Page 9: Concorri ao Mestrado de Literaturas
- Page 12 and 13: Maria Luísa BaptistaNOTA PRÉVIAPa
- Page 14 and 15: Maria Luísa Baptista14go, pude con
- Page 16 and 17: Maria Luísa Baptista02.MANUEL LOPE
- Page 18 and 19: Maria Luísa Baptista18seus número
- Page 20 and 21: Maria Luísa Baptistapara os meteor
- Page 22 and 23: Maria Luísa Baptistae sofrendo um
- Page 24 and 25: Maria Luísa Baptista24para a franc
- Page 26 and 27: Maria Luísa Baptista26A relativa p
- Page 28 and 29: Maria Luísa Baptistade contextuali
- Page 30 and 31: Maria Luísa Baptista1. DA ACÇÃO3
- Page 32 and 33: Maria Luísa Baptistamo entre quere
- Page 34 and 35: Maria Luísa Baptista34A partir da
- Page 36 and 37: Maria Luísa Baptista36títulos apo
- Page 38 and 39: Maria Luísa Baptistaremos a afirma
- Page 40 and 41: Maria Luísa Baptista40Notemos que
- Page 42 and 43: Maria Luísa Baptistasilenciaram. C
- Page 44 and 45: Maria Luísa Baptista44distintivos
- Page 48 and 49: Maria Luísa Baptista48(CB, p. 57).
- Page 50 and 51: Maria Luísa BaptistaA despeito dis
- Page 52 and 53: Maria Luísa Baptista52de interven
- Page 54 and 55: Maria Luísa Baptista4. DO ESPAÇO4
- Page 56 and 57: Maria Luísa Baptista56Porto Novo,
- Page 58 and 59: Maria Luísa Baptista58os elementos
- Page 60 and 61: Maria Luísa Baptista60lhe mina o s
- Page 62 and 63: Maria Luísa Baptista62Não encontr
- Page 64 and 65: Maria Luísa Baptistacontribuem par
- Page 66 and 67: Maria Luísa BaptistaAcontecimentos
- Page 68 and 69: Maria Luísa BaptistaAcontecimentos
- Page 70 and 71: Maria Luísa BaptistaAcontecimentos
- Page 72 and 73: Maria Luísa Baptista05.ANÁLISE DE
- Page 74 and 75: Maria Luísa BaptistaO «combate»
- Page 76 and 77: Maria Luísa Baptistaandro que, a d
- Page 78 and 79: Maria Luísa Baptistaconsigna-se, p
- Page 80 and 81: Maria Luísa Baptista80marido, uma
- Page 82 and 83: Maria Luísa BaptistaO acentuar dos
- Page 84 and 85: Maria Luísa BaptistaO milharal, re
- Page 86 and 87: Maria Luísa Baptista86do «Romance
- Page 88 and 89: Maria Luísa Baptista88Como, pois,
- Page 90 and 91: Maria Luísa Baptista- a acção do
- Page 92 and 93: Maria Luísa Baptista92Sendo assim,
- Page 94 and 95: Maria Luísa BaptistaAfigura-se, po
- Page 96 and 97:
Maria Luísa Baptista96ficos, mas a
- Page 98 and 99:
Maria Luísa Baptista(pp. 24-28); e
- Page 100 and 101:
Maria Luísa Baptistaa atmosfera es
- Page 102 and 103:
Maria Luísa Baptistalíngua de fog
- Page 104 and 105:
Maria Luísa Baptista104ção da su
- Page 106 and 107:
Maria Luísa Baptistaquando a árvo
- Page 108 and 109:
Maria Luísa Baptista108Actualizaç
- Page 110 and 111:
Maria Luísa Baptista• «O posto
- Page 112 and 113:
Maria Luísa Baptista112«Tem algum
- Page 114 and 115:
Maria Luísa Baptista114Inerente à
- Page 116 and 117:
Maria Luísa Baptista116Miguel Alve
- Page 118 and 119:
Maria Luísa Baptista118Gente das p
- Page 120 and 121:
Maria Luísa Baptista120a mão-de-o
- Page 122 and 123:
Maria Luísa Baptistalos ventos cor
- Page 124 and 125:
Maria Luísa Baptistadas a pique on
- Page 126 and 127:
Maria Luísa Baptista• «A tarde
- Page 128 and 129:
Maria Luísa Baptistasente embora,
- Page 130 and 131:
Maria Luísa Baptista130directa. Ma
- Page 132 and 133:
Maria Luísa Baptista«Fiz bem o qu
- Page 134 and 135:
Maria Luísa Baptistata-se devidame
- Page 136 and 137:
Maria Luísa Baptistatem-se os valo
- Page 138 and 139:
Maria Luísa Baptistanada mais. Zep
- Page 140 and 141:
Maria Luísa Baptista140Neste caso,
- Page 142 and 143:
Maria Luísa Baptistaos homens. E,
- Page 144 and 145:
Maria Luísa Baptista• a antevis
- Page 146 and 147:
Maria Luísa Baptistase fosse para
- Page 148 and 149:
Maria Luísa Baptista— Nem me lem
- Page 150 and 151:
Maria Luísa Baptista- o «querer b
- Page 152 and 153:
Maria Luísa Baptistacom bosques, c
- Page 154 and 155:
Maria Luísa Baptista— Homem nasc
- Page 156 and 157:
Maria Luísa BaptistaSupomos poder
- Page 158 and 159:
Maria Luísa Baptistaágua que se s
- Page 160 and 161:
Maria Luísa BaptistaO telurismo co
- Page 162 and 163:
Maria Luísa Baptista• «Quem olh
- Page 164 and 165:
Maria Luísa Baptistacimento da vul
- Page 166 and 167:
Maria Luísa BaptistaAssim, em FVL
- Page 168 and 169:
Maria Luísa Baptistadividual, de l
- Page 170 and 171:
Maria Luísa Baptista• «Mas lá
- Page 172 and 173:
Maria Luísa BaptistaTemos por form
- Page 174 and 175:
Maria Luísa Baptista«Parece exact
- Page 176 and 177:
Maria Luísa Baptistaa uma meia dú
- Page 178 and 179:
Maria Luísa Baptistarelacionais (2
- Page 180 and 181:
Maria Luísa Baptistapotencialidade
- Page 182 and 183:
Maria Luísa Baptista«— Sempre e
- Page 184 and 185:
Maria Luísa Baptista184Um como out
- Page 186 and 187:
Maria Luísa BaptistaO «querer bip
- Page 188 and 189:
Maria Luísa Baptista• «Era o qu
- Page 190 and 191:
Maria Luísa BaptistaNa verdade, a
- Page 192 and 193:
Maria Luísa Baptistaa partilha do
- Page 194 and 195:
Maria Luísa Baptistalocando o home
- Page 196 and 197:
Maria Luísa Baptistados longes tra
- Page 198 and 199:
Maria Luísa Baptista(solidariedade
- Page 200 and 201:
Maria Luísa Baptistaproduções qu
- Page 203 and 204:
Vertentes da insularidade na novel
- Page 205 and 206:
Vertentes da insularidade na novel
- Page 207 and 208:
Vertentes da insularidade na novel
- Page 209 and 210:
Vertentes da insularidade na novel
- Page 211 and 212:
Vertentes da insularidade na novel
- Page 213 and 214:
Vertentes da insularidade na novel
- Page 215 and 216:
Vertentes da insularidade na novel
- Page 217 and 218:
Vertentes da insularidade na novel
- Page 219 and 220:
Vertentes da insularidade na novel
- Page 221 and 222:
Vertentes da insularidade na novel