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VERTENTES DA INSULARIDADE NA NOVELÍSTICA DE MANUEL LOPES

Vertentes da Insularidade na Novelística de Manuel Lopes

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Vertentes da insularidade na novelística de Manuel LopesA natureza será assim também o interlocutor que se espera, se deseja.Em sentido inverso, observem-se no trecho seguinte (CB, pp. 22-23)as atitudes de relacionamento humanizado que Mané Quim entretececom as plantas do seu Ribeirãozinho; chega aqui a haver também laivosde ténue erotismo, nomeadamente nas linhas 27-28 desta transcrição(CB, p. 23):«Ali moravam as ambições e as esperanças de Mané Quim. Sempreque lá descia — o que sucedia diariamente, pelo menos duas vezes, demanhã e à tarde — corria ao pequeno depósito, meladouro de pé derocha, para observar o volume da água acumulada. Depois dirigia-seaos pilares, cavava o solo para estudar a altura da humidade e avaliaras necessidades, afagava as plantas, passava os dedos pelas folhas dobradase sem viço, falava-lhes, procurava incutir-lhes ânimo e confiançacomo se fossem criaturas desesperançadas e sugestionáveis. Era umrito normal, quase profissional e clínico de médico de província quevisita quotidianamente os seus doentes. As palavras que lhes dirigiaserviam também para ele, porque o dia em que lhe faltasse coragempara lutar por aqueles pilares, então o mundo poderia acabar. Ali principiavae terminava o seu mundo. O resto não era já da sua conta — erao «mundo dos outros»; ficava para lá da sua órbita.O Ribeirãozinho e os sequeiros do Norte pertencentes a mãe-Jojanão o comoviam; trabalho de sequeiro era mecânico e rotineiro, asplantas davam na vontade de Deus, os homens pouco faziam. O Ribeirãozinhosó porque tinha um fio de água a escorrer da rocha punhalheos sentidos e o coração despertos. As plantas de regadio pediamafagos de homem, afagos e amor; sem afagos e amor, morriam. É porisso que, entre as propriedades de mãe-Joja, dava antes preferência aoRibeirãozinho, embora considerasse todas as outras dentro da esferadas suas obrigações e governo. Era o Ribeirãozinho que o inquietava.Trocaria de bom grado todo o dinheiro que fosse ganhar aonde quê,com quem quer que fosse, com o padrinho ou com outro qualquer, poruns centos de mil réis só, para reavivar e recuperar aquela nascentemoribunda. Nenhuma dádiva desta vida lhe traria tanta alegria comover, um dia, aquelas plantas sorrirem para ele agradecidas. Unicamenteum sonho o dominava: ver com os próprios olhos manar de novo a1572007 E-BOOK CEAUP

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